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Escritor Salman Rushdie em estado grave após ser esfaqueado

O agente do escritor britânico afirmou que ele "provavelmente perderá um olho"

Salman Rushdie, escritor - JOE KLAMARAFP

Salman Rushdie permanece hospitalizado em estado grave neste sábado (13), depois de ser esfaqueado em um evento literário no estado de Nova York, em um ataque que provocou indignação internacional, mas comemorado no Irã e no Paquistão.

O autor britânico, que passou décadas sob proteção policial depois que líderes iranianos ordenaram seu assassinato, foi submetido a uma cirurgia de emergência e convalesce respirando com ajuda de aparelhos depois que Hadi Matar, de 24 anos, invadiu o palco onde Rushdie falaria como convidado e o esfaqueou no pescoço e abdômen, na sexta-feira.

Os nervos de um de seus braços foram gravemente danificados, seu fígado foi atingido e "ele provavelmente perderá um olho", revelou Andrew Wylie, agente do escritor.

Rushdie, de 75 anos, vive sob pena de morte desde 1989, quando o então líder espiritual do Irã, o aiatolá Rouhollah Khomeini, emitiu um decreto religioso (fatwa) ordenando que os muçulmanos o matassem.

A "fatwa" foi a resposta ao romance "Os Versos Satânicos" que irritou os muçulmanos, que o consideraram uma blasfêmia.

 

Agressor cresceu nos EUA

Rushdie se mudou para Nova York no início da década de 2000 e obteve a cidadania americana em 2016. Apesar da contínua ameaça contra sua vida, o escritor era visto em público e muitas vezes sem aparente proteção policial.

A segurança não era particularmente rígida no evento de sexta-feira no Instituto Chautauqua, que organiza eventos culturais nesta pacata cidade do oeste de Nova York.

Testemunhas disseram que Rushdie estava posicionado no palco do auditório e estava se preparando para falar quando Matar emergiu da plateia, atacou o escritor e o esfaqueou várias vezes antes de ser derrubado no chão por seguranças e espectadores. Matar foi algemado e levado sob custódia policial.

Rushdie recebeu os primeiros socorros de um médico que estava na plateia. Em seguida, foi levado de helicóptero a um hospital na cidade de Erie, perto de Chautauqua.

A polícia disse que Matar, morador de Fairfax, Nova Jersey, foi formalmente acusado de tentativa de homicídio, mas não forneceu mais detalhes sobre quem ele era ou a motivação para o ataque.

Aparentemente, a família de Matar vem de Yaroun, uma cidade no sul do Líbano. Um jornalista da AFP que visitou a cidade libanesa neste sábado relatou que, segundo os moradores, os pais de Matar são divorciados e que seu pai, um pastor, ainda mora lá. Jornalistas que tentaram se aproximar dele foram expulsos.

Matar "nasceu e cresceu nos Estados Unidos", disse à AFP um funcionário do município local.

"Os Versos Satânicos" e seu autor continuam suscitando forte rejeição no Irã.

No principal mercado de livros de Teerã, diante do questionamento da AFP neste sábado, ninguém se atreveu a condenar abertamente o esfaqueamento.

"Fiquei muito feliz em ouvir a notícia", disse Mehrab Bigdeli, um homem de 50 anos que estuda para se tornar um clérigo muçulmano.

A mensagem foi semelhante na mídia conservadora do Irã. Um dos jornais conservadores disse que o "pescoço do demônio" havia sido "cortado por uma faca".

No Paquistão, um porta-voz do partido Tehreek e Lalbbaik Paquistão, que organizou protestos violentos contra o que considerava como blasfêmias antimuçulmanas, disse que Rushdie "merecia ser morto".

Em outros lugares as reações foram de indignação e multiplicaram-se as manifestações de solidariedade com o escritor.

O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, disse estar "chocado" e, em Washington, o conselheiro de segurança nacional americano, Jake Sullivan, chamou o ataque de "repreensível".

Rushdie ganhou fama internacional em 1981 com seu segundo romance, "Os Filhos da Meia-Noite". A obra, que retrata a vida na Índia após a independência, rendeu-lhe o prestigioso prêmio britânico Booker.

 

Memórias escondidas

A vida de Rushdie mudou completamente depois da publicação de "Os Versos Satânicos" em 1988. Os muçulmanos ficaram furiosos com a obra, que eles consideraram uma blasfêmia. O aiatolá Khomeini ordenou a morte do escritor, e Rushdie passou quase uma década escondido, durante a qual nem seus filhos sabiam onde morava.

Mesmo com a ameaça constante diminuindo aos poucos a partir do final da década de 1990, os eventos literários a que Rushdie comparecia eram sujeitos a ameaças ou boicotes.

Sua nomeação como cavaleiro da rainha Elizabeth II em 2007 gerou uma onda de protestos no Irã e no Paquistão, cujo ministro chegou a considerar que seria uma honra matá-lo em um ato suicida.

Desde que se mudou para Nova York, Rushdie tem sido um defensor da liberdade de expressão, especialmente depois que um ataque de islâmicos em 2015 dizimou a equipe da revista francesa Charlie Hebdo em Paris.

A fatwa não conseguiu sufocar a escrita de Rushdie e inspirou seu livro de memórias "Joseph Anton", em homenagem a seu pseudônimo enquanto estava escondido e escrito em terceira pessoa.