Entrevista

"Não se pode deixar Lula livre, leve e solto para cometer erros sem advertência", diz João Santana

Ex-marqueteiro de Lula e Dilma que fez campanha de Ciro Gomes em 2022 quebrou silêncio em entrevista à Folha de S. Paulo

João Santana, ex-marqueteiro do PT e da campanha eleitoral de Ciro Gomes - Will Shutter/O Globo

Ex-marqueteiro de Lula e Dilma Rousseff que atuou na campanha de Ciro Gomes em 2022, João Santana quebrou um longo silêncio e defendeu que a esquerda não pode deixar de criticar o atual governo petista. Em entrevista à Folha de S. Paulo, ele disse que as atuais críticas à comunicação da gestão Lula são na realidade um problema do próprio governo, que não teria um projeto de nação claro.

Santana diz que a ideia difundida por setores do PT de que apontar erros de Lula seria fortalecer o ex-presidente Jair Bolsonaro seria um “absurdo e um mal sem tamanho para o Lula e para a democracia”. Ele afirmou que deseja que o atual presidente faça um bom governo e que pra isso as cobranças devem partir também de quem está no mesmo campo político.

“Deixar o monopólio da crítica com Bolsonaro é um erro por causa de uma lógica mecânica: se um elemento (Bolsonaro) tem esse poder, e o outro (Lula) fracassa, isso vai levar o movimento em direção ao primeiro. Não se pode deixar o Lula livre, leve e solto para cometer os erros sem advertência, sem críticas” afirmou à Folha.

O marqueteiro voltou a atuar em campanhas políticas no ano passado, após ser preso pela Operação Lava Jato. Ele foi condenado por lavagem de dinheiro de caixa dois e fechou um acordo de delação premiada em 2017.

Na entrevista, João Santana também fez uma avaliação sobre a comunicação do governo Lula, que vem sendo alvo de críticas de aliados e no campo da esquerda.

“Fala-se muito que o governo tem problema de comunicação, mas acho que, na verdade, a comunicação sofre problemas de governo. Raramente um governo com um projeto de nação concreto e um plano de ação claro tem problema de comunicação”, apontou Santana.

Para o marqueteiro, o governo estaria concentrado demais na imagem pessoal de Lula.

“O protagonismo excessivo de um líder quase narcísico e a repetição retórica monótona não são suficientes, como também não é suficiente vender doses de empatia e de institucionalidade. O Lula precisa tomar cuidado para que o discurso da miséria não vire a miséria do discurso”, afirmou.

A campanha de Ciro Gomes em 2022, coordenada por João Santana, acabou ficando em quarto lugar na disputa, atrás de Lula, Bolsonaro e Simone Tebet. O marqueteiro atribuiu o fracasso ao excesso de polarização do país e a falta de recursos políticos e econômicos para a campanha do pederastas.

“Sem demérito de ninguém, nunca tive um candidato no nível de Ciro, mas ao mesmo tempo nunca vivi uma campanha com tantos impedimentos políticos, técnicos e conjunturais, escassez de meios e tantas dificuldades estratégicas e táticas”, disse.

Santana afirmou ainda que enxerga o resultado de 2022 como o pior momento de sua carreira.

"Eu e Ciro amargamos juntos a maior derrota eleitoral de nossas histórias pessoais, mas isso não nos destrói", avaliou.