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Fiocruz: Pesquisa inédita analisa saúde sexual de venezuelanas migrantes no Brasil

Estudo afirma que apenas 4 em cada 10 usam algum método contraceptivo e tem alta taxa de fecundidade

Família de migrantes venezuelanos em abrigo desativado na cidade de Boa Vista (RR) - Rovena Rosa / Agência Brasil

As mulheres e meninas venezuelanas que migraram para o Brasil fazem pouco uso de métodos contraceptivos, têm muitos filhos e vieram em busca de serviços de assistência à saúde, motivação para migrar que perde apenas para a fome, segundo estudo inédito realizado pela Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), coordenada pela Universidade de Southampton, da Inglaterra.

Apenas 4 em cada 10 venezuelanas no Brasil usam algum método contraceptivo, enquanto entre as brasileiras, a média é de 80%. A pesquisa mostra ainda que 63% das migrantes ativas sexualmente não utilizaram preservativo masculino nenhuma vez nos últimos 12 meses e 53% relataram usar algum contraceptivo, sendo o injetável o método mais recorrente.

O acesso aos métodos contraceptivos das venezuelanas após a chegada ao Brasil se deu principalmente pelos serviços públicos de saúde, mas muitas ainda compram, apesar da carência de recursos. Isso quer dizer que, apesar da oferta, não há facilidade para essas mulheres encontrarem os métodos que são oferecidos gratuitamente, analisa a coordenadora da pesquisa na Ensp/Fiocruz, Maria do Carmo Leal.

O estudo revela condições do processo migratório e os impactos da migração forçada sobre a saúde sexual e reprodutiva de mulheres e adolescentes. No total, 2.012 migrantes de 15 a 49 anos que chegaram ao Brasil entre 2018 e 2021 foram entrevistadas em Manaus (AM) e Boa Vista (RR).

A pesquisa ainda apontou que as mulheres venezuelanas têm muitos filhos — cerca de 16%, por exemplo, tem quatro ou mais, enquanto 40% têm dois ou três — o que acaba as prejudicando financeiramente, já que, além de precisarem alimentar e cuidar de muitas crianças, essas mulheres acabam impedidas de trabalhar porque precisam ficar com os filhos. Os cientistas da Instituição, inclusive, recomendam que sejam disponibilizadas vagas em creches e escolas para crianças e adolescentes venezuelanas.

Outro dado relacionado a maternidade apontado pelo estudo é que a maioria dessas mulheres preferem ter seus filhos no Brasil, utilizando o Sistema Único de Saúde (SUS).

Muitas eram adolescentes grávidas e chegaram sozinhas. No geral, as mães migram em busca de educação e tratamento de saúde para os filhos. Quando deixam filhos na Venezuela, o maior desejo é mandar dinheiro para que eles venham. Elas não rompem os laços, explica a coordenadora da parte da pesquisa realizada pela UFMA, Zeni Carvalho Lamy.

Atendimento de saúde
O estudo não identificou discriminação no atendimento de saúde prestado às venezuelanas, inclusive na atenção pré-natal e no parto. Foram entrevistadas 575 mulheres brasileiras e 315 venezuelanas que tiveram seus filhos em maternidade pública da Região Norte do Brasil em 2022. O objetivo foi conhecer e comparar a atenção ao parto e as características obstétricas, assim como os desfechos clínicos entre as puérperas brasileiras e venezuelanas.

Ambas tiveram o mesmo acesso ao atendimento pré-natal, atingindo mais 95% das entrevistadas. As estrangeiras iniciaram o pré-natal mais tardiamente e apresentaram menor número de consultas, já que algumas já chegaram ao Brasil gestantes. De acordo com Maria do Carmo Leal, os pontos positivos e negativos do atendimento público de saúde têm atingido as brasileiras e as migrantes de forma semelhante.

Os resultados não são bons nem para nós nem para elas: temos muito baixo peso ao nascer (média de 8%), muita prematuridade (12%), muita morbidade materna grave (10%). Mas, há que se destacar a equidade no atendimento das migrantes dentro do SUS, reafirmando o caráter inclusivo do sistema de saúde, afirma.