PEC das "bondades"

Efeito bumerangue: entenda como os mais pobres vão pagar a conta da PEC Eleitoral

A medida, além de ser um drible à lei eleitoral, abre um precedente perigoso e irreversível e afronta a Constituição, afirmam juristas

Senado Federal - Roque Sá/Agência Senado

O Senado aprovou nesta quinta-feira uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que institui um estado de emergência no Brasil até o fim do ano para abrir espaço para gastos bilionários do governo a três meses da eleição.

A medida, além de ser um drible à lei eleitoral, abre um precedente perigoso e irreversível e afronta a Constituição, afirmam juristas. E, segundo economistas, a conta, no futuro, será paga justamente pelos mais pobres.

A PEC vai permitir o aumento do valor do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600, além de criar um vale de R$ 1.000 para os caminhoneiros.

O problema é que o descontrole fiscal tende a pressionar o dólar, levando a altas maiores da inflação no futuro, o que, a médio e longo prazo, pode tornar inócuo o reajuste do auxílio.

Para se ter uma ideia, o valor de R$ 600 é o mesmo pago no auge da pandemia, no Auxílio Emergencial. Naquela época, a quantia comprava uma cesta básica e ainda sobrava dinheiro. Hoje, por causa da inflação, os mesmos R$ 600 não compram sequer o mínimo no supermercado - é preciso acrescentar R$ 177,30 para comprar uma cesta básica em São Paulo.

Entenda, abaixo, o efeito bumerangue que faz o descontrole fiscal acabar sendo pior justamente para as famílias mais pobres.

Descontrole fiscal

A PEC das Bondades é uma verdadeira "bomba fiscal", afirma Ricardo Hammoud, economista e professor de macroeconomia do Ibmec. As estimativas apontam um impacto fiscal de R$ 42 bilhões nas contas do governo com as medidas.

O temor de um descontrole nos gastos públicos deixa investidores mais arredios em aplicar no Brasil, tanto em títulos do governo como em outros ativos financeiros. O efeito imediato é uma alta do dólar.

Dólar sobe

Na manhã desta sexta-feira (1), a moeda americana bateu R$ 5,33, reagindo à aprovação da PEC Eleitoral e também refletindo um temor cada vez maior de recessão nos Estados Unidos.

- Os receios são sobre quanto vai custar para os cofres públicos essa tentativa do presidente Jair Bolsonaro de melhorar a sua popularidade – destaca o diretor da FB Capital, Fernando Bergallo.

Impacto na inflação

A alta do dólar tem impacto imediato na inflação. Gasolina, diesel e alimentos sobem de preço porque esses produtos são importados ou podem ser exportados. O dólar também influencia nas tarifas de energia, pressionando a conta de luz.

Há, assim, um efeito em cascata sobre os diferentes preços da economia. A inflação brasileira acumula alta de 12% nos últimos 12 meses.

O aumento dos preços tem impacto maior justamente para as famílias mais pobres, que gastam a totalidade de seu orçamento com itens indispensáveis.

Alta de juros

Para segurar a inflação, o Banco Central terá que manter os juros altos por mais tempo. A desconfiança com a situação fiscal também eleva os juros. Os investidores pedem taxa maior para financiar a dívida do governo.

Efeitos no emprego

Com dólar e juros em alta, sobe o custo das empresas, que deixam de investir para ampliar sua produção. A inflação derruba as vendas do comércio e da indústria. O país cresce menos e são criados menos postos de trabalho.

A taxa de desemprego caiu a 9,8% em junho, mas o país ainda tem 10 milhões de desempregados.

Ganha agora, perde depois

O aumento de R$ 400 para R$ 600 no Auxílio Brasil traz um alívio a curto prazo. Porém, os efeitos danosos em dólar, juros, inflação e emprego afetarão sobretudo os mais pobres, anulando a médio e longo prazo este ganho. E os R$ 200 extras têm data para acabar: dezembro de 2022, último mês do governo Bolsonaro.