Dívida soberana

Justiça britânica analisa processo contra Cuba por pagamento de dívida milionária

Entretanto, Havana não reconhece o fundo como credor

Sede do Banco Nacional de Cuba, em Havana - Reprodução / Redes sociais

A Justiça inglesa começou a analisar nesta segunda-feira (23) um processo contra o Estado cubano e o Banco Nacional de Cuba (BNC), movido por um fundo de capital de risco que reivindica milhões de uma dívida soberana. Entretanto, Havana não reconhece o fundo como credor.

A juíza da divisão comercial do Supremo Tribunal de Londres, Sara Cockerill, começou a escutar argumentos para determinar se considera o CRF-I Limited, fundo localizado nas Ilhas Cayman - um território britânico ultramarino retirado das listas de paraísos fiscais há dois anos pela União Europeia -, credor legítimo neste caso.

Dessa forma, a juíza analisará esta questão primeiro e não julgará a principal acusação do processo neste momento.

Marcadas para acontecer durante toda esta semana e parte da próxima, as audiências serão mais complicadas, já que contam com depoimentos de algumas testemunhas de Cuba por videoconferência. Além da diferença de horário em relação a Londres, também terá tradução simultânea e consecutiva de acordo com os casos.

Depois, a magistrada deve levar semanas para definir uma sentença, a qual cabe recurso para a parte prejudicada.

Cockerill também julgou por anos um conflito entre Nicolás Maduro e Juan Guaidó, cujo controle de dois bilhões de dólares em ouro venezuelano guardados no Banco da Inglaterra estavam em disputa.

Principal credor privado
O caso contra Cuba foi iniciado pelo CRF-I Limited em fevereiro de 2020.

O fundo é o principal detentor da dívida cubana no chamado Clube de Londres, grupo informal de credores privados da dívida soberana.

"Criado para investir na dívida soberana não paga por Cuba", o CRF adquiriu gradualmente uma carteira avaliada em 1,2 bilhão de euros (US$ 1,3 bilhão) em novembro de 2017, segundo o processo judicial.

Neste processo, o fundo reivindicou 72 milhões de euros em empréstimos feitos pelo Banco Nacional de Cuba (BNC) com os bancos europeus Crédit Lyonnais Bank Nederland e Istituto Bancario Italiano, em 1984.

Embora seja uma parcela menor do valor total na carteira, o reconhecimento do pedido pela Justiça abrirá portas para pedidos maiores.

Cuba recebeu uma proposta de reestruturação da dívida com um desconto considerável. Entretanto, o governo rejeitou e argumentou que este "fundo abutre" não é o credor original e que as entidades europeias não poderiam transferir sua dívida sem o consentimento do Estado cubano e o Banco Nacional de Cuba.

O BNC serviu como banco central desde a sua fundação, em 1948, até a criação do Banco Central de Cuba (BCC), em 1997. Desde então, não possui poder para agir em nome do governo cubano ou administrar a dívida externa do país.

Retirada da acusação de suborno
Em primeiro momento, as autoridades cubanas alegaram que o CRF havia subornado um funcionário do BNC para aprovar ilegalmente a transferência. O empregado apontado foi o diretor de operações, Raúl Eugenio Olivera Lozano, posteriormente sancionado criminalmente.

Sua ação "descumpriu os requisitos legais estabelecidos tanto nos acordos submetidos às leis inglesas, como nas normas internas do BNC e as leis cubanas, razão pela qual é nula e sem efeito", afirmaram as autoridades.

O CRF negou a acusação de corrupção, que foi posteriormente retirada pela parte cubana.

Nesta segunda-feira, em seus argumentos iniciais, a advogada britânica do Estado cubano Alison MacDonald optou por uma defesa técnica e baseada nos procedimentos legais, de cessão da dívida soberana para credores privados.

"O senhor Lozano assinou os documentos sozinho" e "o banco não tinha poder nem capacidade para atuar em nome de Cuba", enfatizou MacDonald, ao revisar cada um dos textos contratuais e garantir que não constituem nenhuma obrigação legal para o Estado.