"Precisamos eliminar o estigma sobre epidermólise bolhosa", diz tia do menino Guilherme
Pacientes com a rara doença precisam de curativos especiais com baixa aderência à pele e de pomada importada que custa mais de R$ 140
Guilherme Gandra Moura, de 8 anos, já brinca em casa, em Itaguaí, após alta médica nesta terça-feira. E os pais, Tayane Orrinco e Estevão Moura, seguirão com o objetivo de lutar contra o estigma que atinge pacientes de epidermólise bolhosa — uma condição genética autoimune e rara que provoca graves ferimentos na pele.
Segundo Alessandra Orrinco, tia do menino, a cunhada pretende, ainda, jogar luz nas dificuldades que centenas de pessoas no país enfrentam com produtos caros, importados, ou com pomadas ainda não autorizadas no Brasil.
O creme Curafini, que alivia os sintomas da lesão, por exemplo, custa mais de 30 dólares (cerca de R$ 144). Segundo a Associação Nacional de Epidermólise Bolhosa (Debra), há mais de 800 pessoas diagnosticadas com esta condição.
— Tayane e o pai do Gui sempre disseram que têm vontade de mostrar que muitas famílias não têm acesso aos medicamentos e aos curativos. Eles têm o objetivo de eliminar estigmas e dar visibilidade à luta de quem não tem acesso a tratamento. Ela faz parte da Associação, tem contato com outras crianças com a condição... De vem em quando, vemos que algumas pessoas no país não conseguem os produtos para tratar — diz a tia, que tem 48 anos e é publicitária.
— Recentemente, soubemos de uma família de Minas Gerais que não tinha dinheiro para comprar o curativo. É um produto especial que não tem muita aderência à pele. Há itens que custam R$ 200. A nutrição também é importante. E sabemos que no país muitas famílias não têm acesso nem aos itens da cesta básica, imagina a alimentos para suplementação.
A epidermólise é uma doença rara que acomete crianças desde o nascimento e pode causar lesões no tecido externo e em mucosas de dentro do organismo. Nos Estados Unidos, sua incidência é de 20 casos para cada 1 milhão de nascidos vivos. E a condição requer uma atenção de longo prazo. É o que diz Vanessa Barroso, médica que acompanhou o menino em algumas das 23 internações num hospital da Barra, Zona Oeste do Rio.
— Além do que pode apresentar na pele, que é visível, outro desdobramento é o das lesões internas: no esôfago, na mucosa bucal. Não são áreas expostas. Gui, por exemplo, já teve lesão de esôfago. E o órgão sofreu estreitamento. Isso dificulta a alimentação, a absorção de nutrientes. Por isso, se faz necessária a gastrostomia em alguns casos — frisa a especialista, sobre um dos métodos para fortalecer a dieta do paciente, que recebe um tubo no estômago para sonda alimentar.
A doença pode causar impactos na vida do paciente, muitos deles crianças. Guilherme, após alta médica, seguirá com atendimento periódico com pediatra, dermatologista, fisioterapeutas e mais integrantes de uma equipe multidisciplinar. Esse grupo inclui, ainda, psicólogo, já que há situações em que a autoestima da criança fica abalada. A realidade do menino de Itaguaí é de amparo e assistência, diferente da que vivem outras pessoas no país. No caso do menino que emocionou milhões de pessoas no Brasil, uma peculiaridade colabora para a melhora: o otimismo.
— A família já passou por muita coisa. Antes da pandemia, Gui ficou um período sem andar. Ele usava um carrinho. E vemos que, a cada batalha, ele se supera com esse jeito cativante. Guilherme tem muita fé em Deus, é religioso. Quando as pessoas estão preocupadas, ele diz: "Deus está comigo, está no controle". No hospital mesmo, os parentes dizem que ele atrai as pessoas para perto. A energia é muito boa — conta a tia.
Em 2019, na Câmara Legislativa, o projeto de lei 2577/19 foi apresentado para viabilizar no país o Curefini. Trata-se de um creme que atua como restaurador dérmico e estimula a cicatrização das lesões. Importado, um frasco do produto custa mais de 30 dólares. Há crianças que precisam de mais de nove potes por dia.