Bolsonaro contrariou Economia para dar R$ 2 mil a policiais de sobreaviso
Documentos obtidos via LAI mostram que técnicos de quatro órgãos sugeriram veto a trecho de projeto que concede benefício à PF
O presidente Jair Bolsonaro ignorou uma recomendação do Ministério da Economia ao sancionar trecho de um projeto que garante um adicional para policiais federais que ficarem de sobreaviso. Entre os argumentos apresentados por técnicos do ministério, estavam a quebra de isonomia em relação a outros servidores e a falta de estimativa de impacto orçamentário. Entretanto, Bolsonaro ignorou a recomendação e sancionou a medida integralmente, concedendo um benefício para uma de suas bases eleitorais.
De acordo com documentos obtidos via Lei de Acesso à Informação (LAI), o Ministério da Economia sugeriu o veto desse trecho com base em pareceres de quatro órgãos: Secretaria Especial do Tesouro e Orçamento, Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, Secretaria Especial de Desburocratização e Assessoria Especial de Relações Institucionais.
A orientação foi apresentada em um ofício enviado pelo ministro Paulo Guedes ao ministro Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral da Presidência) no dia 14 de junho — um dia antes de Bolsonaro sancionar o texto. Guedes apenas relatou as sugestões dos órgãos e não entrou em detalhes.
O trecho que trata do sobreaviso foi incluído em uma medida provisória (MP) sobre outro tema, a utilização do Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividades-fim da Polícia Federal (Funapol) para financiar um plano de saúde para a categoria. A alteração foi feita durante tramitação na Câmara e mantida no Senado.
O texto define que "considera-se em disponibilidade o servidor que permanecer à disposição da Polícia Federal, conforme escala previamente elaborada por autoridade competente, à espera de convocação para a apresentação ao serviço, após a sua jornada.
O projeto também estabeleceu o valor de aproximadamente R$ 10 por hora aos agentes incluídos na escala de prontidão. Isso representa cerca de R$ 480 por fim de semana e, a depender da quantidade de fins de semana a que o servidor ficar à disposição da corporação, pode chegar perto de R$ 2 mil.
'Precedente para outras carreiras'
Quando o projeto foi enviado para a sanção presidencial, em maio, foram solicitadas as posições dos ministérios competentes, como de costume. Um parecer da Secretaria de Desburocratização afirmou que "permanecer à disposição do órgão é condição inerente à atividade policial, não sendo razoável a conversão em pecúnia do tempo em que meramente permanece em disponibilidade, sem efetivo trabalho".
O documento cita que isso já é o que ocorre com outras categorias do funcionalismo e que "eventual implementação do citado benefício estabeleceria precedente para que outras carreiras busquem a mesma vantagem pleiteada pelos servidores da Polícia Federal".
Já um parecer da Secretaria de Tesouro apontou que "há a necessidade de atendimento às regras fiscais e não foram anexados ao processo quaisquer demonstrativos que evidenciassem o impacto fiscal adicional acarretado pela medida".
O Ministério da Economia não apresentou todos os documentos, e tarjou trechos de outros, alegando que a exposição deles violaria o sigilo profissional de advogados. O GLOBO também solicitou pareces da Secretaria-Geral e do Ministério da Justiça, mas as pastas usam a mesma alegação para negar o pedido.