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Em experimento, taurina freia envelhecimento e faz camundongos viverem 10% mais

Molécula mais conhecida como ingrediente de bebidas energéticas é produzida naturalmente pelo organismo de mamíferos

Rato de laboratório - Pexels

Em um experimento com três tipos de cobaia, a suplementação com o aminoácido taurina conseguiu reverter processos metabólicos associados ao envelhecimento e estendeu o tempo de vida dos animais. Em vermes de laboratório foi possível ampliar em 10% a 23% o tempo de vida média e, em camundongos, a melhora foi de 10% a 13%.

O resultado da pesquisa foi anunciado nesta quinta-feira (8) em estudo na revista Science por um grupo internacional de cientistas. Nenhum teste clínico com humanos foi feito ainda, mas, em um banco de dados com acompanhamento clínico de um estudo antigo, os pesquisadores encontraram correlação entre a taurina e indicadores de saúde melhores ao longo do envelhecimento.

O artigo publicado nesta quinta-feira, resultado de 11 anos de pesquisa, surge como a primeira primeira evidência experimental robusta do efeito dessa substância na longevidade. O trabalho foi liderado pelo cientista Vijay Yadav, da Universidade Columbia, de Nova York, junto com outros 39 colegas, de diversos outros centros de pesquisa no mundo.

Eles não apenas mostraram que a concentração de taurina cai com a idade, mas concluíram que, em cobaias, a reposição desse nutriente promoveu um envelhecimento mais saudável e longo.

— Em todos os aspectos que investigamos, os camundongos que receberam suplementação eram mais saudáveis e pareciam mais jovens do que os do grupo de controle — contou Yadav em entrevista coletiva online nesta semana. — Eles eram mais magros e apresentavam um balanço energético melhor, com melhor densidade óssea, mais força muscular, sintomas característicos de depressão e ansiedade reduzidos, mais memória, menor resistência a insulina e sistema imune mais preservado.
 

No trabalho, os pesquisadores também relatam que a reposição com a substância melhorou indicadores de saúde de macacos resos, o terceiro animal usado na pesquisa. Nos símios, porém, a duração do teste é mais longa, porque os animais vivem mais, e ainda não foi verificada melhora específica sobre a longevidade.

Apesar de ser um aminoácido produzido naturalmente pelo corpo dos humanos e de vários outros mamíferos, a taurina é mais conhecida do público como ingrediente de bebidas energéticas vendidas em bares e supermercados. O estudo liderado por Columbia, porém, usou para reposição a substância pura, e os pesquisadores afirmam que o resultado não se aplica ao consumo de bebidas com taurina disponíveis hoje comercialmente.

— Essas bebidas energéticas são uma mistura de diferentes compostos que frequentemente tem bastante cafeína, o que é diferente da taurina em estado puro — afirma o fisiologista Henning Wackerhage, da Universidade Técnica de Munique (Alemanha), coautor do estudo.

Segundo ele, como drinks comerciais com taurina também costumam ter açúcar, sódio e outros ingredientes, é possível que os benefícios não se verifiquem, já que o consumo alto dessas outras substâncias está associado a efeitos deletérios.

— Não queremos fazer uma recomendação sobre se essas bebidas são recomendáveis para aumentar a concentração de taurina no organismo — diz Wackerhage, que contou ter administrado a substância por via oral em uma solução líquida neutra às cobaias nos experimentos.

Num braço secundário do estudo, uma das coisas que os cientistas verificaram é que um fator que aumenta a taurina no corpo humano é a atividade física. Por causa disso, os pesquisadores afirmam que a substância provavelmente está associada a alguns efeitos positivos do esporte e do exercício na saúde geral.

Uma das razões pelas quais os pesquisadores demoraram tanto para concluir os estudos é que eles buscaram entender melhor por que a taurina apresentou o efeito de retardar o envelhecimento nos animais estudados.

Nas análises mais detalhadas, eles verificaram que a substância ajudava a proteger os telômeros, que são as extremidades dos cromossomos das células. A perda de pedaços dos telômeros está associada com envelhecimento celular, e os pesquisadores também constataram que sinais de degeneração celular era menor nos animais com reposição de taurina. O DNA dessas cobaias era mais intacto e as mitocôndrias, as estruturas que processam energia dentro das células, também estavam funcionando melhor.

Isso não foi visto, porém, na parte do trabalho que trata da correlação de efeitos da taurina com humanos. Esse braço da pesquisa, na verdade, lançou mão da análise de dados de um estudo relativamente antigo de acompanhamento clínico com humanos.

A pesquisa Epic-Norfolk, que mediu concentração de diversas substâncias no organismo de 30 mil ingleses ao longo da década de 1990, tinha dados sobre a taurina. Foi ali que os cientistas conseguiram enxergar essa correlação, informação que passara despercebida em estudos feitos na época com a mesma base de dados.

Todas essas informações foram empacotadas no estudo que sai agora na Science. Os cientistas esperaram que cada um dos vários braços do trabalho estivesse completo antes de divulgarem qualquer resultado.

Ainda não é possível dizer com certeza, porém, que o benefício da taurina a animais vai se repetir em humanos.

— O que nós precisamos realmente agora é de um estudo de intervenção humana — diz Wackerhage. — Seria um estudo mais caro de fazer, e precisamos obter financiamento, porque envolve administrar taurina ou placebo aos voluntários e acompanhar centenas de pessoas para saber elas vivem mais e melhor. Talvez seja difícil atestar que elas viverão mais, mas nós podemos verificar se elas vivem saudáveis por mais tempo. É esse, afinal, o objetivo da medicina.