Papa clama no Sudão do Sul por "vida digna" para os refugiados
O Sudão do Sul é a segunda e última etapa da terceira viagem de Francisco pela África subsaariana
O Papa Francisco pediu neste sábado às autoridades do Sudão do Sul que ponham fim imediatamente à espiral de ódio e violência, para que milhões de refugiados internos possam "voltar a viver dignamente".
"Renovo, com todas as forças, o mais sentido apelo para que se faça cessar todo o conflito, retome-se seriamente o processo de paz, para que acabe a violência e o povo possa voltar a viver dignamente", disse Francisco durante um encontro com pessoas deslocadas em Juba, capital do país africano, devastado por lutas pelo poder.
"Um número enorme de crianças nascidas nos últimos anos só conheceu a realidade dos campos de deslocados, esquecendo-se do ambiente de casa, perdendo a ligação com a própria terra de origem, com as raízes, com as tradições", observou o pontífice, diante de centenas de pessoas. "O futuro não pode ser nos campos de deslocados."
Francisco, 86, iniciou ontem uma "peregrinação de paz" no país, de 12 milhões de habitantes, majoritariamente católico, que em 2011 tornou-se independente do Sudão, de maioria muçulmana, após três décadas de conflito. De 2013 a 2018, uma guerra civil entre apoiadores dos líderes Salva Kiir e Riek Machar deixou 380 mil mortos.
Apesar de um acordo de paz assinado em 2018, a violência persiste e o país registrou 2,2 milhões de deslocados em dezembro, segundo o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (Ocha).
Tragédia humana
"Infelizmente, neste país martirizado, ser deslocado ou refugiado tornou-se uma experiência habitual e coletiva", assinalou o Papa, após ouvir depoimentos de três jovens. "Estou convosco, sofro por vós e convosco", disse a eles Francisco, que estava em cadeira de rodas, devido a dores persistentes em um dos joelhos.
Para o refugiado John Wiyual, 42, que vive desde 2014 em um acampamento nos arredores de Juba, o governo não cumpre suas promessas. "Dizem que há paz, mas há assassinatos em todo o país."
O chefe da Igreja Católica estimou que "as mulheres são a chave para transformar o país", e que, "se lhes forem concedidas as justas oportunidades, elas terão a capacidade de mudar a fisionomia do Sudão do Sul".
"Peço a todos os habitantes destas terras: que a mulher seja protegida, respeitada, valorizada e honrada", acrescentou Francisco. Segundo um relatório encomendado pela ONU e divulgado em 2022, a violência sexual contra as mulheres no Sudão do Sul é "generalizada e sistemática".
Durante a manhã, o Papa fez um discurso para 5 mil fiéis na catedral de Santa Teresa, onde pediu a bispos e sacerdotes que caminhem "em meio ao sofrimento e às lágrimas" e sujem "as mãos pelas pessoas".
"Viemos aqui para receber suas bênçãos. É tudo uma questão de paz. O Papa Francisco não pode nem andar, mas vem encorajar nossos líderes", disse à AFP John Makuei, 24 anos, que chegou antes do amanhecer para não perder esse "dia histórico".
No fim do dia, Francisco participou de uma oração ecumênica para 50 mil fiéis com os chefes das igrejas da Inglaterra e Escócia, representantes das outras duas confissões cristãs, no mausoléu de John Garang.
O Papa concluirá sua visita amanhã, com uma missa ao ar livre para a qual são esperadas milhares de pessoas.
O Sudão do Sul é a segunda e última etapa da terceira viagem de Francisco pela África subsaariana. A jornada começou na última terça-feira, na República Democrática do Congo (RDC).