Narrativas eleitorais: O que esperar das próximas semanas?
Se houve um tempo em que a narrativa eleitoral do “eu prometo” funcionava, não há mais nem resquícios dele. O eleitor contemporâneo, um indivíduo digital e que traz consigo grande carga emocional, não será mais fisgado por meio de iscas lambuzadas de promessas vazias. Faltando cerca de três meses para as eleições, os cidadãos querem ouvir mais histórias parecidas com as histórias deles mesmos. Eles querem enxergar no seu candidato alguém próximo de verdade, que tenha a capacidade de curar suas dores personificadas na falta de políticas públicas e ausência do poder público em áreas que mais lhes interessam.
Pode parecer um paradoxo, mas criar esse discurso emocional e empático, que soe ao eleitor como uma franca conversa “olho no olho” é fruto de uma estratégia puramente racional, desenvolvida com técnicas de comunicação e marketing, como aquilo que chamamos de “storytelling”: a arte de desenvolver narrativas envolventes, muito utilizada em roteiros de Hollywood. É por isso que os grandes exemplos de sucesso na política sempre são acompanhados de histórias de vida emocionantes, cheias de reviravoltas e que trazem uma essência de semelhança com a vida das pessoas comuns e de inspiração para que essas mesmas pessoas se sintam parte de um processo de construção.
Barack Obama, com sua narrativa desenvolvida sob a frase “Yes, we can!” (Sim, nós podemos!), é um bom exemplo. Por si só, o lema da sua campanha vitoriosa para presidente dos Estados Unidos em 2008 gera empatia ao tratar do coletivo ao mesmo tempo em que inspira as pessoas a buscarem mais, dando-lhes a possibilidade do novo. No Brasil, Lula fez dois governos como “o pai dos pobres” e Bolsonaro foi eleito como “herói patriota”. Narrativas que funcionaram e que neste ano estão em rota de colisão.
Porém, olhando para o que vem fazendo os pré-candidatos a cargos proporcionais, fica claro que teremos nessas eleições dois tipos de narrativas nas propagandas que serão veiculadas na TV, no rádio, nas ruas e, sobretudo, na internet: os que entenderam que eleição se vence com empatia e estratégia e os que ainda acham que vão ganhar sem criar laços com quem estará indo às urnas no próximo dia 02 de outubro.
O segundo caso, infelizmente, ainda será maioria neste pleito. Desta forma, podemos esperar muitos discursos rasos, repetitivos e sem conexão com a realidade das pessoas, enquanto o eleitor quer saber, de forma clara e objetiva, os detalhes de como o trabalho do político vai agregar valor a aspectos importantes da sua vida. Também podemos esperar muito desconhecimento sobre as regras das eleições e sobre conceitos importantes do marketing, o que acarretará em propagandas extremamente chatas, invasivas e até passíveis de ações na justiça eleitoral.
Para o desespero do eleitor, poucos são os que estão se preparando para chamar a atenção pela tonalidade atrativa da narrativa e poucos são os que estão preocupados com que tipo de história as pessoas realmente querem ouvir. As chances de persuasão e de convencimento de quem não cuida da narrativa do discurso são mínimas, mas esses candidatos se farão mais presentes do que aqueles que, de fato, saberão se comunicar com eficiência. Portanto, o que precisaremos ter até o primeiro domingo de outubro, é muita paciência e olhos e ouvidos atentos para um ou outro candidato que vai falar de verdade conosco, nos dando a real chance de avaliação e escolha sobre dar-lhes ou não o nosso voto de confiança.
*Jornalista, especialista em Marketing Político e diretor da agência Inexxus Boa Viagem
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