Entenda qual é a relação entre Nossa Senhora Aparecida e Oxum

Padroeira do Brasil e orixá das águas doces foram unidas por representarem figuras maternas

Nossa Senhora Aparecida - Valter Campanato/Agência Brasil

Principalmente nos Estados do Sudeste e do Centro-Oeste, o sincretismo religioso tratou de associar Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, homenageada no feriado de 12 de outubro, a Oxum, o orixá feminino das águas doces, cultuado em religiões afro-brasileiras no dia 8 de dezembro.

Mas o que explica a associação entre a santa católica e o orixá? O sociólogo da religião e escritor Reginaldo Prandi, autor de “Mitologia dos orixás”, explica que ambas as divindades são grandes figuras maternas: Nossa Senhora representa Maria, mãe de Jesus, e Oxum é o orixá da fertilidade.



"Junto com Iemanjá, Oxum é a grande mãe da mitologia iorubá. É a senhora da fertilidade. Quando uma mulher engravida, sabe-se que isso é coisa de Oxum, que cuida do ato de fecundação. Já Iemanjá se responsabiliza pelas crianças após o nascimento", afirma.


Prandi lembra que a relação entre Nossa Senhora Aparecida e Oxum está presente até mesmo na Catedral de Brasília, consagrada à padroeira. Um dos vitrais da artista Marianne Peretti, localizado atrás do altar-mor, mostra a figura de um ovo, símbolo da fertilidade e de Oxum.

O laço entre a Nossa Senhora Aparecida e Oxum, diz Prandi, é forte em Estados como Rio de Janeiro e São Paulo. Em outras regiões do país, o orixá é associado a outras Nossas Senhoras, como Nossa Senhora da Conceição, no Sul, Nossa Senhora das Dores, em Minas, Nossa Senhora das Candeias e Nossa Senhora dos Prazeres, na Bahia, Nossa Senhora do Carmo, em Pernambuco, e Nossa Senhora de Nazaré no Norte.

Prandi reforça que, embora a santa e a orixá tenham relação com as águas doces (Nossa Senhora foi resgatada por pescadores do Rio Paraíba do Sul, no interior paulista, em 1717), não é isso que sustenta a ligação das duas. É apenas uma coincidência.

Santa negra
A tradição católica ensina que a imagem de Nossa Senhora Aparecida foi “pescada” por João Alves, Felipe Pedroso e Domingos Garcia. Primeiro, o corpo da santa surgiu das águas. Depois, a cabeça. Segundo a história, após o aparecimento da santa (por isso chamada de “Aparecida”), as redes dos pescadores se encheram de peixes, como nos milagres bíblicos.

Nossa Senhora Aparecida é negra. A ela é atribuído o milagre da libertação do escravizado Zacarias, cujas correntes teriam se arrebentado enquanto ele suplicava o auxílio da santa.

Pesquisadores divergem sobre as razões da pele escura da padroeira, que, originalmente, representaria Nossa Senhora da Conceição, que é branca. Alguns afirmam que a imagem teria escurecido devido ao tempo passado embaixo d’água. Outros sugerem que a fumaça das velas do oratório onde a imagem permaneceu até ser transferida para uma capela, em 1745, teria alterado sua cor.

Durante muito tempo, a negritude da santa foi apagada por setores da Igreja Católica e só foi reafirmada graças à popularização das manifestações culturais afro-brasileiras, no início do século, e à divulgação da Teologia da Libertação, a partir dos anos 1960.