Golpe

Como alguém ainda entra numa pirâmide financeira? Conheça a anatomia do golpe e como não cair nele

Desabafo de Gustavo Scarpa, ex-jogador do Palmeiras perdeu R$ 6 milhões em golpe, mostra erros que se repetem

Como não cair em golpes - Freepik.com

“Sempre via as pessoas burras que caíam em pirâmide, essas coisas de estelionatários. E me ver numa situação dessa, para mim, está sendo horrível”, desabafou o ex-jogador do Palmeiras Gustavo Scarpa em troca de mensagens com o também jogador Willian Bigode, conforme revelado pelo Fantástico no último domingo (12).

Mas por que, se os golpes e pirâmides financeiras tiveram enorme audiência em notícias de TV e de jornal nos últimos meses, as pessoas continuam sendo enganadas e os prejuízos, como o que vitimou Scarpa em R$ 6 milhões, se repetem?

Psicólogos, advogados e analistas financeiros explicam: é da natureza humana se deixar levar por mecanismos conhecidos como de engenharia social. Neste tipo de golpe, por mais que as promessas de ganho fácil pareçam absurdas, as pessoas se deixam levar por artifícios que confundem a razão.

Especialistas afirmam: não é só ele. Várias pessoas se deixam enganar. A chancela de amigos traz uma sensação de segurança, os investimentos apresentados como inovadores ou tecnológicos despertam a curiosidade e a sensação de "investidor inteligente" cria a urgência de aplicar seu dinheiro naquela aposta "imperdível" antes que outros ganhem na sua frente.

O script se repete em todos os esquemas. Veja, abaixo, a anatomia de um golpe:

É novo e reluz como ouro
Os investimentos normalmente são em criptoativos, moedas virtuais, NTFs ou outras inovações tecnológicas e financeiras que, justamente por serem "disruptivas", supostamente garantem retornos polpudos. O investidor não entende direito o porquê, mas acredita que esse verniz tecnológico justifica a promessa de ganho alto.

Autoconfiança excessiva
Fabiano Nagamatsu, CEO da Osten Moove, aceleradora venture studio capital, aponta que as vítimas, em geral, são pessoas que se acham espertas o suficiente para nunca serem enganadas. A autoconfiança em excesso faz com que se tornem mais vulneráveis.

— O público que pensa ser o "investidor inteligente", que multiplica dinheiro rápido sem ter conhecimento amplo, é o que mais cai nesse golpe — conta Nagamatsu. — Essas pessoas têm medo de perder uma grande oportunidade. Dessa maneira, vão na onda de uma turma desinformada conduzida pelos puxadores de tapetes.

Chancela de amigos
A dica para investir normalmente chega por alguém do convívio social. São amigos ou membros de grupos coesos. No caso da JJ Invest, eram pessoas da comunidade judaica, no episódio do Faraó dos Bitcoins, muitos que sofreram o golpe participavam de uma mesma igreja evangélica. No caso de Scarpa, foi um colega de trabalho.

A chancela de um amigo ou familiar traz uma sensação de segurança ao potencial investidor, ou melhor, vítima do golpe.

Além disso, ao ver colegas ou membros da sua comunidade ganhando dinheiro com os investimentos, cria-se uma sensação de que não dá para ficar para trás. Ou seja, há um incentivo para aplicar logo.

No início, só alegria
Os investimentos são apresentados com a promessa de ganho alto, garantido e rápido. O segredo, alegam os golpistas, está no fato de ser um investimento “novo”.

Mas o fato é que os golpes são bem feitos e em um primeiro momento o investidor costuma a receber os ganhos prometidos, o que o incentiva a fazer novas aportes e a recomendar o negócio a outras pessoas.

No entanto, o período de bons rendimentos costuma ser curto e quando ele se dá conta todo o recurso investido já foi perdido.

Ostentação nas redes sociais
Os primeiros a entrarem no esquema fazem ampla ostentação da vida de luxo nas redes sociais. Fotos em iates, carros de luxo, em cenários paradisíacos, joias, acessórios de marcas que são objeto do desejo são padrão. Os posts são usados como “iscas” para convencer novos investidores.

A modelo Sasha Meneghel e o ex-jogador Zico são exemplos de celebridades que caíram em armadilhas de criptomoedas, só que antes acabaram influenciando outras pessoas a aplicar.

 

Roupagem de autoajuda
Postagens para captar investidores costumam ter uma roupagem de autoajuda, com frases inspiradoras como: “Desconfie do destino e acredite em você”.

Golpistas dão justificativas fantasiosas para o calote. No esquema “La Casa de Papel”, alegaram perseguição do governo cubano e ataque hacker.

Perdi, e agora?
Ao identificar uma possibilidade de fraude, a orientação dos especialistas é denunciar à Polícia e ao Ministério Público. No entanto, em muitos casos é difícil identificar de fato o responsável pelo esquema, pois são usados terceiros em suas empresas. Os especialistas criticam ainda as penas, que dizem ser brandas.

Se está procurando um bom negócio ou recebeu uma proposta que parece irrecusável, antes de fechar o negócio, confira as orientações dos especialistas:

Desconfie de retorno fixo: A oferta de ganho garantido é um sinal amarelo. As criptomoedas, por exemplo, são ativos de renda variável. Compare os retornos prometidos aos do mercado financeiro tradicional. Outra providência é verificar se a empresa realmente existe, se tem CNPJ e qual a sua reputação nos sites de reclamação.

Atenção à recomendação: As pirâmides financeiras só se sustentam com a permanente entrada de novos investidores. É o dinheiro aportado por eles que cobre quem está no topo. Por isso há incentivo para que o investidor traga amigos, inclusive, com oferta de bônus na rentabilidade de quem trouxer novos clientes.

Carteira própria: A forma correta de investir em moedas digitais é comprar o ativo diretamente de uma corretora e armazenar numa carteira própria, com uma chave à qual só o indivíduo tenha acesso. Essa espécie de “conta bancária” pode ser digital, adquirida por aplicativos, ou offline, em que a cripto fica armazenada em uma espécie de pendrive, as chamadas cold wallets. Uma vez que transfere as criptos para a carteira da empresa não está mais sob sua custódia e sob seu direito.

Alternativa segura: Apesar de criptomoedas não serem reguladas e, portanto, não estarem sob a fiscalização da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), os fundos e ETFs com exposição a ativos digitais estão. Dessa forma, esse meio de investimento é uma forma mais segura de aplicação na moeda digital.