VENEZUELA

Falas polêmicas, agressão a jornalistas e jantar cancelado: as conturbadas 48h de Maduro em Brasília

Presidente venezuelano não vinha ao país desde 2015

Nicolas Maduro, presidente da Venezuela - Evaristo Sá / AFP

As declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva questionando a existência de uma ditadura na Venezuela, sob alegação de que o regime de Nicolás Maduro é vítima de uma “narrativa” montada contra ele, atraíram fortes críticas internas e externas — e reações até mesmo de alguns dos 11 presidentes sul-americanos que participaram da cúpula promovida pelo governo brasileiro no Palácio do Itamaraty, em Brasília.

Mas não foram os únicos problemas causados pela visita do presidente venezuelano ao país: agentes de segurança de Maduro agrediram jornalistas que tentaram se aproximar dele, após sua reunião bilateral, e um jantar na casa do advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, foi desmarcado de última hora.

A confusão aconteceu na terça-feira, durante uma tentativa de repórteres de falar com Maduro. Os seguranças do presidente venezuelano tentavam impedir a aproximação dos profissionais e, no empurra-empurra, um deles deu um soco no peito da repórter da TV Globo Delis Ortiz. As imagens do momento da agressão não foram registradas.

Ortiz foi levada para uma sala do Itamaraty, onde recebeu atendimento médico, e passa bem. Em nota, o Ministério das Relações Exteriores lamentou a agressão a profissionais de imprensa e afirmou que tomará providências para apurar responsabilidades. Já a Secretaria de Imprensa da Presidência divulgou um comunicado em que "se solidariza com a jornalista Delis Ortiz e repudia toda e qualquer agressão contra jornalistas".

Durante encontro com Maduro que chamou de "histórico", um dia antes, Lula fez fortes críticas aos EUA pelo embargo econômico ao país vizinho, afirmando que as sanções econômicas são "pior do que uma guerra", e chamou de "narrativas" as acusações de que Caracas não vive sob um regime democrático. No mesmo dia à noite, Maduro ficou sem local para jantar, depois que uma grande recepção na casa do advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay — que reuniria líderes petistas e ministros — teve que ser desmarcada na última hora por causa da morte da sogra do anfitrião.

Na terça, os presidentes do Uruguai, Luis Lacalle Pou, de direita; do Chile, Gabriel Boric, de esquerda; e do Equador, Guillermo Lasso, de centro-direita, reagiram criticamente às declarações de Lula. Sem citar Lula, presidente do Uruguai diz que ficou 'surpreso' ao ouvir que ditadura na Venezuela é uma narrativa. Já Lasso, afirmou que "não existe democracia onde existem presos políticos".

O líder chileno, por sua vez, pontuou haver uma discrepância entre a realidade e a visão de Lula:

— Nos alegra que a Venezuela retorne às instâncias multilaterais. Mas isso não significa fazer vista grossa. Há uma discrepância entre a realidade e as declarações do presidente Lula — disse Boric.

Boric, além de dizer que não é possível ignorar o que acontece no governo de Maduro, afirmou que os direitos devem ser respeitados em todo lugar, "não importa a coloração política". No entanto, disse concordar com Lula de que as sanções econômicas contra os venezuelanos são pesadas.

As críticas surgiram no mesmo dia em que Lula, em pronunciamento de boas-vindas à cúpula, defendeu a união regional, apesar da diferenças entre os países, para fazer frente aos atuais desafios globais.

Maduro não vinha ao país desde 2015, quando participou da posse do segundo mandato da ex-presidente Dilma Rousseff, que sofreu impeachment no ano seguinte. Sua presença no país não era permitida desde agosto de 2019, quando uma portaria editada pelo então presidente Jair Bolsonaro proibia o ingresso no país do líder venezuelano e de outras autoridades do vizinho latino-americano.