NEGÓCIOS

Crise na Americanas: Lemann, Telles e Sicupira dizem que não sabiam de manobra contábil

Trio destacou que vai trabalhar pela recuperação da empresa e que nos últimos 20 anos foi administrada por executivos considerados "qualificados e de reputação ilibada"

Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira são os fundadores da 3G Capital e acionistas da Americanas - Divulgação

Na primeira declaração pública desde o início da crise da Americanas, que começou há 11 dias, os acionistas de referência da empresa — Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira — dizem que não sabiam da manobra contábil que resultou em um rombo de R$ 20 bilhões.

“Jamais tivemos conhecimento e nunca admitiríamos quaisquer manobras ou dissimulações contábeis na companhia. Nossa atuação sempre foi pautada, ao longo de décadas, por rigor ético e legal. Isso foi determinante para a posição que alcançamos em toda uma vida dedicada ao empreendedorismo, gerando empregos, construindo negócios e contribuindo para o desenvolvimento do país”, afirmam em nota pública divulgada em primeira pessoa e assinada pelos três.

Os bilionários criadores da 3G dizem que lamentam “profundamente as perdas sofridas pelos investidores e credores” e destacam que, como acionistas, também foram “alcançados por prejuízos”. As ações da Americanas tiveram queda de 94% desde o início da crise e encerraram o pregão de sexta-feira, o último como parte do Ibovespa, índice de referência do mercado, cotadas a R$ 0,71. Como acionistas de referência, eles detêm fatia de 30,13% do capital.

Acordo com credores
No último item da nota, os acionistas afirmam que acreditam que é possível chegar a um acordo com os credores. A Americanas entrou em recuperação judicial na última quinta-feira com R$ 43 bilhões em dívidas e 16.300 credores. À Justiça, a empresa já destacou que responde por mais de cem mil empregos diretos e indiretos.
 

“Reafirmamos nosso empenho em trabalhar pela recuperação da empresa, com a maior brevidade possível, focados em garantir um futuro promissor para a empresa, seus milhares de empregados, parceiros e investidores e em chegar a um bom entendimento com os credores”, diz o texto.

Com a entrada em recuperação judicial, a Americanas ganha um período de seis meses de proteção do caixa contra credores. Mas terá a tarefa de elaborar um plano de recuperação, que precisa ser apresentado em 60 dias e contar com a aprovação dos credores em assembleia. Muitos deles já falam, em caráter reservado, em desconto da ordem de 80% a 90% e não se mostram dispostos a aceitar.

Foco na auditoria
A manifestação pública ocorre no momento em que investidores se articulam para processar a empresa e, em alguns casos, seus acionistas, no Brasil e no exterior em busca de reparação por danos. O episódio colocou em xeque a imagem do trio, responsável por uma gama de investimentos bem-sucedidos no país e no exterior.

A manifestação mais forte contra o trio até agora veio do BTG, quando se referiu ao caso como “fraude” em recurso na Justiça e aos acionistas como “espécie de semideuses do capitalismo mundial ‘do bem’”, que teriam sido, segundo o banco, “pegos com a mão no caixa”.

Na nota pública divulgada ontem, Lemann, Telles e Sicupira dizem que a empresa foi administrada por executivos considerados qualificados e de reputação ilibada nos últimos 20 anos. E jogam as atenções para o trabalho da auditoria.

“Contávamos com uma das maiores e mais conceituadas empresas de auditoria independente do mundo, a PwC. Ela, por sua vez, fez uso regular de cartas de circularização, utilizadas para confirmar as informações contábeis da Americanas com fontes externas, incluindo os bancos que mantinham operações com a empresa. Nem essas instituições financeiras nem a PwC jamais denunciaram qualquer irregularidade”, diz o texto, que acrescenta que os acionistas, assim como as demais partes interessadas, acreditavam que tudo estava correto.

Lemann, Telles e Sicupira afirmam que o comitê independente anunciado pela varejista terá condições de apurar a origem das “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões, “bem como de avaliar a eventual quebra de simetria no diálogo entre os auditores e as instituições financeiras”. Os três manifestam o compromisso de colaborar de forma transparente para esclarecer os fatos e as circunstâncias.

Procurada, a PwC disse que não comenta casos de clientes.