Organizador da Marcha para Jesus é alvo de representação no MP por racismo religioso
Ex-deputado Átila Nunes pede retratação de Apóstolo Estevam Hernandes; na quinta-feira, líder questionou apoiadores se preferiam que o Brasil se tornasse um país evangélico ou 'macumbeiro' nos próximos anos
O ex-deputado estadual Átila Nunes (PSD-RJ) acionou o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) nesta sexta-feira contra o organizador da Marcha Para Jesus, o apóstolo Estevam Hernandez. Durante evento na cidade de São Paulo, o líder religioso questionou os manifestantes se preferiam um Brasil "macumbeiro ou evangélico".
O ministro neopentecostal narrou um encontro que teve com um pastor quando há décadas e repetiu a pregação:.
"Um dia eu estava no estádio do Maracanã e ele disse assim: nos próximos anos, o Brasil será o maior País macumbeiro do mundo ou maior País mais evangélico do mundo. Depende de você porque depende de nós", disse o apóstolo aos mais de 2 milhões de presentes.
Em entrevista ao GLOBO, Átila Nunes afirmou que a representação por vias legais é a única forma de deter a intolerância:
"Quando eles vêm muita multidão, eles se entusiasmam, conseguem colocar para fora o que está guardado no íntimo deles: a intolerância religiosa. Única forma de deter esses intolerantes poderosos é denunciando no Ministério Público. Não paramos ele sem recorrer aos canais oficiais."
Por este motivo, Nunes fez uma representação por crime contra o sentimento religioso. De acordo com o ex-deputado e advogado, casos como esse ferem a liberdade religiosa no país, garantida pela Constituição Federal, e se sobrepõem à liberdade de expressão. "O abuso no exercício da liberdade de expressão não pode ser tolerado. Assim, a incitação ao ódio público não está protegida nem amparada pela cláusula constitucional que assegura liberdade de expressão", defende em documento ao qual o GLOBO teve acesso.
O ex-parlamentar defende ainda que a atitude do organizador gera ojeriza na comunidade espírita e entre adeptos das religiões africanas. "É de conhecimento geral que o Brasil é formado por uma grande população de origem africana que, muitas vezes esconde ou nega suas origens religiosas por receio de sofrer discriminação e até mesmo segregação social. Isso se justifica em razão de que, na maioria das vezes, religiões neopentecostais enraízam em seus seguidores que as religiões os cultos africanos são diabólicos e que todos aqueles que os seguem devem ser banidos de um convívio social saudável e de 'bem'".
Neste contexto, Átila Nunes caracteriza o comportamento de Hernandez como inadmissível e solicita a instauração de procedimento administrativo para apurar eventual responsabilidade criminal cometida pelo Apóstolo Estevam Hernandes. A retratação pública do líder religioso também é solicitada, assim como a aplicação de eventuais penalidades. O advogado sugere o pagamento de R$ 50 mil em danos morais revertidos em projeto social a ser criado para prevenir o preconceito religioso.
Procurado, apóstolo Estevam Hernandez informou que não foi notificado oficialmente sobre a representação e que, por isso, não comentará a representação.
Ministro de Lula vaiado
A fala do apóstolo durante a Marcha para Jesus ocorreu quando representantes do Lula (PT) estavam ao seu lado no palco. Durante o evento, o advogado-geral da União, Jorge Messias, foi vaiado ao citar o nome do presidente. Lula foi convidado a participar do evento religioso, mas recusou e mandou o ministro como representante.
Em seu breve discurso, Messias afirmou que Lula quer a paz do país, mas ouviu vaias de diversas pessoas presentes no local.
"Meus irmãos, nós não vivemos para esse mundo, vivemos para o reino. E é isso que nos diferencia e por isso estamos aqui hoje. Eu vim aqui dizer pra vocês, a pedido do presidente, que no Brasil há homens e mulheres que vivem para o reino e nós entendemos que nós estamos lá não por nossas próprias pernas, mas fomos escolhidos por Deus. Nosso povo quer paz e nós vamos trabalhar pela paz, foi isso que o presidente pediu que eu falasse pra vocês hoje", declarou Messias.
A deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ) também estava presente.