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Crédito, fome e migração: a agenda da Cúpula Ibero-Americana

A cúpula será concluída no sábado, com a publicação de uma declaração conjunta

Vista da fachada do Ministério das Relações Exteriores dominicano, onde será realizada a XXVIII Cúpula Ibero-Americana de Chefes de Estado e de Governo nos dias 24 e 25 de março em Santo Domingo em 22 de março de 2023 - Erika Santelices / AFP

A Cúpula Ibero-Americana começa nesta sexta-feira (24), na República Dominicana, com uma agenda focada na economia, em meio às previsões sinistras para a região, que busca mais financiamento e apoio para enfrentar uma crise migratória e outra alimentar.

Quatorze dos 22 chefes de Estado e de governo convocados à reunião em Santo Domingo já confirmaram presença. A cúpula será concluída no sábado, com a publicação de uma declaração conjunta.

O meio ambiente, o comércio e a lacuna digital também serão temas abordados, assim como a situação no Haiti, muito sensível para a República Dominicana, seu vizinho e anfitrião do encontro.

A reunião retorna ao formato presencial após a cúpula de Andorra, em abril de 2021, que teve assistência majoritariamente virtual pela Covid-19.

E se nessa época o foco eram vacinas e a luta contra o vírus, agora é a crise econômica causada pela pandemia e agravada pela invasão russa da Ucrânia.

O chanceler dominicano, Roberto Álvarez, disse que a declaração que os países vão assinar "contém principalmente trabalhos em relação à inclusão de uma carta digital, uma carta ambiental ibero-americana" e "um caminho crítico de segurança alimentar".

O custo de uma alimentação saudável na América Latina é o mais alto do mundo - US$ 3,89 por dia por pessoa (cerca de R$ 20) - e inacessível para 22,5% de sua população, segundo números da ONU.

Além disso, serão apresentados trabalhos sobre "o acesso ao financiamento para países de renda média", no momento em que "as taxas de juros estão sufocando nossos países", acrescentou o chanceler.

No domingo, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) previu um 2023 "difícil", com crescimento de apenas 1% para a América Latina e o Caribe.

"Diálogo privado"
O presidente da Colômbia, Gustavo Petro; o do Chile, Gabriel Boric; e o de Cuba, Miguel Díaz-Canel, estão entre os chefes de Estado confirmados, junto com o paraguaio Mario Abdo Benítez, o boliviano Luis Arce, o equatoriano Guillermo Lasso, a hondurenha Xiomara Castro e o costarriquenho Rodrigo Cháves.

O rei Felipe VI e o chefe do governo espanhol, Pedro Sánchez, também confirmaram presença, assim como o primeiro-ministro português, António Costa.

Luiz Inácio Lula da Silva, por sua vez, será representado pelo chanceler Mauro Vieira, enquanto o presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador, enviará o subsecretário para a América Latina e o Caribe, Maximiliano Reyes.

Tampouco estará presente Dina Boluarte, presidente do Peru, investigada pela repressão aos protestos que eclodiram com a destituição de seu antecessor, Pedro Castillo.

Álvarez indicou que haverá espaço para "um diálogo privado entre todos os mandatários [...] sem uma agenda pré-estabelecida".

Há dúvidas sobre o comparecimento do presidente salvadorenho, Nayib Bukele, e do nicaraguense Daniel Ortega, ambos criticados por seu crescente autoritarismo e violações dos direitos humanos. E também do venezuelano Nicolás Maduro, que foi tema de um debate acalorado na cúpula da Andorra, onde muitos dignitários não o reconheceram por sua polêmica reeleição em 2018.

Isso mudou com a chegada da esquerda ao poder em muitos dos países que apostavam pela queda de Maduro, começando por Iván Duque, sucedido por Petro na Colômbia, que restituiu as relações com a Venezuela. Algo similar ocorreu no Brasil, Equador, Peru e Honduras.

A cúpula de Santo Domingo "é mais uma oportunidade para a Venezuela normalizar sua posição no cenário internacional [...], ser mais um no concerto das nações e deixar para trás a crise de legitimidade que marcou sua política externa", disse à AFP o especialista venezuelano em relações internacionais, Iván Rojas.

Migração e Haiti
A migração será o tema mais quente da cúpula, em uma região que conta com fortes fluxos de migrantes há anos. Venezuelanos, haitianos, cubanos, centro-americanos e mexicanos que querem fugir da pobreza e da falta de oportunidades em seus países.

"O caso do Haiti vai provavelmente entrar na declaração final, mas isso ainda não está definido", disse Rubén Silié, vice-ministro-dominicano de Política Externa Multilateral. "Não podemos impor a agenda", frisou.

Desde que chegou ao poder em 2020, o presidente da República Dominicana, Luis Abinader, vem endurecendo suas políticas migratórias em relação ao vizinho Haiti, o país mais pobre das Américas e controlado pelo crime organizado.

O presidente dominicano ordenou a construção de um muro em trechos da fronteira de 380 km entre Haiti e República Dominicana e, no ano passado, deportou mais de 170.000 haitianos, o que lhe rendeu críticas da comunidade internacional.