Empreendedorismo Feminino

Empreendedorismo feminino enfrenta desafios, mas cresce no País

Pernambuco é o sétimo Estado com maior concentração de donos de negócios do Brasil. Apesar da boa posição, apenas 33% são do sexo feminino, segundo estudo do Sebrae

Empreendedora Negralinda - Melissa Fernandes/Folha de Pernambuco

As mulheres vêm conquistando cada vez mais espaço nas mais diversas atividades econômicas, e ocupando posições no mercado de trabalho que antes eram exclusivamente masculinas. Entre elas está o empreendedorismo. Pernambuco é o sétimo Estado com maior concentração de donos de negócios do Brasil. Apesar da boa posição, apenas 33% são do sexo feminino, segundo estudo do Sebrae. E diversos motivos fazem com que elas se lancem como empreendedoras, principalmente pela falta de emprego e porque ambientes de trabalho ainda são hostis. Por isso, muitas acabam abrindo uma empresa mais por necessidade.


Segundo a analista do Sebrae-PE e gestora do programa Sebrae Delas no estado, Maria Eduarda Rocha, o setor de serviços é onde mais se empreende, dentro de Pernambuco chega a quase 40% dos empreendimentos. "Olhando para o lado feminino, também é onde elas mais empreendem. A maioria prefere atuar em segmentos nos quais tem familiaridade, como alimentação, beleza e estética”, explica.

O impacto dos negócios é fundamental para essas cidadãs, para a família delas e para a sociedade. Para elas, gerir um negócio se torna ainda mais difícil, porque além das barreiras de gerenciamento de negócios, outros fatores como diferença de remuneração salarial, dificuldades para liderar uma família e equipe de trabalho ao mesmo tempo, falta de confiança, racismo e outros preconceitos estruturais são alguns problemas comuns.


No entanto, muitas mulheres estão mudando essa situação. A arquiteta Raisa Carvalho, é um exemplo de que a iniciativa de empreender no sexo femino, em grande parte, ocorre por necessidade. Na pandemia da covid-19 ela foi demitida e foi aí que começou sua jornada.  
“Eu trabalhava no setor de eventos, com CLT, em uma empresa de cenografia. Com a chegada da pandemia, todos foram demitidos e ficamos sem expectativa de retornar. Com isso, minha atual sócia me convidou para começarmos a produzir móveis e dessa forma tentar um novo ninho no mercado. Era um ramo até então desconhecido para mim, pois os móveis que produzimos para eventos não precisavam ter a mesma qualidade e durabilidade, era algo para ser usado de forma temporária. Tive medo, mas não deixei ele me paralisar”, ressalta Raisa.

 

Jornada tripla

Mesmo com o passar dos anos e a evolução da sociedade, até hoje o sexo feminino continua sendo o maior responsável por tarefas domésticas, segundo a pesquisa do Sebrae, que mostra que 49% das mulheres empreendedoras no Brasil, são chefes de família. E enfrentam uma jornada tripla para empreender. 
A realidade demonstra que, além de administrarem seus negócios, elas ainda são responsáveis por cuidar da casa, e de encontrar espaço para os estudos. Esse tipo de jornada traz malefícios, como sobrecarga física e mental, por exemplo. Contraditoriamente, as mulheres dedicam 17% menos horas no próprio negócio que os homens, porque chegam a trabalhar 10,5 horas por semana a mais que eles por também realizar os afazeres domésticos e obrigações com os filhos, de acordo com estudo feito pelo Sebrae.


Sem rede de apoio

Segundo a proprietária da loja feminina Sievá, Vitória Menezes, ela vira mil pessoas ao mesmo tempo. “Eu sou administradora, modelo, marketing, financeiro, e às vezes até entregadora quando preciso. Faço tudo sozinha, sem rede de apoio nenhuma. É bem complicado administrar tantas funções. O ideal às vezes é delegar o máximo de funções, para evitar ficar sobrecarregada. Mas aí a gente vai tendo esse jogo de cintura, tentando manobrar de alguma forma”, conta.


Isso é de fato um impasse enorme para todas ou pelo menos a maioria das mulheres e aumenta quando a empreendedora é mãe. “No início eu planejava mil coisas e não conseguia executar nenhuma. Tentei vários métodos e também não conseguia seguir nenhum. Até o momento em que mentalmente eu estava exausta e posso dizer, surtando! Foi quando eu parei, respirei e entendi que eu não daria conta de tudo e estava tudo bem. O importante era fazer o que dava da melhor maneira possível! Depois dessa virada de chave tudo começou a ser mais leve e fluir melhor”, conta a dona da loja de acessórios Cor e Nós, Ana Tammyres.


Em boa parte dos casos, o simples fato de ser mulher faz com que acionistas e investidores desacreditem e diminuam a credibilidade do negócio, além de duvidarem da capacidade de gestão da empreendedora.Cenários como estes são bastante comuns e refletem a imagem construída ao longo dos anos de que os homens são melhor preparados para a iniciativa.


Segundo a proprietária da Revive Lingerie, Flávia Costa, o empreendedorismo é muito distante para as mulheres.
“A gente nunca teve essa posição de chefe, de ocupar um cargo de gestão. O campo não é aberto para a gente, é muito diferente o tratamento de uma mulher e de um homem que resolve empreender. Nós fomos meio que contempladas negativamente com a ideia de que a mulher tem que fazer trabalhos domésticos, e de que o fornecedor de tudo é o homem. Talvez isso tenha sido uma grande dificuldade para mim no começo, pois eu tinha medo de apostar e não obter sucesso”, conta.


Preconceito racial

O preconceito racial é outra camada adicionada como barreira para mulheres empresárias. O rendimento médio mensal das mulheres empreendedoras negras no Brasil é de R$ 1.539, enquanto o das mulheres brancas é R$ 2.305, segundo pesquisa do Sebrae. Além disso, elas têm mais dificuldades de manter seus negócios do que as brancas. Disparidades em educação e oportunidades de crédito fazem a vida da mulher negra mais difícil na hora de abrir um negócio.


De acordo com a chef de cozinha Negralinda, estar cursando a faculdade é muito importante. “Eu sou estudante do 4° período do Curso Tecnologia em Gastronomia. Sou bolsista na faculdade. O que é mais difícil é o preconceito e a discriminação. Minha aceitação como chef de cozinha foi muito difícil e ainda é, porque muitas pessoas diziam que eu não poderia ser chamada de chef, porque não era formada em curso superior de gastronomia. Ainda sinto a discriminação dentro do mundo dos chefs de cozinha”, afirma.
Negralinda também fala sobre a dificuldade da mulher negra no mundo dos negócios. “Com isso é preciso se apropriar de todos os espaços possíveis e até dos que parecem impossíveis. As mulheres negras ainda são minoria no empreendedorismo no Brasil porque quase todas são de famílias pobres, sem recursos financeiros para abrir seus negócios, não têm crédito no mercado financeiro porque não têm bens ou patrimônio para oferecer como garantia”, ressalta.

 

Diretrizes da ONU

A Organização das Nações Unidas (ONU), em 2014 estabeleceu 19 de novembro como o Dia Mundial do Empreendedorismo Feminino. Os principais objetivos são incentivar o ingresso de mulheres no mundo dos negócios, ampliar as oportunidades,  destacar e valorizar o papel delas nesse ambiente.