Por que o coronel que comandava a segurança contra atos golpistas foi preso
Jorge Eduardo Naime é suspeito de omissão no planejamento para evitar invasão às sedes dos Poderes
Em mais uma ofensiva contra os atos golpistas de 8 de janeiro, a Polícia Federal (PF) deflagrou uma operação para investigar responsáveis pela segurança do Distrito Federal (DF). Nesta terça-feira, o coronel Jorge Eduardo Naime, ex-chefe do departamento operacional da Polícia Militar do DF, foi preso sob a suspeita de omissão durante os ataques às sedes dos Três Poderes.
A prisão preventiva do coronel Eduardo Naime foi determinada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, e cumprida em nova fase da operação Lesa Pátria deflagrada pela PF. Os outros alvos também são policiais militares, sendo um major, um capitão e um tenente.
Em nota, a defesa do coronel afirmou que “Naime agiu conforme a lei e a técnica, realizando todas as prisões ao alcance das condições materiais com as quais contava no momento” e que “o avanço das investigações demonstrará a inocência do Coronel, que há 30 anos presta serviços relevantes à população do Distrito Federal”.
Naime é presidente da Associação dos Oficiais da PM-DF e frequentava gabinetes de deputados para negociar aumento salarial e plano de carreira aos policiais militares.
A mulher do coronel, Mariana Adorno Naime, mantinha um cargo de coordenadoria no Ministério da Justiça durante a gestão de Anderson Torres, que também está preso sob a acusação de omissão. Ela foi nomeado três meses depois que Torres assumiu a pasta, em junho de 2021, para o cargo de "coordenador da política de integração da Coordenação-Geral de Políticas para as Instituições de Segurança Pública". Deixou o posto em março de 2022, quando foi exonerada a pedido, segundo o Diário Oficial da União.
As investigações da Polícia Federal passaram a mirar no coronel desde o dia seguinte ao 8 de janeiro. O nome dele aparece nos questionamentos da PF a Anderson Torres e ao ex-comandante da PM, Fábio Augusto Vieira, que chegou a ser detido, mas foi liberado na última semana.
No interrogatório de Torres, ocorrido na última quinta-feira, a PF quis saber sobre a nomeação da esposa do coronel Naime no Ministério da Justiça.
O ex-ministro respondeu que desconhecia a indicação dela e que a mulher "não trabalhou diretamente" com ele. "Que no MJ trabalhavam outros oficiais da PM e que alguns deles possivelmente deveriam ter algum contato com o coronel Naime e ter indicado sua esposa para exercer alguma função", diz a transcrição do depoimento.
A defesa do coronel também enfatizou que o coronel participou da coordenação da operação de segurança da posse presidencial, em 1 de janeiro.
Ao GLOBO, o então interventor federal Ricardo Cappelli, hoje secretário-executivo do Ministério da Justiça, disse que viu com "os próprios olhos" o coronel tentando retardar a linha de contenção da PM-DF quando as sedes dos Três Poderes já estavam desocupadas, na noite de 8 de janeiro. O cordão de policiais visava expulsar os manifestantes golpistas que ainda se concentravam na Esplanada dos Ministérios.
A impressão que me dava é que ele não queria que a linha andasse. Ela estava avançando muito lentamente. Foi uma guerra para eu conseguir fazer ela andar, disse Cappelli, que naquela ocasião já havia sido nomeado interventor federal e coordenava a ação em campo.
Um inquérito na corregedoria da Polícia Militar do DF foi instaurado para apurar a conduta de Naime no dia dos atos golpistas.
Como chefe do Departamento Operacional (DOP) da PM, o coronel Naime era o responsável por elaborar o plano operacional que mobiliza os batalhões e efetivos para determinadas ações. Ocorre que ele estava de licença entre os dias 3 e 8 de janeiro. No seu lugar, quem desempenhava a função era subchefe do DOP Paulo José Bezerra.
Mesmo com os alertas de inteligência sobre a intenção dos golpistas em "tomar o poder" e "invadir o Congresso", não foi feito nenhum plano operacional para o dia 8 de janeiro, segundo concluiu o relatório do interventor federal. Esta teria sido a principal "falha operacional" por parte do comando da PM-DF que deixou a Esplanada dos Ministérios desguarnecida com poucos homens.
O relatório destaca ainda que a Naime estavam "subordinados" os comandantes dos oito batalhões da PM, entre eles o do Choque, que estavam de férias no dia 8 de janeiro.
Mesmo de licença, Naime reapareceu no dia dos atos golpistas após ser convocado às pressas pelo comando e cooperou na ação de dispersão dos manifestantes, conforme a sua defesa.
Por volta das 18h, devidamente fardado, o Coronel Naime compareceu à Esplanada dos Ministérios, visando colaborar no reestabelecimento da ordem, cumprindo o que determinado. Desde o momento em que passou a coordenar a operação, o ex-Comandante de Operações seguiu com o protocolo de esvaziamento dos prédios públicos. Retirou, juntamente com a tropa, vândalos que se encontravam ainda no perímetro do local, realizando centenas de prisões, diz o texto enviado por seus advogados na semana passada.