Líder indígena brasileira ganha prêmio ambiental por frear mineração
Alessandra Korap Munduruku foi reconhecida por sua luta para expulsar a mineradora britânica Anglo American de suas terras
Alessandra Korap Munduruku se voltou para o ativismo ao ver como o avanço da agricultura devastava seu território indígena de Sawré Muybu, no Pará, porém, foi a luta para expulsar a mineradora britânica Anglo American de suas terras que atraiu todas as atenções para ela.
Nesta segunda-feira (24), ela será uma das seis pessoas no mundo a receber o prêmio Goldman atribuído a defensores do meio ambiente.
A americana Fundação Goldman reconheceu a ativista, de 38 anos, protagonista da luta do povo munduruku para frear os planos da Anglo American de explorar territórios indígenas na Amazônia.
"(Fizemos) campanha, carta, entregamos para pessoas que entendem inglês para chegar até as mãos deles e falamos que a gente não ia aceitar nenhuma mineradora dentro de nosso território", disse Korap Munduruku, em entrevista por videochamada à AFP.
Em maio de 2021, depois de meses de pressão, a empresa retirou formalmente 27 projetos de mineração aprovados por autoridades em terras indígenas, incluindo o território Sawré Muybu, no Pará. Essas terras, lar do povo munduruku, contêm mais de 160 mil hectares de floresta tropical.
"A bem-sucedida campanha de Alessandra representa um mudança significativa na tomada de responsabilidades do setor privado e a mineração destrutiva no Brasil", celebrou a Fundação Goldman, que entregará os prêmios em uma cerimônia em São Francisco.
Pouco depois da Anglo American, a gigante brasileira Vale anunciou a retirada de todas suas licenças de exploração de terras indígenas no Brasil.
"Desafiando o patriarcado"
Korap Munduruku se dedicou ao ativismo ao ver seu território "sendo devastado" pela agricultura e a mineração, disse à AFP. "Foi aí que eu percebi que se eu ficasse só em casa ninguém ia me ouvir", explica.
Depois de se tornar educadora, estudou direito, mas, como mulher, não foi fácil chegar à liderança de sua comunidade em Sawré Muybu.
"Minha mãe dizia: 'Você não pode estar em uma reunião de homens', não podia perguntar porque é um patriarcado (...) eu fui desafiando", conta.
Como outros ativistas à frente das lutas dos povos originários, está aliviada com o fim do mandato do presidente de extrema direita Jair Bolsonaro (2019-2022), que paralisou os processos de demarcação de terras indígenas.
Porém mantém o ceticismo em relação ao presidente de esquerda Luiz Inácio Lula da Silva, que retornou ao poder em janeiro, após dois mandatos entre 2003 e 2010.
Ela destaca que Lula está tentando demarcar territórios, mas está fechando negócios com a China e o Mercosul, e que isso, segundo ela, é preocupante, afirmou, ao se referir à viagem do presidente ao país asiático, principal parceiro comercial do Brasil.
Brasil e China firmaram mais de 10 bilhões de dólares (cerca de 50,5 bilhões de reais em valores atuais) em investimentos e cooperação.
"A China tem muito interesse em agronegócio", afirma a ativista, preocupada que esses projetos, que também incluem ferrovias, gasodutos e indústria pesada, sejam implementados em terras indígenas. "Não nos consultou", reclama.
Também pede que Lula retome a demarcação de terras, inclusive as de Sawré Muybu. Essa questão será certamente um tema central nesta semana, quando milhares de representantes dos povos indígenas brasileiros se reunirem no "Acampamento Terra Livre", em Brasília.
"Se não demarcar, as mineradoras, todos os projetos, vão para cima de nós", afirma Korap Munduruku.
A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, anunciou na semana passada a próxima demarcação de 14 novos territórios indígenas, que somam 1,5 milhões de hectares, alguns deles na Amazônia.
A inédita pasta foi uma promessa de campanha de Lula. Porém, "não vamos ficar em silêncio" só por isso, adverte a líder.