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Entenda como a União Europeia quer se proteger do avanço da influência econômica da China

UE busca mecanismos de proteção comercial e ampliação de parcerias estratégicas, entre outros instrumentos para tentar conter o poder de países rivais sobre a econom

Presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, - Sergei Supinsky / AFP

A União Europeia (UE) avança na criação de mecanismos para fortalecer seu peso global e impedir que países como a China e a Rússia usem o comércio e o controle do fornecimento de bens vitais para atingir objetivos políticos e militares.

A Comissão Europeia — que é o braço executivo da UE — vai apresentar, nesta terça-feira (20), a estratégia de segurança econômica, que vai apontar riscos para os negócios e para segurança do bloco, além de medidas efetivas para combater esses riscos e opções para novas medidas protetivas contra investidas de coerção econômica de países rivais.

A União Europeia demorou para perceber o quanto era dependente da Rússia e, quando Moscou invadiu a Ucrânia, há mais de um ano, enfrentou uma inflação recorde e foi assombrada por uma catástrofe econômica, enquanto buscava novos fornecedores de petróleo e gás — antes entregues a baixo custo pela Rússia. No entanto, os países que integram o bloco estão divididos sobre como agir — com alguns relutando em começar uma guerra comercial com a China, que é um parceiro primordial de muitas economias europeias.

"Não vejo tão positivamente o que estamos fazendo" disse Alicia Garcia Herrero, economista-chefe para a Ásia e o Pacífico na Natixis. "Enquanto o Japão e os Estados Unidos têm sido mais assertivos, nós temos que centralizar mais competências para sermos mais efetivos, e não acho que os países que integram o bloco estejam dispostos a isso."

Entenda os cinco mecanismos que a UE implementou ou está analisando para garantir segurança econômica ao bloco:
Instrumento anti-coerção
Este ano, os países da União Europeia concordaram em criar novos mecanismos de poder comercial para revidar caso parceiros comerciais usem restrições de comércio como moeda de troca política. O novo instrumento anti-coerção europeu reforça as defesas econômicas e permite que a UE imponha taxas ou outras medidas punitivas em resposta a tentativas de restrição de comércio exterior por motivações políticas.

A ferramenta ganhou importância após a China punir a Lituânia por permitir a abertura de uma missão diplomática taiwanesa na sua capital, Vilnius. As exportações do país europeu para a China caíram 75% no ano passado, após o governo chinês reduzir os laços diplomáticos e impor sanções ao comércio lituano.

Os Estados Unidos vêm pressionando a UE para endurecer o tratamento aos chineses como parte do plano de Washington para forjar uma aliança que contenha o crescimento do peso da China na economia global. Nos últimos meses, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, assumiu um tom mais assertivo sobre o assunto, dizendo que o bloco precisa “reduzir o risco” em relação à China, sem um “desacoplamento” total. A mudança no discurso preocupou companhias e países do bloco com laços comerciais profundos com a China. As montadoras alemãs Volkswagen, Mercedes-Benz and Bayerische Motoren Werke construíram dezenas de fábricas em território chinês e vendem hoje mais carros para o gigante asiático do que para qualquer outro mercado.

Controle de investimentos fora do bloco
A Comissão está avaliando novas formas de controle a investimentos de integrantes do bloco em países rivais estratégicos como a China, em setores delicados como o de semicondutores — que pode levar Pequim a deter uma indústria de produção de chips de alto nível global. Este ano, a ASML Holding NV, uma produtora holandesa de equipamentos para a produção de semicondutores acusou um ex-empregado baseado na China de ajudar a roubar informação tecnológica confidencial. O governo americano vem pedindo às autoridades europeias que unam esfoços para impedir a aquisição pelos chineses de capacidades estratégicas que botem a segurança nacional de países ocidentais em risco.

Controle da entrada de investimentos estrangeiros
No mês que vem, a regulação de subsídios externos da UE vai entrar em vigor. Com as novas regras, a Comissão Europeia terá mais poderes para impedir que competidores estrangeiros que recebem subsídios distorçam as disputas comerciais no mercado interno do bloco. A ferramenta impõe a necessidade de apresentação de relatórios e notificações a companhias envolvidas em grandes concorrências públicas ou acordos de aquisição e fusão dentro da UE. A comissão também está revendo as regras de controle de investimento externo, impostas há dois anos, e que regulam a capacidade de empresas estrangeiras investirem nos 27 países que integram o bloco.

Estratégia portuária
Até o fim do ano, o Parlamento europeu vai discutir novos limites para empresas estrangeiras interessadas em investir em áreas estratégicas de infra-estrutura. Companhias chinesas têm participação em portos de, pelo menos, 10 países da UE, o que dá a Pequim o potencial de ter acesso a informação crucial sobre as rotas de comércio de produtos europeus. A discussão sobre o tema ocorre ao mesmo tempo em que o governo alemão revê a negociação para venda de 24,9% de participação nos terminais do porto de Hamburgo para a companhia estatal chinesa Cosco Shipping Holdings.

Acordos comerciais
Autoridades europeias estão alavancando o poderio econômico de seu mercado consumidor interno equivalente a 8,6 trilhões de euros para negociar acordos comerciais que ampliem a influência europeia em economias estrangeiras estratégicas. O bloco está em processo de concluir acordos comerciais com o Chile e a Austrália que vão facilitar o acesso ao lítio — um material fundamental para a produção de baterias de carros elétricos. A Comissão também mantém conversas com o Mercosul e está lançando a iniciativa Global Gateway, um programa de investimentos de 300 bilhões de euros que tem o objetivo de competir com a Nova Rota da Seda (a iniciativa com a qual os chineses querem aumentar a entrada em países da América Latina, Ásia Central e África).

"Temos visto um endurecimento proposital da postura chinesa que agora está sendo acompanhado por aumento progressivo de ações cada vez mais assertiva" disse von der Leyen, em um discurso, no início do ano. "Assim como a China tem intensificado sua postura militar, também tem aumentado as políticas de desinformação e coerção econômica e de comércio" completou.