Deputados articulam proposta que tira autonomia de agências reguladoras
Especialistas criticam medida e temem perda de investimentos
Os deputados querem aproveitar as discussões do Congresso Nacional sobre a proposta do atual governo que reestruturou a Esplanada dos Ministérios e retirar a autonomia das agências reguladoras. Uma emenda do deputado Danilo Forte (União-CE) à medida provisória (MP) 1.154 transfere o poder decisório das diretorias colegiadas dos órgãos reguladores para os ministérios. A MP criou e reestruturou os ministérios e precisa ser votada pelos parlamentares em até seis meses.
Na visão de especialistas, a mudança pode afetar investimentos em áreas como a infraestrutura, um dos setores mais sensíveis da economia, onde há necessidade de aportes, mas que depende de segurança regulatória para obter recursos.
A emenda mexe nas leis das agências e transfere o poder normativo dos diretores para conselhos e secretarias ligadas aos ministérios setoriais, compostos por representantes do governo, das empresas, dos consumidores e universidades. Os conflitos seriam submetidos a um órgão administrativo "independente".
O papel das agências ficaria restrito à fiscalização dos serviços prestados aos usuários e punição das empresas que descumprirem as regras.
Pela legislação atual, além de fiscalizar e punir, cabe às diretorias colegiadas das agências aprovarem normas para seus respectivos setores de atuação, como aviação civil, planos de saúde, energia, telecomunicações e transportes rodoviários, por exemplo. Os diretores têm mandato, são indicados pelo governo e sabatinados e têm seus nomes analisados pelos senadores.
"Na prática, esses conselhos vão fiscalizar as agências reguladoras. Hoje, elas fazem tudo, legislam, fiscalizam e punem. Há um exagero por parte das agências", disse o deputado, acrescentando que um objetivos é aproximar esses órgãos do Congresso e da própria sociedade.
Segundo Claudio Frischtak, da Consultoria Inter B, a emenda proposta pelo deputado vai na contramão da tendência mundial, que busca a consolidação de marcos regulatórios sem ingerência política, com órgãos de perfil técnico, independente e autônomo.
"Essa mudança vai elevar o risco regulatório no país, os projetos ficarão mais caros consequentemente. Será um desestímulo ao investimento, à modernização da nossa infraestrutura. Essa proposta é ruim e deveria ser arquivada", disse Frischtak.
Gesner Oliveira, economista da Go Associados, endossou essa visão.
"Um deslocamento de poder decisório das agências reguladoras para os ministérios é um profundo equívoco porque as decisões sobre regulação dos setores de infraestrutura e vários segmentos da economia têm que ser técnicas, não podem ser influenciadas nem pelo poder político, nem pelo poder econômico. Daí a importância das agências reguladoras independentes", disse.
A emenda vai inibir investimentos em um país que precisa crescer, afirma:
"É um tiro no pé".
O deputado disse que ainda não discutiu o teor da emenda com líderes dos partidos. Mas que há um mal-estar generalizado com as decisões de algumas agências, como da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), no caso da cobrança pelo despacho da bagagem e que o Congresso tentou derrubar várias vezes.
Outra que desperta a ira de parte dos parlamentares é a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Houve embate no ano passado sobre tarifas de transmissão de energia no Nordeste.
A emenda de Danilo Forte tem o respaldo da Frente Parlamentar de Empreendedorismo (FPE), que integra cerca de 200 deputados. O parlamentar foi presidente do grupo no ano passado.
Ainda não foi indicado o relator da MP, que aguardava a eleição das presidências e mesas diretoras da Câmara e do Senado, realizada na quarta-feira.
Líderes da base governistas e representantes do Executivo foram procurados, mas não deram retorno até a publicação da reportagem.