Polêmica

Comandante do Exército revela as interferências de Bolsonaro na Força

Ribeiro Paiva, em áudio gravado sem consentimento, detalha alguns desmandos do ex-presidente durante os quatro anos de mandato

Divulgação/Exército

Declarações do atual comandante do Exército, general Tomás Miguel Ribeiro Paiva, em áudio de uma reunião chefiada por ele em 18 de janeiro, quando ainda ocupava o cargo no Comando Militar do Sul, mostram que Jair Bolsonaro (PL) interferiu diretamente na Força quando presidente.

O conteúdo do áudio, que tem cerca de 50 minutos, foi gravado sem o consentimento de Paiva durante encontro com auxiliares. A gravação foi tornada pública pelo podcast Roteirices na noite desta segunda-feira (27).

No encontro, mostra o áudio, o general diz que Bolsonaro, relata pelo menos três momentos em que Bolsonaro interferiu diretamente na gestão do Exército ao longo dos quatro anos de mandato.

O primeiro diz respeito às trocas constantes de comando: foram três generais que assumiram o alto posto no Exército, sempre após desgastes políticos causados pelo ex-presidente.

O segundo foi a tentativa de Bolsonaro de organizar uma motociata na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman). O ex-presidente, revela o general no áudio, queria que o passeio de moto saísse da sede da academia e fosse acompanhado pelos militares. O plano, no entanto, não foi concretizado, segundo o comandante, porque os generais não concordaram.

 “Não ocorreu porque os nossos comandantes, nossos generais, conseguiram convencer o (então) presidente que não era uma coisa adequada ter uma motociata, que é um ato político de apoio ao presidente, dentro da academia militar”, confessou.

Ribeiro Paiva também falou, na gravação, sobre a troca do local da realização do desfile de Sete de Setembro de 2022 no Rio de Janeiro como outra prova da interferência do ex-presidente no Exército.

Bolsonaro, naquele momento, tentou transferir o desfile do local tradicional (Avenida Presidente Vargas) para a orla de Copacabana. A troca não ocorreu, mas ele participou de um ato político na praia, quando defendeu empresários que defendiam um golpe militar, se Lula (PT) saísse vitorioso na eleição.

As revelações do general não pararam por aí. Além das interferências de Bolsonaro, ele criticou a absolvição de Eduardo Pazuello na apuração interna do Exército depois que o militar participou de um ato político com Bolsonaro.

O comportamento de Pazuello, inadequado segundo Ribeiro Paiva, vai contra a orientação de atuação dos integrantes do Exército, mas foi revelada pelo comando da ocasião.

 “O comandante resolveu entregar o FATD [Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar], o general respondeu e […] o pessoal considerou que a transgressão estava justificada. É muito difícil para um comandante [militar de área] criticar a decisão dele [comandante do Exército]. Eu posso até falar para ele o que eu penso, mas a decisão está tomada”, disse Ribeiro Paiva.

Ele externou seu descontentamento com a solução encontrada usando uma metáfora. “A gente tem que perdoar o pecador, mas tem que mostrar que o pecado aconteceu. Não pode aceitar o pecado, o erro. O erro aconteceu”, completa então o general.