RIO DE JANEIRO

PM admite que matou morador da Cidade de Deus por estar com objeto "que aparentava ser um fuzil"

Em nota, secretaria afirma que agentes "vitimaram fatalmente um homem na comunidade" durante operação na localidade do Pantanal

Catador Dierson Gomes da Silva - reprodução

O catador Dierson Gomes da Silva, de 50 anos, morador da Cidade de Deus, na Zona Oeste do Riode Janeiro, foi morto durante operação da Polícia Militar na manhã desta quinta-feira (5). Segundo a corporação, os agentes acharam que o homem portava um fuzil. De acordo com relatos de moradores, o catador de recicláveis estava com um pedaço de madeira.

Em nota, a Secretaria de Polícia Militar admitiu que o homem "foi morto por conduzindo o que aparentava ser um fuzil, pendurado em uma bandoleira".

O comunicado diz ainda que "o comando da Corporação já instaurou um procedimento apuratório para averiguar as circunstâncias que vitimaram fatalmente um homem na comunidade".

A família de Dierson, que trabalhava com reciclagem, não tem dúvidas de que ele foi morto pela PM ao ser confundido com um bandido, durante operação feita nesta quinta-feira. Segundo Denise da Silva Ribeiro, de 49, irmã do catador, moradores da localidade conhecida como Pantanal, onde o fato ocorreu, relataram ter ouvido uma rajada de tiros. Pelo menos dois tiros teriam atingido a vítima. De acordo com parentes, o corpo de Dierson apresentava ferimentos no pescoço e na canela.

Pai de dois filhos, Dierson era viúvo e sofria de depressão. Muito conhecido na comunidade, ele também costumava acumular coisas que não eram aproveitadas na reciclagem. A madeira que Dierson carregava quando foi morto era usada por ele, segundo familiares, como um cabo para ser acoplado na enxada durante serviços de capina.

— Meu irmão trabalhava com reciclagem. Era muito conhecido e querido na comunidade. Era uma pessoa do bem que passou a sofrer de depressão depois que perdeu a mulher com problemas de saúde. Meu irmão não era bandido. Foi morto por engano. Porque estava com uma madeira na mão que a polícia confundiu com arma. Nossa família está destruída. A gente quer justiça para o que aconteceu — disse Denise, chorando.

Dierson foi morto ao sair da casa onde morava sozinho. Ele deixa dois filhos maiores, um deles de 32 anos.

À tarde moradores iniciaram um protesto na Cidade de Deus por causa da morte de Dierson. O policiamento foi reforçado no entorno da Cidade de Deus. Desde o início da manhã de quinta, agentes do 18º BPM (Jacarepaguá), do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) e do Batalhão de Ações com Cães (BAC) realizam uma operação na comunidade. Barricadas foram retiradas com o auxílio de tratores. O objetivo da ação, de acordo com a PM, é prender criminosos que também roubam na região, apreender armas de fogo e recuperar veículos roubados.

Há equipes de policiamento na rua Edgard Werneck, que dá acesso à comunidade, na Praça Júlio Guiten, próximo a uma das entradas e no largo entre a Gardênia Azul e a Cidade de Deus. Neste ponto, que fica ao lado da Avenida Ayrton Senna , há um caveirão além de mais de 18 PMs e outras três patrulhas. O comandante do 18º BPM coronel Eduardo Lopes também está no local. Um morador contou que o catador morto na operação, que estava com um pedaço de madeira que teria sido confundido com um fuzil pelos PMs, era uma pessoa tranquila.

- Ele é vizinho nosso. Pessoa do bem. Todos os moradores estão impactados com o que ocorreu - disse o morador, que pediu para não ser identificado.

Os policiais que participam da operação na Cidade de Deus contam ainda com uma retroescavadeira para retirar barreiras e um caminhão-prancha, utilizado para transportar o equipamento em distâncias maiores.

Segundo informações passadas por moradores ao g1, a vítima tinha aproximadamente 50 anos, era um catador de recicláveis e tinha problemas mentais. Ainda de acordo com a PM, agentes estavam na região do Pantanal quando se deparou com o homem e efetuou os disparos.

Nas redes sociais, moradores publicaram vídeos relatando a operação, que começou ainda durante a madrugada.

A Delegacia de Homicídios da Capital (DHC) foi acionada para realização de perícia. O comando da PM afirma, também, que já instaurou procedimento apuratório para averiguar as circunstâncias da morte, e diz que vai colaborar integralmente com as investigações da Polícia Civil.

Leia a nota da Polícia Militar na íntegra:
"O comando da Corporação já instaurou um procedimento apuratório para averiguar as circunstâncias que vitimaram fatalmente um homem na Comunidade Cidade de Deus, na Zona Oeste da Cidade do Rio.

Desde o início da manhã desta quinta-feira (5/1), equipes do 18º BPM (Jacarepaguá), com o apoio do Comando de Operações Especiais (COE) – através do Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE) e do Batalhão de Ações com Cães (BAC) – realizam uma operação na Comunidade Cidade de Deus. Dentre os objetivos, a prisão de criminosos que atuam no crime organizado daquela localidade e praticam diversos roubos na região, além de também apreender armas de fogo e recuperar veículos roubados.

Durante as ações, os policiais foram atacados a tiros em diversos pontos da comunidade e equipes do BOPE apreenderam um fuzil calibre 5,56.

De acordo com policiais do 18º BPM, uma equipe da unidade se deslocava pela localidade do Pantanal, uma área historicamente conflagrada, quando se deparou com um homem conduzindo o que aparentava ser um fuzil, pendurado em uma bandoleira. Os policiais efetuaram disparos e o atingiram. O ferido não resistiu. A área foi isolada e a Delegacia de Homicídios da Capital foi acionada para a perícia.

Além do procedimento interno instaurado, a SEPM colabora integralmente com as investigações da Polícia Civil. Os policiais serão identificados e as armas apresentadas à perícia."