Na Embratur, Freixo já demitiu 71 pessoas entre militares e doadores de ex-ministro de Bolsonaro
Lista inclui dez funcionários que doaram R$ 17.250 para a campanha de Gilson Machado ao Senado. Contribuições foram questionadas por auditoria do TSE
O presidente da Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur), Marcelo Freixo, está dedicado a fazer uma “desbolsonarização” da empresa desde que foi nomeado por Lula para assumir o cargo, em 13 de janeiro. O processo passa por demissões, cancelamento de promoções efetivadas após a derrota do ex-presidente Jair Bolsonaro nas eleições do ano passado e pela revisão de contratos assinados no fim de 2022. Para isso, Freixo mantém uma auditoria, ainda em curso, conduzida pela Controladoria-Geral da União (CGU) e pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
Foram demitidos 71 funcionários da Embratur desde o começo do ano — quase metade do quadro total de trabalhadores da Embratur. Entre os que foram embora estão militares, CACs (colecionadores, atiradores e caçadores) e pessoas ligadas ao ex-ministro Gilson Machado, antecessor de Freixo no comando da agência e figura próxima de Bolsonaro, sendo presença frequente tocando sanfona nas lives do ex-presidente.
A lista dos demitidos inclui dez pessoas que fizeram doações à campanha de Machado, que não conseguiu se eleger para o Senado por Pernambuco. As doações totalizaram R$ 17.250, sendo a mais baixa de R$ 500, e a mais alta, de R$ 2.500. Entre os doadores está o ex-presidente da agência Silvio Nascimento, que doou R$ 950 via Pix.
Os aportes dos agora ex-funcionários da Embratur na campanha de Machado foram alvo de questionamento da auditoria do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na prestação de contas apresentada pelo ex-ministro.
Reuniões e armas
Em resposta à contestação do TSE, Machado alegou por meio de uma empresa de contabilidade contratada por ele que “nenhum dos doadores possui quaisquer vínculos empregatícios com o candidato”. Gilson Machado havia presidido a Embratur entre maio de 2019 e novembro de 2020, quando assumiu o Ministério do Turismo da gestão Bolsonaro. Ele deixou a pasta em março do ano passado para disputar a eleição, e foi nomeado de volta para presidir a agência em novembro, logo após ser derrotado nas urnas.
Os funcionários que permaneceram na Embratur relataram à nova direção que chegaram a ver colegas armados em reuniões realizadas na sede da empresa, em Brasília. Para o lugar das 71 pessoas que saíram, foram contratados 40 novos funcionários, segundo Freixo:
— O critério para as demissões não foi político, eu não sei quem é filiado a partido e quem não é. Foi um processo técnico, porque havia muita gente que não tinha nada a ver com turismo e excesso de pessoas sem funções definidas.
Queda de braço por verbas
As mudanças no corpo técnico da Embratur ocorrem em um momento em que a agência enfrenta uma batalha em busca de recursos para o ano que vem.
Nas últimas semanas, Freixo tem revisitado seu histórico como congressista e discutido pessoalmente a aprovação de uma proposta no Senado que destina 5% dos recursos do Sesc e do Senac para a agência.
O remanejamento dessa verba para a Embratur foi incluído no texto que converte em lei a medida provisória que reduziu a alíquota do PIS/Cofins para empresas aéreas em 2026 — já aprovado pela Câmara e que agora aguarda votação no plenário do Senado, o que está previsto para acontecer na semana que vem.
A proposta colocou Freixo em uma queda de braço com representantes do Sistema S, que lançaram um abaixo-assinado contra o que chamam de “corte” capaz de resultar no fechamento de cem unidades do Sesc e do Senac no país. O documento já tem mais de 730 mil assinaturas e conta com apoio de personalidades como Fernanda Montenegro, Ivan Lins e Padre Júlio Lancellotti.
Em carta enviada ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a Confederação Nacional do Comércio (CNC) classifica a proposta como “verdadeiro retrocesso social” e diz que sua eventual aprovação “prejudicará milhões de atendimentos à população”.
— Trata-se de uma medida inconstitucional, um odioso jabuti que enfiaram no texto na calada da noite. Isso que querem fazer é uma expropriação de recursos privados. Não se tira dinheiro do trabalhador — diz o presidente da CNC, José Roberto Tadros, que promete recorrer à Justiça caso a proposta seja aprovada.
Freixo diz que a medida provisória que transformou a Embratur em um serviço autônomo (deixando, assim, de ser uma autarquia) previa a destinação de 15,75% das contribuições pagas ao Sistema S para a agência. A medida, baixada em novembro de 2019 pelo governo Bolsonaro, foi modificada quando passou pelo Congresso, em abril do ano seguinte, o que deixou a Embratur sem recursos.
— O Sesc e o Senac têm sobras anuais de R$ 2 bilhões. Estamos pedindo uma parcela disso, R$ 447 milhões, um dinheiro que é público, que vem de imposto. A ideia de que eles vão fechar não se sustenta. Equipar a Embratur é um investimento no desenvolvimento do Brasil, e o comércio ganha com o crescimento do turismo. Se nada for feito, a Embratur vai fechar as portas — diz Freixo, derrotado na eleição do ano passado ao governo do Rio de Janeiro.