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Meu Malvado Favorito e Coringa: por que amamos odiar os vilões?

Novo estudo pode ajudar a explicar esse apreço pelo personagem, assim como por tantos outros que despertam o interesse do público, embora vilões

Pesquisadores da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, decidiram avaliar essa relação entre crianças e adultos com as figuras dos vilões - Reprodução

Segundo o dicionário, a figura do vilão é um ser “indigno, abjeto, desprezível” que representa o “lado mau” em filmes, séries, livros, entre outros. Ainda assim, o personagem muitas vezes é apontado como o favorito pelo público, e ganha até narrativas individuais focadas na sua trajetória até a vilania, como os sucessos “Meu malvado favorito” e “Coringa”. Mas o que leva as pessoas a se sentirem atraídas àqueles que deveriam representar a parte negativa da história?

Pesquisadores da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, decidiram avaliar essa relação entre crianças e adultos com as figuras dos vilões. Para isso, realizaram três entrevistas com 434 pessoas de 4 a 12 anos, e 277 acima de 18, com perguntas sobre a interpretação deles de quatro personagens. Foram eles famosos vilões e heróis de histórias infantis: Úrsula, do filme “A pequena sereia”; Capitão Gancho, do “Peter pan”; Woody, de “Toy Story”, e o Homem-aranha.

A ideia era comparar os diferentes julgamentos do público, entre heróis e vilões, e identificar as especificidades frente aos personagens criados para representar um lado negativo. O estudo, publicado na revista científica Cognition, mostrou que a maior parte das pessoas acredita que os vilões têm uma “qualidade redentora” interna.

O mesmo não foi observado em relação aos heróis, que foram interpretados como positivos tanto por fora quanto por dentro.

“Em outras palavras, as pessoas acreditam que há uma incompatibilidade entre os comportamentos externos de um vilão e seu verdadeiro eu interior, e essa é uma lacuna maior para os vilões do que para os heróis”, explica Valerie Umscheid, pesquisadora no departamento de psicologia da universidade e principal autora do estudo, em comunicado.

É o que pode ter acontecido, quando a série “House of the Dragon”, da HBO, derivada do universo de “Game of Thrones'' estreou em agosto. Assim como sua antecessora, a produção bateu recordes de audiência e rapidamente atraiu o interesse do público – especialmente para um personagem, que assumia um papel vilão nos primeiros episódios da trama.

No entanto, os próprios produtores da série afirmaram não entender o porquê do público gostar tanto do personagem, chamado Daemon. Em entrevista ao portal americano The Hollywood Reporter, a roteirista e produtora executiva, Sara Hess, comentou sobre o fenômeno.

— Ele se tornou o “namorado da Internet” de uma forma que me deixa perplexa. Não que Matt (ator que interpreta Daemon) não seja incrivelmente carismático e maravilhoso, e ele está incrível no papel. Mas o próprio Daemon é... não quero que ele seja meu namorado! Estou um pouco perplexa como todos eles dizem: 'Oh, papai!' E eu fico tipo: 'Sério?' Como, de que maneira, ele foi um bom parceiro, pai ou irmão para alguém? — disse Sara.

O novo estudo pode ajudar a explicar esse apreço pelo personagem, assim como por tantos outros que despertam o interesse do público, embora vilões.

Moral e essência
Para chegar ao principal resultado, o trabalho foi dividido em três partes. Na primeira, somente com crianças, os cientistas observaram que de fato elas reconhecem as ações e emoções dos personagens “ruins” como negativas à primeira vista, apesar de os pequenos terem uma tendência a julgar as pessoas como positivas.

Na segunda e na terceira parte, os pesquisadores buscaram abordar a percepção além da superfície, e questionaram os participantes sobre a visão em relação a fatores como caráter, moral e a “essência verdadeira” dos personagens. Eles explicam que, baseado em evidências passadas, já se sabia que os adultos têm uma predisposição a acreditar que o “interior” de alguém é positivo, apesar de suas ações.

“Nesse contexto, o caráter moral inclui tanto a autopercepção de um indivíduo (ele se vê como bom ou mau?) quanto seu verdadeiro eu (seu eu interior é bom ou mau?). (...) Embora os adultos atribuam más motivações a pessoas que cometem atos hediondos, em média eles acreditam que, no fundo, mesmo essas pessoas são moralmente boas. Tais padrões em verdadeiras autoavaliações são robustos – eles foram encontrados em uma ampla gama de culturas em todo o mundo”, escreveram os autores.

No entanto, isso não havia sido avaliado de forma direcionada aos vilões, ou pela percepção de crianças. Os resultados mostraram uma tendência semelhante entre os pequenos e as figuras “ruins” que aparecem nas histórias – a maioria acreditava que o interior dos personagens era bom, em oposto ao exterior com atitudes ruins.

A mesma diferença entre o lado “de fora” e “de dentro” não foi observada com os heróis, comprovando que é um olhar específico para aquele grupo.