Bolsonaro chega à PF para prestar depoimento na investigação sobre fraude na vacina
Investigadores devem confrontar tese de que Mauro Cid, que depõe na quinta-feira, agiu por conta própria na suposta falsificação dos cartões de vacinação
O ex-presidente Jair Bolsonaro chegou por volta das 13h30min desta terça-feira à sede da Polícia Federal, em Brasília, para prestar depoimento no inquérito que apura a suspeita de fraude nos cartões de vacinação dele, familiares e assessores.
No dia 3 deste mês, Bolsonaro foi alvo de um mandado de busca e apreensão — houve ainda seis prisões efetuadas pela PF, entre elas a do tenente-coronel Mauro Cid, que foi ajudante de ordens do ex-presidente.
O antigo mandatário passou por treinamento antes da oitiva. A defesa do ex-presidente tem à frente o advogado Paulo Amador da Cunha Bueno — o antigo ocupante do Palácio do Planalto tem sido aconselhado também pelo ex-secretário de Comunicação Fabio Wajngarten.
Como mostrou O Globo, a Polícia Federal tem em mãos elementos para questionar a tese de que o ex-ajudante de ordens Mauro Cid, que está preso, atuou sozinho e vê indícios de associação criminosa na trama que envolve o antigo mandatário. Com o avanço da apuração, a PF aponta como principal elemento que mostra o conhecimento de Bolsonaro a troca no e-mail vinculado à conta dele no aplicativo ConecteSUS no fim do governo — a gestão passou do tenente-coronel para Marcelo Costa Câmara, auxiliar que seguiu ao lado do chefe pós-Presidência.
O fato deve ser usado para confrontar uma eventual versão de que Cid agiu sozinho, sem a anuência do ex-presidente. O militar, que vai prestar depoimento na quinta-feira, tem sido aconselhado a assumir a própria culpa — Bolsonaro, por sua vez, será ouvido amanhã.
Segundo a apuração, o login de Bolsonaro no aplicativo ConecteSUS estava associado ao e-mail de Cid até o dia 22 de dezembro do ano passado. Naquela data, foi gerado um certificado de vacinação do então mandatário com o registro falso de duas doses da vacina da Pfizer. Minutos depois, o e-mail de login foi alterado para o do coronel Marcelo Costa Câmara, então assessor especial da Presidência — ele foi nomeado para auxiliar Bolsonaro após o final do mandato.
A mudança se deu, segundo a PF, porque Cid estava prestes a deixar a função de ajudante de ordens de Bolsonaro. A partir de 1º de janeiro deste ano, o ex-presidente passaria a ser assessorado por oito auxiliares, sendo um deles o coronel Câmara, homem de confiança do ex-mandatário que viajaria com ele para a Flórida.
De acordo com a PF, a alteração cadastral foi feita a partir da conexão de rede do Palácio do Planalto, outro indício de que Bolsonaro sabia da fraude.
Os elementos colhidos até aqui reforçaram duas linhas de investigação: a primeira é a do crime de inserção de dados falsos no sistema eletrônico do Ministério da Saúde, o que, se comprovado, prevê uma pena de até 12 anos de prisão. A segunda é a formação de uma associação criminosa para praticar o delito. Nesse caso, a punição poderia chegar a até três anos de reclusão.
As vacinas registradas em nome de Bolsonaro foram inseridas no sistema da Saúde no dia 21 de dezembro do ano passado, às 18h59min e às 19h, antes de embarcar para uma viagem aos Estados Unidos. Segundo esse registro falso, o ex-presidente teria tomado a primeira dose da Pfizer em 13 de agosto e a segunda em 14 de outubro, no Centro Municipal de Saúde de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense.
Seis dias depois, em 27 de dezembro, os dados de vacinação de Bolsonaro foram apagados do sistema por uma servidora da prefeitura de Duque de Caxias (RJ), que justificou a exclusão com a anotação de “erro”, de acordo com a PF.
Essa cronologia e as suspeitas de irregularidades verificadas até aqui serão exploradas nos depoimentos desta semana.
O ex-presidente tem negado participação em quaisquer irregularidades. Em declarações públicas, a defesa tem alegado ainda que o ex-presidente, na condição de chefe de Estado até dezembro passado, não precisou apresentar o seu comprovante de vacinação para entrar nos Estados Unidos. Para a PF, no entanto, a principal linha de apuração não é o uso do documento falso, mas, sim, se o ex-mandatário tinha conhecimento e se beneficiou da fraude.
— Não existe adulteração da minha parte. Não tomei a vacina. Ponto final — declarou Bolsonaro no dia da operação.