LUTO

Morre o jornalista Bernardo de La Peña

Repórter premiado, era considerado um talento em sua geração

O jornalista Bernardo de La Peña lutava contra um câncer no cérebro - Reprodução

Morreu nesta segunda-feira (8), aos 48 anos, o jornalista Bernardo de La Peña, após uma longa batalha contra câncer. Considerado um talento de sua geração, repórter de Política e Economia, tem dois prêmios Esso na prateleira, o maior reconhecimento da profissão. Mesclava, com habilidade única, as habilidades de um repórter investigativo com os bastidores da politica, relata o parceiro e amigo Gerson Camarotti, comentarista politico da GloboNews. E sabia ser um bom amigo para os amigos, como lembrou sua mãe Denise.

Ele estava internado há dois meses na Casa de Saúde São José, no Rio, e deixou uma legião de amigos e colegas de trabalho consternados. Camarotti foi parceiro de reportagens em Brasília, para onde ele foi em 2003, cobrir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva pelo O Globo. Eles escreveram juntos o livro Memorial do Escândalo, sobre o Mensalão e a CPI dos Correios.

"O jornalismo perde muito com a morte do Bernardo, mesmo ele já estando afastado. Foi privilégio ter sido parceiro do Bernardo, um presente de vida. Você se sentia especial do lado dele. Ele te deixava especial. Quando chegou em Brasília, muito rapidamente todas as fontes conheciam o Bernardo e ele já era uma referencia. Pouquíssimos repórteres conseguem ser um bom repórter investigativo e, ao mesmo tempo, ser um bom repórter de bastidor político. Ele era brilhante."

O ex-presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia escreveu sobre Bernardo nas redes sociais: "Um repórter nato, dos melhores na cobertura política, alguém que acompanhou de perto minha trajetória como político".

O prefeito Eduardo Paes foi outro que mostrou seu consternamento com a morte do jornalista em rede social:

"Durante anos convivemos em Brasília tratando da política nacional. Aguçado, gentil, firme, curioso…. Bernardo era o que podemos chamar de grande jornalista. Para que vocês tenham uma ideia do quanto eu admirava esse cara, uma das inspirações para dar o nome do meu primeiro filho foi conhecer esse ser humano incrível."

O diretor de Redação de O Globo, Alan Gripp, considera o jornalista "um dos grandes repórteres de Política de sua geração e um grande parceiro:

"Bonachão, sedutor, curioso, extremamente sempre bem informado, transitava entre as fontes do mundo político com uma facilidade inigualável."

Depois da passagem em Brasília, Bernardo foi repórter da coluna do Ancelmo Gois. O colunista lembra da importância do trabalho dele na época, principalmente com o conjunto de fontes que fez no seu período em Brasília.

"Ele era uma pessoa brilhante, marcava presença, muito ativo, dinâmico. Falava com presidente do Câmara e do Senado a qualquer hora. Onde ele chegava, as pessoas prestavam atenção, Muito presente. Foi um excelente parceiro que tive na coluna. Tinha faro para notícia", lembra Ancelmo.

O caminho mais fácil para o Bernardo seria trabalhar com o pai, José de La Peña, que na primeira metade dos anos 1990 já tinha uma empresa consolidada na área de comunicação corporativa. Mas Bernardo queria mesmo redação. Quando surgiu a oportunidade de estagiar na sucursal do Estadão/Agência Estado no Rio de Janeiro, ele vestiu um terno e gravata e foi viver a aventura da reportagem. Jamais apareceu sem terno, mesmo sob um calor de 40 graus. A sua principal característica, contudo, não era essa. Bernardo fazia tudo com muita alegria. Não tinha hora para sair. Empolgava-se com as pautas mais desafiadoras, lembra o amigo e parceiro, o jornalista do Globo, Chico Otávio.

"Jamais perdia a paciência. Era elegante na abordagem. Topava qualquer história promissora, mesmo que envolvesse muita dificuldade na apuração."

Depois do aprendizado na sucursal do Estadão, ele se transferiu para O GLOBO e viveu, na editoria Nacional, os melhores anos de sua carreira. Em 2001, ganhou o Prêmio Esso, na categoria Informação Econômica, com Ricardo Boechat e Chico Otavio, com a série "Sinal verde para o contrabando". No ano seguinte, novamente subiu ao palco do evento para receber, com Chico Otavio, Renato Garcia e Rodrigo Rangel, o Prêmio Esso de Jornalismo pela série "Sentenças suspeitas". Mergulhou nos subterrâneos do Judiciário, com os parceiros de projeto, numa época em que pouco se publicava das mazelas da magistratura.

Ele ainda tinha tempo para circular nos ambientes boêmios dos jornalistas, onde ria alto, fazia piadas e viajava nas teses de mesa de bar sem beber uma única gota de álcool. Seu jeito descontraído abria as portas. Entre as fontes e os jornalistas.

Foi numa mesa de bar que Camarotti conheceu Bernardo e ficaram amigos para a vida:

"Conversamos a noite toda no Braseiro da Gávea (Zona Sul do Rio), onde ele era o rei."

Mas, infelizmente, as primeiras manifestação do seu problema de saúde, um câncer no cérebro, o atingiram, de forma prematura, no auge da carreira. E Bernardo, então, começou a tirar o pé do acelerador. Foi diminuindo aos poucos o ritmo da carreira, e voltou para o Rio. Após passar pela coluna de Ancelmo, para adequar a carreira às necessidade físicas impostas pelo tratamento, resolveu trabalhar para o pai.

A paixão pelo jornalismo era tamanha que, assim que a saúde permitiu, voltou para a trincheira do jornalismo, por um breve período, no Jornal do Brasil e, posteriormente, no projeto Colabora. Até onde sua energia permitiu, Bernardo foi repórter no sentido clássico: apurador, cativador de fontes, sagaz.

O velório acontece nesta segunda-feira, no Cemitério São João Batista, a partir das 13h30 e o enterro será às 16h30.