Dia da Água: Lodo de estações de tratamento vira gás combustível e matéria-prima
Empresas investem no reaproveitamento de resíduos de estações de tratamento e transformam material orgânico em combustível e insumo para produção de tijolos
O aproveitamento de resíduos gerados nas estações de tratamento de água e esgoto como fonte de energia entrou na agenda das companhias de saneamento.
O lodo que hoje é descartado em aterros sanitários no Brasil pode gerar cerca de 6 milhões de metros cúbicos de gás por dia, o equivalente ao atual mercado de gás natural veicular (GNV) no país, nas contas da Associação Brasileira do Biogás (Abiogás).
"O potencial é enorme e pode servir de indutor de novos projetos de saneamento, pois diversas cidades no Brasil não sabem o que fazer com esses resíduos, que podem gerar energia e combustível bem próximo dos centros de consumo, onde está a demanda" diz Gabriel Kropsch, vice-presidente da Abiogás. "Isso pode ajudar as empresas de saneamento a investir mais, pois é uma fonte de receita."
A Sabesp, estatal de saneamento de São Paulo, tem um projeto piloto em Franca, no interior do estado, que transforma resíduos do tratamento de esgoto em combustível para veículos. O projeto já recebeu investimentos de mais de R$ 7 milhões e é desenvolvido em parceria com o Instituto Fraunhofer, da Alemanha.
A estação da cidade, que trata 500 litros de esgoto por segundo, já pode abastecer 40 veículos leves da frota da Sabesp com a produção diária de combustível a partir dos resíduos.
No Estado do Rio, a Prolagos, do Grupo Aegea, iniciou este ano um projeto para transformar duas toneladas de lodo gerado por dia em gás ou um tipo de carvão vegetal (chamado biochar), usado na agricultura para recuperar solos degradados. É uma parceria com Secretaria Estadual de Ciência, Agência Estadual Reguladora de Energia e Saneamento do Rio (Agenersa), Universidade Federal Fluminense (UFF) e a prefeitura de Arraial do Cabo.
"Os testes que serão realizados produzirão resultados inovadores no país. Vamos analisar quais as melhores formas de reaproveitamento do lodo, impactando não só empresas voltadas para o saneamento, como outras indústrias" diz Rodolfo Cardoso, doutor em Engenharia de Produção pela UFF e responsável pelo projeto.
Segundo o IBGE, menos de 5% do lodo sanitário é reaproveitado no Brasil, numa dimensão do potencial. Pedro Freitas, diretor-presidente da Prolagos, explica que o projeto tem como objetivo construir modelos que possam ser adaptados a diferentes condições de estações de tratamento de esgoto no Rio:
"Esse investimento vai permitir transformar o lodo, um passivo ambiental de alto impacto, em benefícios para a natureza e a sociedade."
Há ainda outros usos possíveis para o lodo. Há empresas testando aplicações como matéria-prima na produção de fertilizantes e adubos ou de tijolos e cerâmicas, o que pode abir novas frentes de negócios.
Além da geração de energia a partir do lodo em Jaú (SP), o Grupo Águas do Brasil testa o reaproveitamento desse material na produção de telhas e tijolos e compostos orgânicos para a agricultura em estações de tratamento da Região dos Lagos fluminense.
"Estamos buscando tratar os nossos lodos de forma a evitar que eles sejam despejados em aterros sanitários. E estamos ampliando para todas as concessionárias do grupo" diz Marilene Ramos, executiva da empresa.
Ela continua:
"Além disso, concessionárias como Águas do Imperador, Águas de Nova Friburgo e Zona Oeste Mais Saneamento enviam todo o lodo de tratamento de esgoto para composteiras, que geram adubo para agricultura."
Franceli Jodas, sócia da consultoria KPMG, diz que o reaproveitamento desses resíduos é um caminho inevitável em tempos de maior compromisso das empresas com práticas sustentáveis, já disseminadas em países desenvolvidos como os europeus.
"Não podemos ignorar a importância do saneamento, com acesso a água limpa e rede de esgoto, e a reutilização dos resíduos, gerando energia ou insumos para indústrias. Conseguimos resolver vários problemas de forma eficiente."