Economia

Países da América Latina aguardam sinalização de Lula para apoiar Ilan Goldfajn no BID

Candidatura de brasileiro para presidência do banco multilateral enfrenta resistências dentro do governo eleito. Indefinição preocupa governos vizinhos

Ilan Goldfajn - Marcelo Camargo/Agência Brasil

Faltando 12 dias para a eleição do novo presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), instituição de enorme importância no sistema de governança regional, e com o brasileiro Ilan Goldfajn já inscrito pelo governo de Jair Bolsonaro como candidato, a região está na expectativa de uma sinalização,  explícita ou tácita, do governo eleito de Luiz Inácio Lula da Silva sobre o pleito.

Segundo o jornal O Globo apurou, vários governos latino-americanos estariam dispostos a apoiar a candidatura de Goldfajn, entre eles Argentina e Colômbia, se Lula decidir não se opor ao nome do ex-presidente do Banco Central e atual Diretor do Departamento do Hemisfério Ocidental do Fundo Monetário Internacional (FMI).

Se, pelo contrário, o presidente eleito, em sintonia com a opinião de alguns de seus colaboradores, defender a ideia de que Goldfajn não tem o perfil adequado para o cargo, ele é considerado por alguns auxiliares próximos de Lula como um candidato de Bolsonaro e do atual ministro da Economia, Paulo Guedes, os governos da região deverão encontrar um nome de consenso ou, num cenário que parece difícil, mas não impossível, pressionar pelo adiamento da eleição.

Na visão de alguns setores do governo eleito, confirmaram fontes, Ilan não tem experiência em políticas de desenvolvimento e integração, foco principal do BID. Nesta ala, predomina, também, um mal-estar pelo fato de a candidatura ter sido confirmada pela equipe de Guedes apenas dois dias antes do segundo turno das eleições presidenciais. Outros, mais ligados ao vice-presidente eleito Geraldo Alckmin, consideram Goldfajn um bom candidato e são favoráveis ao respaldo à sua candidatura.

Está em jogo a possibilidade de o Brasil ter pela primeira vez desde que foi criado o BID, há 63 anos, a presidência da instituição. Pesa contra o candidato brasileiro o antecedente do americano Mauricio Claver-Carone, recentemente destituído da presidência do BID em meio a um escândalo que traumatizou o banco. Primeiro americano a ocupar o cargo, Claver-Carone foi eleito por forte pressão do governo de Donald Trump em setembro de 2020, com o apoio do Brasil de Bolsonaro, entre outros, dois meses antes da eleição do atual presidente americano, Joe Biden.

O governo americano, confirmaram fontes envolvidas nas conversas sobre a eleição, está aberto a todas as possibilidades, mas espera consenso por parte dos latino-americanos, para não repetir os erros do passado recente.

Nos últimos dias, surgiu um novo candidato que desembarcará em Washington nesta terça-feira, para fazer campanha e, no próximo domingo, apresentar seu programa aos governadores do BID: o chileno Nicolás Eyzaguirre, ex-ministro da Fazenda dos governos de Ricardo Lagos e Michelle Bachelet.

O Chile aspira a que Eyzaguirre termine sendo o candidato de consenso entre os latino-americanos, contanto, até mesmo, com o aval do governo eleito do Brasil. Os ex-presidentes Lagos e Bachelet estão muito interessados no assunto, e, segundo fontes chilenas, estariam tentando entrar em contato com interlocutores próximos de Lula.

Estados Unidos, Brasil e Argentina são os principais sócios acionistas do BID, com 30%, 11,2% e 11,2% de participação, respectivamente. A posição destes três países é determinante em qualquer eleição. Em 2020, Claver-Carone foi eleito com o apoio dos EUA e Brasil, tendo a Argentina como líder de seus opositores e que tentou, inclusive, adiar a votação.

Na atual campanha, a Argentina de Alberto Fernández não pretende repetir a mesma estratégia, mas insiste na necessidade de que exista um candidato de consenso. Segundo confirmaram fontes da Casa Rosada, o assunto foi conversado por Fernández e Lula no encontro que tiveram em São Paulo, após o segundo turno. Agora, o chefe de Estado argentino aguarda, como muitos outros, um posicionamento claro do presidente eleito do Brasil.

Também foram lançados os nomes da mexicana Alicia Bárcena, ex-secretária executiva da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), da ex-presidente da Costa Rica Laura Chinchilla, e do equatoriano Augusto de la Torre, ex-chefe do Banco Mundial para a América Latina. A candidata do governo mexicano, comentaram fontes em Washington, enfrenta resistências do Partido Republicano americano por sua suposta proximidade com governos de esquerda questionados na região, entre eles Cuba e Nicarágua. A candidatura de Chinchilla perdeu fôlego nas últimas semanas e o equatoriano, confirmaram fontes no BID, tampouco teria conseguido um alto nível de adesão.

Com este pano de fundo, o nome de Goldfajn ganhou força na região. A campanha a seu favor tem defendido a ideia de que o ex-presidente do BC não é um candidato político, nem "o candidato de Bolsonaro”. Foram organizavas reuniões bilaterais com vários países e, segundo fontes do governo brasileiro, “as sinalizações foram excelentes”.

O candidato tem sido apresentado como “a opção do Brasil, e não de um governo”. As mesmas fontes afirmaram que “não existe resistência no guarda-chuva de Alckmin”. Mas outras alas do governo eleito são enfaticamente contrárias à candidatura de Gondfajn e apontam, inclusive, conflitos de interesses pelo fato de que até algumas semanas atrás o ex-presidente do BC estava negociando com a Argentina no âmbito do FMI.

Até agora, o governo eleito não vetou publicamente a candidatura apresentada pelo atual governo e não se pode descartar a possibilidade de que não o faça. Os cenários hoje são três: que Lula seja convencido a apoiar Goldfajn, e assim o façam, também, a grande maioria dos governos da região; que Lula não respalde o candidato brasileiro e opte por outro latino-americano que tenha consenso, por exemplo o chileno; que se decida avançar com uma tentativa de adiamento da eleição, hoje a opção menos provável por resistências dentro do BID.

As divergências internas, num contexto de uma transição complexa e delicada, estão demorando que se tenha um posicionamento claro do governo eleito sobre um pleito que representa hoje a primeira grande batalha de Lula no cenário externo e regional.