RIO DE JANEIRO

Cirurgião plástico suspeito de cárcere privado de paciente já foi preso por usar droga sem registro

Equatoriano Bolivar Guerrero Silva responde a pelo menos 19 processos criminais

O equatoriano Bolivar Guerrero Silva, de 63 anos, foi preso em flagrante nesta segunda-feira (18) - Reprodução/TV Globo

O cirurgião plástico equatoriano Bolivar Guerrero Silva, de 63 anos - suspeito de lesão corporal grave, associação criminosa e de manter uma paciente em cárcere privado no Hospital Santa Branca, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro - responde a pelo menos 19 processos criminais e já foi preso por integrar um grupo criminoso acusado de comercializar ou aplicar medicamentos sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Na ocasião, uma operação da Delegacia de Repressão aos Crimes Contra a Saúde Pública (DRCCSP) em dezembro de 2010 apontou que, entre os produtos, havia grande quantidade da toxina botulínica, conhecida como Botox: o material, que custava cerca de R$ 1 mil no mercado formal, vinha da China e saía por R$ 450.

Na manhã desta segunda-feira, policiais da Delegacia de Atendimento a Mulher (Deam) Duque de Caxias cumpriram um mandado de prisão temporária contra Bolivar Guerrero Silva no centro cirúrgico do Hospital Santa Branca, unidade de saúde particular da qual ele já foi sócio e ainda atua. Foram cumpridos ainda mandados de busca e apreensão.

De acordo com os agentes, há duas semanas, um parente da mulher esteve na especializada para relatar que ela se submeteu a uma abdominoplastia no início de fevereiro, realizada por Bolivar em uma clínica no bairro Vinte e Cinco de Agosto. Três dias após receber alta, ela passou mal e novamente procurou a unidade de saúde.

No mês seguinte, ela foi de novo a clínica e, desde então, passou por pelo menos dez outros procedimentos cirúrgicos. De acordo com a delegada Fernanda Fernandes, titular da Deam, a barriga da paciente necrosou. A partir daí, de acordo com as investigações, o médico e sua equipe estariam impedindo que a mulher fosse transferida para outra unidade de saúde. 

— A situação dela é tão grave que ela está apodrecendo viva, literalmente. Ela estava lá contra a vontade. Esse médico dizia querer controlá-la — disse a delegada.

O Cremerj se pronunciou sobre o caso: "Tendo conhecimento do caso pela imprensa, o Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (Cremerj) abriu sindicância para apurar os fatos. Todo procedimento segue em sigilo de acordo com os ritos do Código de Processo Ético-Profissional".

No mesmo dia da denúncia da familiar da paciente, os policiais requisitarm o prontuário e o relatório médico, mas até hoje a documentação ainda não havia sido entregue. Na última sexta-feira, os agentes repassaram um celular para mulher. Quando ligaram para confirmar se o aparelho estava funcionando, ela atendeu desesperada, pedindo para ser retirada do hospital porque estava com medo de morrer

No sábado, a juíza Ranata Travassos Medina de Macedo, da Vara de Violência Doméstica de São João de Meriti, decretou a prisão temporária de Bolivar e suspensão do registro do médico no Conselho Regional de Medicina (CRM). A magistrada também determinou a expedição de mandados de condução coercitiva contra o diretor clínico do Hospital Santa Branca, do assistente dele e de dois funcionários administrativos da unidade, além de mandados de busca e apreensão de documentos, como o prontuário, e medicamentos.

Em 2010, Bolivar ficou preso alguns dias e foi indiciado por formação de quadrilha, crimes contra a relação de consumo e exercício ilegal da Medicina. Ele é réu em um processo que ainda tramita na 35ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio. Na ação, denominada Beleza Pura, foram cumpridos 18 mandados de busca e apreensão em consultórios e clínicas de estética em diversos pontos do Rio, além da cidade de Anápolis, em Goiás, onde funcionava um laboratório que produzia o botox.

Segundo o inquérito, o grupo atuava havia cinco anos, enviando os produtos de Goiás para um que realizava a distribuição para o Rio. Em seguida, uma mulher redistribuía o material para clínicas e profissionais, dentre eles a Bolivar, então proprietário do Hospital Santa Branca e de consultórios em outras regiões, além de um capitão da PM especializado em Medicina estética e que possuía um consultório na Barra da Tijuca.

Em outras ações, Bolivar é acusado por crimes como injúria e lesão corporal e ainda responde por erros médicos. Também no Tribunal de Justiça do Rio, Bolivar já fora condenado a indenizar pacientes por sequelas deixadas após procedimentos médicos e estéticos.

Em uma dessas sentenças, o desembargador Luiz Roberto Ayoub, da 26a Câmara Cível do Consumidor, determinou o pagamento de R$ 50 a mil a uma mulher que realizou com ele uma cirurgia para retirada de excesso de pele na pálpebra.“Entretanto, alega que logo após começou a notar falhas no local da operação, como se fossem buracos em sua pele, o que a levou a procurar por diversas vezes seu médico, primeiro apelante, que continuava prescrevendo o mesmo remédio”, escreveu o relator em seu despacho.

“Conta que após nova consulta, e sem qualquer melhora, voltou à clínica para requerer seus prontuários médicos e documentos, o que lhe foi negado, sendo informada que deveria buscar seu médico para reparação dos danos. Após novo contato com o mesmo, foi realizado novo procedimento que novamente não foi capaz de corrigir as discrepâncias, e apesar de cobrir os buracos decorrentes da primeira operação, novas falhas foram cometidas. Diante de tal situação procurou a clínica médica para obter o reembolso dos gostos, quando lhe foi proposto que realizasse novo procedimento com outro médico”, pontuou o magistrado na decisão.