Operação Venire

Bolsonaro preso ou inelegível? Veja o que pode acontecer com ex-presidente após operação da PF

De acordo com especialistas, caso se torne investigado, Bolsonaro pode responder por até três crimes

Jair Bolsonaro - Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil

A operação da Polícia Federal que apura a inclusão de dados falsos de vacinação no sistema do Ministério da Saúde abre uma nova frente nas investigações que têm o ex-presidente Jair Bolsonaro como alvo. Segundo especialistas ouvidos pelo GLOBO, caso comprovada a fraude, caso confirmada a inserção dos dados falsos, a conduta pode configurar os crimes de falsidade ideológica, inserção de dados falsos em sistema de informações e infração sanitária.

De acordo com o professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), Aury Lopes Junior, três atos são passíveis de criminalização no caso: a inserção dos dados falsos, a solicitação para que os dados tenham sido inseridos e, por fim, o uso de um documento falso.

— Se o documento é verdadeiro, mas as informações inseridas nele são falsas, tem-se em tese o crime de falsidade ideológica. Já se a carteira for inteiramente falsa, o crime seria de falsificação de documento público. Em ambos os casos, a pena é aumentada se o crime é praticado por funcionário público — afirma Aury Lopes.

Segundo o professor, caso Bolsonaro se torne investigado e seja condenado, ele poderá se tornar inelegível. Nesse caso, essa possibilidade depende principalmente da instância onde o caso será julgado. A Lei da Ficha Limpa prevê a inelegibilidade apenas após condenação por um órgão colegiado.

— Se e o futuro e eventual processo tramitar no STF, a primeira condenação lá já é uma condenação por órgão colegiado, o que tornaria o ex-presidente inelegível. Mas, se for julgado em primeira instância, o ex-presidente só se tornaria inelegível após uma eventual condenação em segunda instância — disse.

De acordo com o professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Davi Tangerino, os envolvidos também poderiam ser enquadrados no crime de inserção de dados falsos em sistemas de informações, previstos no art. 313-A do Código Penal.

— Não adianta, neste caso, ou adianta pouco, falsificar um papel. Porque se alguém for consultar o sistema, e o presidente era uma pessoa com bastante visibilidade, no sistema haveria uma informação diferente. Então, é preciso falsificar o sistema primeiro, que está previsto no artigo 313-A, com uma pena de 2 a 12 anos, que é uma pena alta. A partir dessa inserção no sistema, é possível gerar com facilidade um certificado no aplicativo como todo mundo fez, mas esse documento também é falso, ideologicamente falso — disse.

Os dois professores também compartilham a visão de que não apenas a inserção de dados falsos pode ser passível de criminalização, mas também eventuais usos do documento, previstos no artigo 304 do Código Penal. Nesse caso, o número de crimes seria equivalente ao número de vezes que o documento tenha sido utilizado.

Bolsonaro e outros também poderiam se enquadrar no crime de infração sanitária caso tenha apresentado o documento falso em algum lugar que exigia a vacinação. Além disso, o presidente também poderia responder pelo crime fora do país, caso tenha usado um certificado falso para viajar para o exterior.

— Se eu falsifico um único documento e uso esse único documento uma vez, é um crime só. Se eu falsifico um documento capaz de ser usado em vários contextos, como um RG, toda vez que usar esse documento vou estar cometendo o crime de uso de documento falso. Nesse particular tem algo muito interessante porque aparentemente o objetivo era burlar as medidas sanitárias inclusive para sair do Brasil, portanto para entrar em outros países. Ou seja, tem crimes cometidos fora do Brasil, por exemplo usar um documento falso na imigração nos Estados Unidos — afirma Tangerino.

Para Aury Lopes Junior, a questão será apurar qual foi a participação de Bolsonaro na inclusão. Segundo o professor, o ex-presidente só poderia ser punido caso seja comprovado que ele pediu ou sabia da falsidade.

— Ou seja, se ele tinha consciência da inserção das informações falsas ou pelo uso do documento falso, mas isso deverá ser apurado na investigação — afirmou.