Nova lei de improbidade beneficia políticos às vésperas de julgamento no STF
Corte decidirá em agosto se regras podem de fato manter candidaturas de quem teve condenação suspensa
As mudanças na lei de improbidade administrativa, aprovadas pelo Congresso e sancionadas pelo presidente Jair Bolsonaro no ano passado, levam a suspensões de condenações a políticos. Muitos deles poderão disputar eleições, driblando restrições que os enquadravam na Lei da Ficha Limpa.
Na lista dos beneficiados estão velhos conhecidos dos eleitores, como os ex-governadores Anthony Garotinho (União Brasil-RJ) e José Roberto Arruda (PL-DF), o ex-prefeito Cesar Maia (PSDB-RJ) e o ex-ministro Eduardo Pazuello (PL-RJ).
A Lei de Improbidade Administrativa foi criada em 1992 com o objetivo de reduzir a sensação de impunidade, em meio ao impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Mello. O principal argumento de parlamentares ao flexibilizá-la foi o de que era preciso atualizar a legislação para evitar excessos.
A atual lei é menos dura do que a anterior e estabelece que, além da comprovação do ato de improbidade, é preciso demonstrar que houve a intenção de cometê-lo para garantir a punição dos políticos.
No caso de Arruda, ele não apenas está livre da condenação, como pode novamente ser candidato nas eleições deste ano. Já Garotinho segue impedido de se candidatar pela Lei da Ficha Limpa em razão de outra condenação que teve na Justiça Eleitoral.
O ex-ministro Eduardo Pazuello (PL-RJ) — absolvido em maio, por causa da nova Lei de Improbidade, na ação que o responsabilizava pelo caos no sistema de saúde em Manaus, onde pacientes morreram asfixiados por falta de oxigênio em janeiro do ano passado — deve tentar uma vaga na Câmara.
No Supremo Tribunal Federal (STF), Arruda conseguiu decisões favoráveis do ministro André Mendonça, que anulou condenações impostas pela Justiça Comum em processos criminais, sob a alegação de que os casos deveriam ter sido analisados pela Justiça Eleitoral. No STJ, as condenações foram suspensas após as mudanças na Lei de Improbidade. Os casos têm relação com o período em que ele foi governador, entre 2007 e 2010, quando foi alvo da Operação Caixa de Pandora, que apurou um esquema de corrupção no governo local.
No Rio de Janeiro, a elegibilidade de Garotinho teve vida curta. Isso porque o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do estado confirmou uma nova condenação, imposta pela primeira instância, por compra de votos. Garotinho ainda tentou um recurso no STF, mas o ministro Ricardo Lewandowski negou na segunda-feira um pedido para suspender a condenação. Pouco depois, o seu partido, o União Brasil, decidiu retirar sua pré-candidatura ao governo do Rio.
Tanto na decisão de Garotinho quanto na de Arruda, o ministro Humberto Martins, presidente do STJ, citou uma decisão tomada pelo ministro Nunes Marques, do STF, que devolveu os direitos políticos a Roney Nemer, ex-deputado federal e ex-deputado distrital, o equivalente a deputado estadual no DF. Como Arruda, ele foi um dos alvos da Operação Caixa de Pandora. Nunes Marques lembrou que a nova lei mudou o prazo de prescrição. No caso de Roney Nemer, isso significa que ele poderia ser punido até 8 de junho deste ano. Assim, o ministro do STF restabeleceu os direitos políticos do ex-deputado.
Martins também suspendeu condenação por improbidade imposta pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais a Carlos Roberto Rodrigues, ex-prefeito de Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.
Uma decisão definitiva sobre a possibilidade de a nova lei da improbidade retroagir, ou seja, beneficiar pessoas condenadas por atos anteriores à sua aprovação, levando à absolvição, vai ser tomada em agosto pelo STF. Mas mesmo no caso de a Corte dizer que a lei não pode retroagir, mantendo as condenações já impostas, isso não deve encerrar a discussão do tema na Justiça Eleitoral, avaliou o advogado eleitoral Fernando Gaspar Neisser, integrante da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep):
— O que acho que vai acontecer este ano, e vai ser complexo, é que vamos ver muitas pessoas tentando candidaturas nessa situação, com condenações por improbidade que, sem dúvida, dois anos atrás as teriam deixado inelegíveis, e levantando a discussão para a Justiça Eleitoral fazer: “Olha, se eu fosse acusado hoje por esses mesmos fatos, eu seria absolvido, porque hoje isso não é mais improbidade” — pontua Neisser.