ORÇAMENTO

"PEC da Transição": PT tenta votar proposta nesta terça (20) e evitar redução de prazo e valor

Clima no Congresso é de retaliação após STF garantir recursos para o Bolsa Família e inconstitucionalidade de orçamento secreto

Congresso - Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

O PT tenta votar hoje na Câmara dos Deputados a “PEC da Transição”, a proposta de emenda constitucional que abre espaço no Orçamento para promessas de campanha, em meio a um clima de retaliação no Congresso após decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre garantia de recursos para o Bolsa Família e sobre a inconstitucionalidade do orçamento secreto.

Parlamentares do Centrão, especialmente do PP e do PL, começaram a articular uma forma de desfigurar o texto aprovado no Senado. Eles avaliam, por exemplo, reduzir o prazo de validade da PEC de dois para um ano, o que forçaria o governo a negociar novamente com o Congresso para garantir recursos para 2024.

O valor da proposta, de R$ 168 bilhões, incluindo investimentos, também está na mira dos deputados. O volume de recursos previsto na PEC aprovada no Senado Federal garante não só a manutenção do Bolsa Família em R$ 600 como o aumento real do salário mínimo e a recomposição de verbas para programas como o Farmácia Popular.

Haddad e líderes
Ciente das tratativas em curso, o PT vai negociar a PEC até o último minuto para evitar a desidratação do texto. O futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que vai se reunir hoje com líderes dos partidos na Câmara:

— Vamos insistir em uma saída política, organizada e institucional. Vamos aprovar um Orçamento transparente, de acordo com o desejo da população, e aprovar a “PEC da Transição”. Não há por que não votar a PEC — afirmou.
 

Além da pressão por mudanças no texto, o PT enfrenta a pressão do tempo. A depender da extensão das alterações no texto, a PEC precisaria ser analisada novamente pelos senadores. Ela foi aprovada na Casa no início de dezembro. Mas o Congresso só tem até o próximo dia 22, fim do ano legislativo, para aprovar a PEC e o Orçamento de 2023, como prevê a Constituição.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), é um dos principais afetados pela decisão do STF. Ao longo dos últimos anos, ele vinha usando o orçamento secreto como forma de construção de apoio político, já que seus aliados recebiam um volume maior de recursos.

Orçamento secreto
Para 2023, já estavam reservados R$ 19,4 bilhões para o orçamento secreto. Parlamentares discutem agora transferir esse valor para as comissões temáticas do Congresso, como saúde e educação, o que mantém o dinheiro sob o poder dos parlamentares. A transferência desses recursos pode fazer parte da negociação para garantir a votação da PEC dentro do prazo na Câmara.

Após reunião ontem com Lira, Haddad disse que vai falar com líderes sobre o destino dos recursos das emendas de relator, a base do orçamento secreto:

— Amanhã (hoje), vamos falar com os líderes, explicar os conceitos da PEC e o que vamos fazer com o RP9 (nome técnico do orçamento secreto), que vai continuar no Orçamento, e definir a destinação desses recursos para melhorar as obras de infraestrutura e concluir obras que estão paradas — afirmou.

Enquanto o governo eleito não chega a um consenso com o presidente da Câmara, Lira disse a pessoas próximas que a PEC será votada nesta terça-feira, mas indicou que a proposta ainda não tem os 308 votos necessários para ser aprovada.

Na semana passada, havia cerca de 200 votos, de acordo com líderes. O sentimento, segundo esses interlocutores, é que a atuação do Supremo alterou o cenário político e piorou o humor dos parlamentares.

Caça por votos
Lira vinha cobrando cargos no governo e a indicação de aliados para pastas com orçamento robusto, como Saúde, Integração Nacional e Minas e Energia, para assegurar a votação da PEC. Ele se reuniu no domingo com o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, no hotel em que o futuro mandatário está hospedado em Brasília.

Na noite de domingo, porém, o PT ganhou um plano B caso não consiga destravar a PEC no Congresso. O ministro do STF Gilmar Mendes decidiu que a manutenção do Auxílio Brasil, que voltará a se chamar Bolsa Família no governo Lula, pode ocorrer por meio da abertura de crédito extraordinário e que essas despesas podem ficar fora do teto de gastos, a regra que limita o crescimento das despesas públicas.

A previsão é que o programa social custará R$ 175 bilhões no próximo ano, dos quais apenas R$ 105 bilhões já estão na previsão orçamentária. Com base na decisão de Gilmar Mendes, a diferença poderia ser coberta por crédito extraordinário.

Apesar da garantia de um caminho alternativo, que assegura a manutenção do valor do benefício em R$ 600, o PT prefere a PEC por contemplar outras despesas consideradas prioritárias. O futuro ministro da Casa Civil, Rui Costa, disse que a PEC é o plano “A, B e C”.

— A turma está negociando. O plano A, B e C é a aprovação da PEC — disse ele.

Um dos complicadores na caça pelo voto é o alto índice de renovação de cadeiras da Câmara, de 40%, o que equivale a 2019 parlamentares que não foram reeleitos e não têm qualquer compromisso com o futuro governo.

Um expoente do Centrão afirma que os deputados de saída não estão sendo procurados. A mesma fonte ressalta que as negociações entre o futuro governo e o Congresso envolvendo o comando de ministérios têm limites e que, no momento, não há como assegurar que a PEC será aprovada ou que não terá seu texto desidratado na Câmara.