Governo adia para fevereiro primeira reunião de Haddad, Tebet e Campos Neto
Encontro do colegiado é cercado de expectativas por conta de debates sobre a meta para inflação, após críticas de Lula ao BC
O governo Lula decidiu adiar para fevereiro a primeira reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN) da atual gestão, marcada inicialmente para a próxima quinta-feira. O encontro ocorrerá agora no dia 16 de fevereiro.
O primeiro CMN do governo Lula está cercado de expectativas por conta de declarações recentes do presidente questionando a meta da inflação. A meta é definida por esse colegiado.
Procurada pelo Globo, a Fazenda disse que não há deliberações a serem avaliadas e/ou aprovadas pelo CMN neste mês.“A próxima reunião está prevista para 16/02”, acrescentou a pasta.
Na semana passada, Lula criticou a atual meta de inflação, que é de 3,25%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo. Para o presidente, uma meta baixa faz o Banco Central subir juros demasiadamente, o que inibe o crescimento da economia.
Para 2023 e 2024, as metas são 3,25% e 3%, respectivamente, com o mesmo intervalo de tolerância. Em 2025, o valor definido é de 3%, num processo de redução da meta que tem influenciado numa política monetária mais contracionista. A taxa básica de juros da economia hoje é de 13,75% por conta da inflação acima da meta em 2021 e 2022.
O CMN voltará a ser formado pelos chefes da Fazenda (Fernando Haddad), Planejamento (Simone Tebet) e do BC (Roberto Campos Neto). Durante os últimos quatro anos, o colegiado era composto pelo presidente do BC, pelo então ministro da Economia, Paulo Guedes, e por um secretário dele — inicialmente o secretário de Fazenda, que depois se transformou em Tesouro e Orçamento.
Caberá ao CMN decidir por uma eventual redução da meta da inflação. A expectativa nesse momento, porém, é que o Conselho só trate da da meta na reunião de junho.
Tradicionalmente, é na reunião do meio do ano que os membros do Conselho anunciam a meta ou mudam objetivos. Integrantes da Fazenda afirmam que a definição não deve ocorrer antes do programado, mas o “debate” sobre o assunto poderia ser lançado antes.
Desde 2005, o centro da meta de inflação estava em 4,5%, com 2,5 pontos de margem de tolerância. Em 2006, o intervalo caiu para dois pontos e permaneceu assim nos anos seguintes, até ser cair para 1,5 ponto para 2017 e 2018, algo que será mantido agora até 2025 — ao menos por enquanto.
Um interlocutor que participou, em governos anteriores, de assuntos relacionados ao CMN acredita que pode ter contribuído para o adiamento o fato de a equipe da ministra do Planejamento ainda não estar totalmente montada. Ele destacou que, embora Simone Tebet seja considerada como mais desenvolvimentista do que o colega da Fazenda, Fernando Haddad, pessoas que a acompanharam durante a campanha à eleição, como a economista Elena Landau, e o secretário-executivo do Planejamento, Gustavo Guimarães, são grandes defensores do equilíbrio fiscal. No entanto, nem a ministra, nem Haddad, teriam coragem de dizer não a um pedido do presidente da República para subir a meta de inflação.
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, poderá ser voto vencido em uma discussão do gênero no âmbito do CMN. A expectativa é que as pressões para que a meta de inflação seja maior ocorrerão no momento em que os índices de preços começarem a cair. Os defensores da medida argumentam que, com um índice menor, não há por que os juros serem elevados para o cumprimento de uma meta de 3%.
Carla Beni, economista e professora de política fiscal da Fundação Getúlio Vargas, defende a manutenção do regime de metas de inflação que, segundo ela, tem a vantagem de “ancorar as expectativas”. Carla Beni argumenta que a fixação de metas futuras, com uma margem de tolerância, tem um efeito importante.
"Neste momento em que vivemos um período pós-pandemia, todos os países estão com uma inflação mais elevada e fugiram da meta. A meta inflacionária máxima para as nações desenvolvidas é de 2%, como os países da Zona do Euro e os Estados Unidos. Esses países têm paciência e vão esperar mais um pouco antes de fazerem ajustes, se necessários", afirmou.
Piter Carvalho economista-chefe da Valor Investimentos, acredita que o debate no CMN sobre o assunto será acalorado. Isto porque o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já sinalizou que está bastante incomodado com os juros altos no Brasil, o que encarece a dívida e impede o crescimento da economia.
"Para um governo que quer incentivar os investimentos, fica difícil em um cenário de juros a 13,75% ao ano. O crédito está muito caro e o governo quer pisar no acelerador da economia e incentivar o crescimento", disse Carvalho.
"Se o governo aumentar a meta de inflação, o Banco Central não terá que dar um remédio mais amargo (aumentar os juros). Mas é importante que o BC e governo caminhem para uma convergência e não fiquem atacando um ao outro", concluiu.