Mobilidade na RMR

Alternativa à BR-101, Arco Metropolitano está mais perto de sair do papel

Governo estadual pretende finalizar os estudos dos dois lotes da futura nova via ainda este ano

BR-101 corta o leste de Pernambuco - Arthur Mota/Folha de Pernambuco

Projeto de mobilidade que dura décadas, o Arco Viário Metropolitano do Recife está mais perto de sair do papel. Com a expectativa de fomentar o desenvolvimento da porção a oeste da Região Metropolitana, a estrada de gestão estadual orçada em mais de R$ 2 bilhões surge como uma alternativa à saturada e caótica BR-101, por onde diariamente circulam quase 60 mil veículos.

O desenho original do Arco, proposto pelo Governo do Estado ainda na década de 1990, prevê, pelo lado oeste da Região Metropolitana do Recife, a ligação expressa do Complexo Industrial Portuário de Suape, no Litoral Sul, a Goiana, na Zona da Mata Norte.

Atualmente, segundo consta no portal de Licitações do Governo de Pernambuco, a obra está na fase de estudos complementares e projetos executivos de engenharia do lote 2, trecho localizado entre a BR-408 e a BR-101 Sul.

Secretária estadual de Infraestrutura, Fernandha Batista (Foto: Flávio Japa/Seinfra)

A secretária estadual de Infraestrutura, Fernandha Batista, afirmou, em conversa com a reportagem, que essa é a fase mais próxima para o projeto do Arco Viário Metropolitano do Recife tornar-se, enfim, realidade e beneficiar a população.

“Tivemos uma reunião, recentemente, onde foram apresentados os estágios tanto do lote sul quanto do lote norte. No caso do lote sul, estamos em uma fase de detalhamento bem aprofundada”, explica a secretária, acrescentando que esse projeto deve ser finalizado até novembro deste ano. 

O Arco, quando ficar pronto, atravessará e influenciará diretamente uma região com grandes potenciais de crescimento industrial e logístico. Na extremidade sul, o Porto de Suape, com as indústrias de construção naval, siderurgia, refino de gás e petróleo. A oeste, as unidades industriais dos setores alimentício, metalúrgico e materiais de construção de Moreno, Vitória de Santo Antão e São Lourenço da Mata. E, ao norte, as grandes fábricas dos setores automobilístico, de bebidas, vidreiro e farmacêutico de Itapissuma, Igarassu e Goiana.

Mapa original do Arco prevê cerca de 77 km de extensão (Foto: Reprodução)

O projeto é dividido em dois trechos: o norte, que vai da BR-408, em Paudalho, até a BR-101 Norte, em Goiana, com cerca de 50 quilômetros. O traçado sul, com 45,3 quilômetros de extensão, começa na BR-408, em Paudalho, seguindo até a BR-101 Sul, no Cabo de Santo Agostinho.

Presidente do Pró-Pernambuco, Avelar Loureiro Filho (Foto: Gleyson Filho/Divulgação)

O presidente do Movimento Pró-Pernambuco, entidade que representa o empresariado, Avelar Loureiro Filho, cita o que classifica como motivos para a necessidade do Arco Viário: as melhorias no deslocamento urbano metropolitano e a eficiência logística entre os polos industriais dos litorais Norte e Sul. 

"A necessidade do Arco se dá por dois motivos: para viabilizar o desenvolvimento industrial do Litoral Norte, como também de Suape. Hoje, há um parque industrial na região norte e há uma ineficiência imensa na troca de mercadorias entre essa região e Suape", diz.

Acidente envolvendo dois caminhões um carro na BR-101, em Jaboatão, em fevereiro de 2022 (Foto: Divulgação/PRF) 

Avelar ainda lembra a situação da BR-101. Ele afirma que a rodovia, atualmente, tem mais características de avenida do que de BR. "[A BR] está com sua capacidade de carga além do que poderia suportar. No trecho urbano, principalmente de Jaboatão até Paulista, você tem hoje problemas seríssimos de deslocamento", completa.

Além dos problemas de deslocamento, a BR-101 também registra diversos acidentes anualmente, com feridos e mortos. Dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF) de 2019 a julho de 2022 mostram que houve 3.575 acidentes no trecho pernambucano da BR-101, com 242 mortes e 3.551 feridos. Só nos sete primeiros meses deste ano, foram 522 acidentes, com 39 mortes e 530 feridos. 

