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Maxwell Alexandre pede que sua obra seja retirada de mostra em Inhotim e museu rebate

Trabalho do artista carioca compõe a exposição 'Quilombo: vidas, problemas e aspirações do negro', inaugurada na última sexta-feira (19) pela instituição mineira

Obra de Maxwell Alexandre exposta em Inhotim - Reprodução/ Redes Sociais

Maxwell Alexandre pediu que uma obra de sua autoria fosse retirada de uma exposição inaugurada em Inhotim, no último sábado (19). Parte de uma programação do museu que celebra o legado de Abdias do Nascimento (1914-2011), a mostra "Quilombo: vidas, problemas e aspirações do negro" apresenta um panorama com a produção de 34 artistas negros, entre eles Panmela Castro, Mulambö, Antonio Obá, Wallace Pato, Desali, Paulo Nazareth, Kika Carvalho e Zéh Palito.

Em post publicado nas suas redes sociais no dia da inauguração, Maxwell Alexandre afirma que se sentiu constrangido quando se deparou "com a comunicação da exposição", sem dar maiores detalhes. "Sempre fico constrangido com exposições temáticas sobre o negro", escreveu o artista. Ainda segundo Maxwell, ao solicitar a retirada de sua obra da exposição, ele ouviu "explicações da instituição, muitas delas plausíveis, fundamentadas", mas que não foram suficientes. "Ainda não gosto da decisão final, ela ainda me constrange", escreveu.

O artista também criticou a outra exposição que o museu lançou em paralelo à "Quilombo", com o título "O mundo é o teatro do mundo", que tem obras de Jonathas de Andrade e da dupla Barbara Wagner e Benjamin de Burca. "Com apenas três artistas brancos. É quase uma individual", disse Maxwell. Segundo o museu, as duas mostras partem conceitualmente do jornal “Quilombo: vida, problemas e aspirações do negro”, editado pelo Teatro Experimental do Negro (TEN) — fundado por Abdias — entre 1948 e 1950. A pesquisa feita por Inhotim em torno de Abdias Nascimento foi feita em parceria com o Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (Ipeafro).

Em um segundo post, Maxwell Alexandre impõe uma condição para a permanência de sua obra na mostra inaugurada no sábado: "A única maneira de eu estar em Inhotim com minha aprovação é em meu próprio pavilhão, assim como Tunga e Adriana Varejão".

Ao GLOBO, o departamento de comunicação de Inhotim rebateu as críticas do artista carioca. "Foi enviado um e-mail para ele no dia 24 de agosto, tanto com um pedido de permissão como com uma carta convite que trazia detalhes sobre as duas exposições. Ele retornou no dia 5 de setembro dando 'OK', mas falando que não poderia comparecer à reabertura por conta de um compromisso em sua agenda".

Co-curadora da mostra em questão, a diretora artística de Inhotim, Julieta González, afirmou que a obra de Maxwell Alexandre que compõe "Quilombos" foi comprada junto ao artista pela instituição mineira e que, dando a entender que, por isso, não deve retirá-la da mostra.

"É uma obra da nossa coleção, essa é uma conversa muito mais longa" afirmou González. "Estou trabalhando em Inhotim há um ano e, que eu saiba, nunca aconteceu uma situ desse tipo. É uma conversa muito mais profunda, de várias partes. Quando um artista aceita vender uma obra para uma coleção, ele tem que entender que essa obra ganha uma outra vida. E ele não pode controlar essa vida nesse sentido. Eu que já trabalhei em muitos museus no mundo, digo que é muito difícil que um artista decida a política curatorial de uma instituição. Isso não acontece em nenhum lugar."

Sobre a crítica de Maxwell a respeito de uma suposta falta de pessoas negras na equipe do museu, a diretora artística diz que é da política da instituição trabalhar, por exemplo, junto à comunidade quilombola que existe no entorno de Inhotim. E que há, sim, pessoas negras trabalhando em diversos setores do museu.

"Nosso curador assistente, Deri Andrade, é negro. Ele foi a pessoa que mais conduziu a exposição, tendo um papel muito importante, apesar de ser um curador ainda em formação. Temos comunidades quilombolas no entorno que inclusive estiveram presentes no dia da inauguração. Temos um trabalho com eles que ninguém sabe, porque não fazemos publicidade, mas é um trabalho de base. Na nossa equipe técnica, há pessoas negras que começaram no jardim, por exemplo, e hoje ocupam cargos de coordenação. Nas redes sociais as coisas não ficam bem ditas, sobretudo quando a pessoa não conhece o trabalho que fazemos" afirmou Julieta González.

A diretora artística também rebateu a reclamação de Maxwell de que não há pavilhões dedicados à artistas negros no local. Ela adiantou ao GLOBO que já está em andamento em Inhotim a construção de um pavilhão dedicado à artista nigeriana Otobong Nganka, com previsão de abertura para 2024. O projeto é da arquiteta Mariam Kamara, fundadora do escritório Atelier Masōmī, sediado em Niamey, no Níger.

Julieta González frisou também que Maxwell Alexandre foi o único dos 34 artistas contemplados na exposição que se manifestou negativamente a respeito da inclusão da sua obra. Procurado pelo GLOBO, Maxwell Alexandre não atendeu aos pedidos de entrevista até a publicação desta reportagem.

Via redes sociais, o Ipeafro comemorou a abertura das mostras, frisando que "trazer o protagonismo negro às instituições museais implica tensões e polêmicas, frutos das relações de poder denunciada há 78 anos pelo TEN e ainda hoje fortemente marcadas pelo racismo".