BRASIL

"Tem que correr atrás": os obstáculos que os jovens enfrentam para entrar no mercado de trabalho

Bolsonaro criticou os mais novos que culpam o governo pela falta de emprego.

Jovens e adultos em sala de aula - Arquivo / Agência Brasil

O presidente Jair Bolsonaro criticou nessa quinta-feira (21) jovens que, segundo ele, culpam o governo pela falta de emprego. O presidente disse que o governo não cria empregos e pode apenas não "atrapalhar" a contratação pelas empresas. Por isso, os jovens deveriam "correr atrás". Acontece que, conforme mostram as estatísticas, essa população enfrenta mais obstáculos quando tentam se inserir no mercado de trabalho.

O jovem já passa por mais dificuldade que os demais brasileiros para conseguir uma oportunidade, conforme mostra a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE. A taxa de desemprego entre a população de 18 a 24 anos é, historicamente, maior que o índice geral.

O desemprego entre os mais jovens ficou em 22,8% no 1º trimestre de 2022. Já a desocupação média ficou em 11,1% no período, com todas as demais faixas etárias com uma taxa de desocupação menor que a média.

Falta de experiência
Segundo analistas econômicos, a falta de experiência dificulta a contratação dos jovens pelas empresas. No momento em que o país se recupera dos impactos econômicos agravados pela pandemia de Covid-19, esse fator pesa contra a contratação do mais jovem.

Lucas Assis, analista da Tendências Consultoria, observa que, enquanto grande parte dos jovens brasileiros ainda vivia o legado da recessão de 2015 e 2016 no país, o "contágio econômico da covid-19" deteriorou o mercado de trabalho para essa faixa da população.

— Os jovens ocupam, em sua maioria, postos de menor qualidade, com elevada informalidade e subocupação, e em setores duramente atingidos pelo isolamento social na pandemia, como o comércio — explica Assis.

Barreiras estruturais
Além do menor leque de oportunidades, há ainda barreiras estruturais enfrentadas pelos mais jovens, segundo pesquisadores. Em 2016, o Banco Mundial realizou entrevistas com 77 jovens de 18 a 25 anos de áreas urbanas e rurais de Pernambuco para compreender a situação dos jovens que estão fora da escola e do mercado de trabalho.

Baixa qualificação, poucos recursos financeiros, impossibilidade de conciliar emprego informal com aulas, além de falta de transporte público seguro para locomoção e a discriminação foram algumas das dificuldades experimentadas por jovens homens e mulheres no estudo intitulado "Se já é difícil, imagina para mim", lançado em março de 2018 pelas pesquisadoras Miriam Müller e Ana Luiza Machado.

"Mesmo os jovens que buscavam ativamente novas vidas para si e suas famílias foram muitas vezes derrotados pelo conjunto limitado de oportunidades. Uma parcela significativa desses jovens aspirava retornar ao trabalho, à escola ou ingressar no ensino superior. Mas as constantes tentativas fracassadas podem gerar frustração e resignação em um contexto onde os serviços são de má qualidade ou onde as oportunidades são indisponíveis", escreveram as autoras no relatório.

"A culpa não é dos jovens. O estudo mostra que algumas condições relacionadas à pobreza e ao gênero produzem um conjunto de barreiras difíceis de superar" pontuou Miriam Müller, autora do estudo, durante a divulgação.

'Efeito cicatriz'
A consequência desse atraso para se inserir no mercado de trabalho gera o que economistas chamam de "efeito cicatriz", fenômeno em que a desocupação ou a permanência em posições de trabalho precário acarretam efeitos adversos na trajetória profissional.

Iniciar a carreira durante um período de crise econômica coloca os jovens em desvantagem, uma vez que os primeiros anos de trabalho influenciam o desenvolvimento profissional e seus salários e oportunidades podem nunca se recuperar desses impactos.

Bruno Ottoni, pesquisador da consultoria IDados, reforça a importância de o jovem buscar qualificações que aumentem as chances de inserção no mercado de trabalho, de olho nos profissionais que estão sendo requisitados no mercado. Mas pondera que a situação econômica é determinante para o aumento ou não das contratações pelas empresas:

— Para o jovem, [o efeito cicatriz] é muito complicado. É fácil falar que o jovem não deve desistir, que o jovem deve continuar procurando emprego, se qualificar, tentar estudar e se informar sobre vagas abertas. Mas é difícil fazer na prática. É preciso que a situação econômica melhore para que o emprego se torne algo disseminado e vários jovens consigam [oportunidade].

Assis, da Tendências, diz que é necessário colocar os jovens no centro de uma "ambiciosa agenda de reformas":

— A educação e o treinamento da atual juventude serão decisivos ao desenvolvimento futuro do nosso país — pondera.