Veja os dados ano por ano:

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Em julho de 2021, o Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE-PE), através de uma medida cautelar, determinou que contrato com empresa especializada para elaboração de projeto de engenharia fosse sustado.

O contrato tinha valor de R$ 3,8 milhões e previa estudos de pré-viabilidade técnica e econômica e estudos ambientais para o Arco. O TCE-PE havia alegado que o documento "não dispunha de licença ambiental prévia". A licitação chegou a ser anulada em novembro, e o novo edital foi lançado em janeiro de 2022. 

Ambientalistas sugerem “arrudeio” 
O traçado proposto para o Arco Viário Metropolitano do Recife é alvo de alertas de ambientalistas, uma vez que cortaria a Área de Proteção Ambiental (APA) Aldeia-Beberibe, reconhecida como Unidade de Conservação (UC) por decreto estadual de 2010.

A APA corta oito municípios: Abreu e Lima, Araçoiaba, Camaragibe, Igarassu, Paudalho, Paulista, Recife e São Lourenço da Mata. Com 31.634 hectares, a área abriga a maior porção remanescente de Mata Atlântica em Pernambuco, que é também a mais extensa de todo o território brasileiro acima do rio São Francisco. Desse total, cerca de 18.822 hectares são de vegetação nativa, o que corresponde a 59,49% da área total da UC.

Segundo o Fórum Socioambiental de Aldeia, poderiam ser derrubados até 65,54 hectares da floresta, o equivalente a mais de 91 campos de futebol, caso o traçado original seja feito. Essa é apenas a degradação direta, defende a presidente do Conselho Gestor da APA Aldeia-Beberibe, Cinthia Lima. Isso porque, aponta ela, empreendimentos de grande porte como o Arco Viário são indutores de urbanização.

"Esses territórios devem ser vocacionados para a conservação da natureza, devem ter um uso equilibrado e sustentável dos recursos naturais. Essas atividades precisam ser muito bem ponderadas para não desencadear ações que não são sustentáveis", alerta a gestora, lembrando que há espécies de animais que ocorrem apenas na área.

Traçado proposto pelo fórum sugere evitar degradação da Mata Atlântica (Foto: Divulgação)


No território, há cinco unidades de conservação de proteção integral: a Estação Ecológica de Caetés, em Paulista; o Parque Estadual de Dois Irmãos, no Recife; o Refúgio da Vida Silvestre Mata de Miritiba, inserida na área do Campo de Instrução Marechal Newton Cavalcante (CIMNC), onde será erguida a Escola de Sargentos do Exército, em Abreu e Lima; o Refúgio da Vida Silvestre Mata da Usina São José, em Igarassu; e o Refúgio da Vida Silvestre Mata do Quizanga, em São Lourenço da Mata.

"A gente estaria colocando em risco com um empreendimento de urbanização e consolidação de atividades que não são compatíveis com a conservação da natureza que deveria ser vocacionada para isso", completa Cinthia Lima. 

Presidente do Conselho Gestor da APA, Cinthia Lima (Foto: Cortesia)

A APA foi criada para proteger os recursos hídricos da região, bem como as espécies da fauna e da flora da Mata Atlântica raras e ameaçadas de extinção, além de promover a melhoria da qualidade de vida da população que habita a unidade e seu entorno.

O impasse em relação ao traçado gerou diversas audiências e debates para conciliar um desenho do Arco Viário que atenda às necessidades de desenvolvimento do Estado sem impactar tanto o meio ambiente, especialmente de um bioma em extinção como é o caso da Mata Atlântica.

Após essas idas e vindas causadas pelo traçado inicialmente proposto, o debate em torno do Arco Viário segue e Cinthia cita que há discussão entre as partes para caminhos viáveis. "A sociedade civil organizada conseguiu colocar essa pauta ambiental na mesa para ser discutida. Por isso, por vezes, o processo parou. Dessa última vez que isso aconteceu, de fato, teve um indicativo pelo estudo de alternativas locacionais que passem por fora da APA", explica a gestora.

