Lula visita Portugal e Espanha em meio a atritos diplomáticos sobre guerra na Ucrânia
Lula propõe uma mediação internacional e apresenta o Brasil como intermediário neutro
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva viaja nesta quinta-feira (20) para Portugal e Espanha, em sua primeira visita à Europa desde que assumiu o poder em janeiro, ao final de uma semana de polêmicas por suas declarações sobre a guerra na Ucrânia.
O conflito ucraniano será abordado nas conversas entre Lula e o primeiro-ministro português, António Costa, no sábado (22), informou o Itamaraty.
A visita a Portugal até terça-feira (25) faz parte do "relançamento das relações do Brasil com a Europa", disse a embaixadora Maria Luisa Escorel de Moraes, secretária do Itamaraty para o continente europeu.
"Portugal seria a porta de entrada do Brasil na União Europeia", acrescentou.
Lula provocou polêmica ao afirmar no último sábado (15), em Pequim, que os Estados Unidos devem parar de "incentivar" a guerra na Ucrânia, iniciada em fevereiro de 2022 com a invasão russa e que gerou duras críticas de Washington.
Ele também reiterou que Kiev divide a responsabilidade pelos ataques com Moscou e recebeu nesta segunda-feira em Brasília o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, que "agradeceu" pelos esforços brasileiros para acabar com o conflito.
No início de seu mandato, Lula promoveu um exercício de equilíbrio, ao visitar o presidente americano, Joe Biden, na Casa Branca, em fevereiro, e estreitar os laços com a China, principal parceiro comercial do Brasil.
Agora "a balança está um pouco desequilibrada", disse à AFP Pedro Brites, professor da Escola de Relações Internacionais da Fundação Getulio Vargas.
A viagem europeia será uma oportunidade para fazer um "reajuste" e "mostrar que acredita na visão democrática global que a Europa defende", acrescenta.
Prêmio a Chico Buarque
Em Portugal, Lula será recebido com honras no sábado pelo presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa.
Após o almoço com o primeiro-ministro, os dois governantes vão realizar um encontro de alto nível e assinar uma dezena de acordos de cooperação nas áreas de espaço, energia, ciência, educação e turismo, entre outros.
Na segunda-feira, vão inaugurar um fórum empresarial no Porto com 150 representantes dos dois países. De volta a Lisboa, presidirão a entrega do Prêmio Camões, o mais alto prêmio da literatura de língua portuguesa, ao compositor e cantor brasileiro Chico Buarque.
Na terça-feira (25), mesmo dia em que Portugal comemora a Revolução dos Cravos, que pôs fim à última ditadura do país em 1974, Lula discursará em sessão especial perante o Parlamento. A extrema direita portuguesa convocou manifestações.
Na Espanha, entre terça e quarta-feira, Lula participa de um fórum empresarial, reúne-se com o chefe de governo, Pedro Sánchez, e assistirá a um banquete com o rei Felipe VI, informou o Itamaraty, sem dar mais detalhes.
Entender a neutralidade
Diante da guerra na Ucrânia, a posição do Brasil se choca com a de Portugal e Espanha, membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). O país sul-americano se recusou a impor sanções a Moscou e a enviar munição para a Ucrânia.
Lula propõe uma mediação internacional e apresenta o Brasil como intermediário neutro.
Mas, depois de acusar os Estados Unidos de continuarem a incentivar a guerra, Washington criticou o Brasil por "repetir como um papagaio a propaganda russa e chinesa". O G7 alertou sobre os "custos severos" para aqueles que ajudam a Rússia em sua guerra contra a Ucrânia.
Já o governo ucraniano convidou Lula a visitar Kiev para "entender" a realidade da agressão de Moscou.
"O Brasil entende a neutralidade na perspectiva de entender pragmaticamente o conflito sem condenar as partes", explicou Brites à AFP.
Lula, que já governou o Brasil de 2003 a 2010, prometeu devolver o gigante latino-americano à vanguarda da geopolítica mundial, após o isolamento provocado por seu antecessor de extrema direita, Jair Bolsonaro.
Para o professor Pedro Brites, embora a visita de Lula a Washington tenha sido sua segunda viagem internacional após a posse em 1º de janeiro, seu governo prioriza o chamado "Sul Global". E muitos dos países que o compõem, incluindo a Índia, não condenam a Rússia pela guerra.
Apesar disso, Lula, que na semana passada foi incluído entre as 100 pessoas mais influentes da revista Time, moderou o tom na terça-feira (18) e condenou a "violação da integridade territorial da Ucrânia".
Ele está "testando onde pode pisar com mais calma", acrescenta o analista.