José Múcio e Dino assumem missão de distensionar relação de Lula com Forças Armadas e policiais
A tarefa mais espinhosa caberá ao futuro ministro da Defesa, dada a histórica proximidade dos militares com Bolsonaro
Anunciados na sexta-feira como ministros do futuro governo pelo presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-governador Flávio Dino (Justiça) e o ex-ministro José Múcio Monteiro (Defesa) vão comandar duas das pastas mais sensíveis para o grupo político que assumirá o comando do país a partir do dia 1º de janeiro. Além de botar em prática as ações de suas áreas, eles foram encarregados de pacificar as relações com integrantes das Forças Armadas, policiais federais e do Judiciário, setores do Estado em que o petista e seus aliados mais enfrentaram resistências.
A tarefa mais espinhosa caberá a Múcio, dada a histórica proximidade dos militares com o presidente Jair Bolsonaro, capitão da reserva do Exército. Tão logo foi confirmado por Lula, o futuro ministro da Defesa já fez gestos para demonstrar a disposição de criar um bom ambiente com a caserna. Disse que pretende se encontrar com o próprio Bolsonaro, de quem foi colega na Câmara dos Deputados, e que vai ser reunir nos próximos dias com os comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. Antes mesmo de ser anunciado, Múcio conversou com o atual titular da cadeira, Paulo Sérgio Nogueira.
— Vou falar com os atuais o comandantes na próxima semana. Tenho boa relação com eles todos. Tem uma transição facílima — minimizou Jose Múcio.
As dificuldades dos militares com Lula foram manifestadas de diferentes maneiras desde a campanha. Na mais recente delas, os atuais comandantes das forças indicaram que pretendem antecipar a troca de comando para o final deste ano. A passagem de bastão costuma ocorrer em janeiro. Múcio deixou claro que a decisão o desagradaria.
Em mais um gesto em busca de pacificação, ele e Lula decidiram que vão respeitar a tradição militar e indicar aos comandos das forças os quadros mais antigos de cada uma delas. São eles: o tenente-brigadeiro do Ar Marcelo Damasceno para a Aeronáutica; o general Julio Cesar de Arruda ao Exército; e o almirante de Esquadra Marcos Olsen à Marinha.
‘Seis’ Forças Armadas
Múcio, por outro lado, também tem demonstrado que não pretende tolerar eventuais insubordinações por parte dos fardados, como disse ontem em entrevista à Globonews. Na mesma ocasião, ele afirmou acreditar que a rejeição à Lula não é unanimidade nos quartéis.
— Hoje, não existem três Forças, existem seis: o Exército, a Marinha e a Aeronáutica que gostam do Lula, e o Exército, a Marinha e a Aeronáutica que gostam do Bolsonaro — afirmou, antes de concluir: — Nós precisamos pacificar esse país.
A percepção é compartilhada por outros aliados próximos de Lula, que ontem aunicou também os titulares da Fazenda, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad; da Casa Civil, que será comandada pelo ex-governador da Bahia Rui Costa; e o diplomata Mauro Vieira para o Itamaraty.
— O primeiro grande desafio é pacificar e unir o nosso país — pregou Rui Costa, durante o evento “E agora, Brasil?”, promovido pelos jornais O Globo e Valor Econômico na terça-feira.
Assim como Múcio, ex-governador do Maranhão e senador eleito Flávio Dino (PSB) é amigo de Lula há mais de uma década, elemento importante para ambos terem sido escalados para missões tão estratégicas. Dino, por sua vez, precisará amainar as tensões com os quadros da Polícia Rodoviária Federal (PRF), instituição que deu uma guinada bolsonarista nos últimos anos. O diretor-geral da corporação, Silvinei Vasques, é declaradamente apoiador do atual presidente da República. Durante a campanha, sob seu comando, a PRF realizou uma operações de fiscalização a transporte de passageiros, o que atrasou a chegada de eleitores a seus lugares de votação em localidades do Nordeste onde Lula historicamente obtém vitórias eleitorais.
Ao divulgar a opção pelo ex-governador, Lula resumiu o que espera dele:
— O companheiro Flávio Dino tem a missão de primeiro consertar o ministério. Vamos primeiro arrumar a casa.
O futuro ministro da Justiça tem adotado um tom mais vertical do que seu colega da Defesa. Embora também pregue a pacificação, ele demonstra explicitamente o descontentamento com o comportamento de boa parte das tropas.
— Pouco importa em quem cada policial votou. Quem quiser se engajar na agenda de trabalho, será bem-vindo. Quem quiser ficar numa posição de sectarismo, de radicalismo... no que depender das atribuições federais, não vamos concordar. Vamos separar o joio do trigo — afirmou à Globonews.
Pontes com o Judiciário
Ex-juiz de primeiro grau, Dino ainda precisará aparar arestas abertas entre o futuro chefe e ministros de tribunais superiores.
Lula acumula um rosário de acusações e críticas ao Judiciário, grande parte delas proferida após condenações aplicadas a ele próprio e a seus aliados durante o julgamento do mensalão, em 2012, e a operação Lava-Jato. Em consequência dessa última, Lula chegou a ser preso e ficou encarcerado por quase dois anos preso. Mais tarde, porém, as sentenças contra ele foram anuladas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), momento em que as pontes começaram a ser reconstruídas entre as partes.