Cinthia alega, ainda, que um traçado por fora da APA seria bom também para municípios que estão no entorno do oeste metropolitano, como Itaquitinga e Tracunhaém: 

"É uma área muito degradada, com baíxissimo nível de cobertura florestal. Por que não utilizar essas áreas? Por que não colocar uma infraestrutura viária para dar suporte ao desenvolvimento desses municípios? A gente poderia aliar a questão da preservação da natureza à parte de desenvolver esses municípios". 

Vista aérea da APA Aldeia-Beberibe (Foto: Divulgação/CPRH)

Presidente do Fórum Socioambiental de Aldeia, o engenheiro e biólogo Herbert Tejo ressalta que a entidade “não tem nada contra o Arco”, mas lembra que é importante discutir o seu traçado.

“Entendemos que é uma obra necessária. Existem várias alternativas locacionais que atendem ao objetivo do Arco, ou seja, permitir uma opção de tráfego que não necessariamente tenha que cortar tantas cidades até o deslocamento da 101 Sul em direção a Suape. É uma obra necessária, mas ela não precisa cortar a Unidade de Conservação APA Aldeia-Beberibe”, alerta.

Presidente do Fórum Socioambiental de Aldeia, Herbert Tejo (Foto: Reprodução)

A secretária Fernandha Batista afirmou que estão sendo concluídos os estudos dos cenários de vantagens e desvantagens com os aspectos técnicos, ambientais e econômicos do traçado do Arco. “O governo decidiu reestudar o traçado, é um trabalho que vem sendo feito por um grupo multidisciplinar”, disse a gestora, que acrescenta: “Esse grupo é formado por profissionais especialistas em pavimentação, meio ambiente, desenvolvimento territorial, hidrogeologia”.  

“O trabalho vem sendo pensado para que o Estado tenha todos os elementos e que esse traçado e as soluções de engenharia sejam compatíveis com as soluções ambientais que a gente precisa ter”, pondera Fernandha Batista.

“Essa decisão de reestudar traçado foi prudente, a gente tem que ter todo o cuidado ambiental. Temos diversas medidas que precisam ser adotadas para que a gente garanta a preservação do meio ambiente, para que a gente cumpra todas as normas e que, ao mesmo tempo, garanta o direito de ir e vir, o desenvolvimento sustentável e o crescimento ordenado da Região Metropolitana”, completa Fernandha Batista.

Segundo a secretária, o Governo do Estado “vem reestudando não só duas ou três alternativas, mas diversas alternativas” em relação ao traçado do Arco Viário. “Esse estudo não é superficial, são estudos parametrizados com especialistas, que vão indicar o traçado adequado do Arco Metropolitano. A decisão de reestudar busca o equilíbrio econômico, técnico e ambiental. Não podemos dizer: ‘Passe por um traçado, cerca de 20 quilômetros a mais’ sem estudar a efetividade dessa obra. Não posso arriscar fazer uma obra de mais de R$ 1 bilhão se ela não tiver uso”, pontua Fernandha. 

Em relação às demandas ambientais, o presidente do Pró-Pernambuco defende o debate entre as partes como forma para tentar contornar a problemática. "O que está faltando? O governo estadual colocar todo mundo à mesa numa discussão ampla e sem definições prévias, sem vetos a priori de nenhuma das partes para discutir", pede Avelar Loureiro Filho. 

"Cada dia que passa, a economia do Estado fica prejudicada, a mobilidade urbana e a qualidade de vida das pessoas na metrópole fica comprometida", lembra o presidente do movimento, ao citar que a situação de impasse precisa ser resolvida. "Não importa por onde passa, tem que tomar uma posição. O Pró-Pernambuco não tem um traçado de preferência, quer que a discussão seja ampla e sem preconceitos", completa Avelar, que classifica o Arco Viário como uma pauta prioritária do Pró-Pernambuco.

Por sua vez, o presidente do Fórum Socioambiental de Aldeia lembra a riqueza natural existente na APA Aldeia-Beberibe, especialmente em relação à água. “O único sistema de abastecimento público no norte metropolitano é o Sistema Botafogo, totalmente encravado na APA e depende dos recursos hídricos desse território”, ressalta Herbert Tejo.

“Instalou-se um polo cervejeiro em Pernambuco por conta da qualidade da nossa água e da disponibilidade. É um território que a sociedade pernambucana precisa conhecer, se apropriar do que acontece nele e defendê-lo. Não estamos falando apenas do presente, mas principalmente do futuro”, defende.