Governo francês pede calma após distúrbios por morte de jovem em ação policial
Tumultos já deixaram 31 detidos, 24 agentes feridos e mais de 40 carros incendiados
O governo da França fez um apelo nesta quarta-feira por "calma" depois que a morte de um jovem de 17 anos atingido por um tiro da polícia provocou distúrbios em um subúrbio de Paris, além de muitas críticas de políticos e celebridades, como o astro do futebol Kylian Mbappé e o ator Omar Sy.
— Nada, nada justifica a morte de um jovem — afirmou em Marselha o presidente Emmanuel Macron, que pediu à Justiça para examinar o ato "indesculpável".
O porta-voz do governo, Olivier Véran, também pediu "calma" em um contexto de "emoção muito forte".
— As imagens sugerem que o procedimento da operação legal não foi respeitado — declarou a primeira-ministra Elisabeth Borne em uma sessão de perguntas ao governo no Senado.
A noite foi marcada por distúrbios na região de Paris, em particular em Nanterre, a oeste da capital, onde Nahel, de 17 anos, morreu na manhã de terça-feira durante uma operação de controle da polícia quando dirigia um veículo amarelo.
O balanço dos distúrbios inclui mais de 40 carros incendiados, 31 pessoas detidas e 24 policiais levemente feridos. As autoridades pretendem mobilizar 2 mil policiais na noite desta quarta-feira para evitar novos distúrbios.
— Nossa cidade acordou em choque, abalada, marcada e preocupada com esta onda de violência — disse o prefeito da localidade, Patrick Jarry, que também fez um apelo por calma e pediu "justiça para Nahel".
As forças de segurança na França são acusadas com frequência de abusos ou uso excessivo da força, como durante os protestos recentes contra a reforma da Previdência. Porém, a tragédia mais recente provocou uma onda de indignação. A França registrou 13 mortes em 2022 durante incidentes similares em operações da polícia para controlar o trânsito.
No caso de Nahel, um vídeo que circula nas redes sociais, verificado pela AFP, mostra o momento em que dois agentes apontam armas para o motorista e atiram à queima-roupa quando ele acelera com o veículo. Na gravação é possível ouvir a frase "você vai tomar um tiro na cabeça", mas não está claro quem pronuncia as palavras.
A fuga do jovem terminou alguns metros adiante, quando o carro bateu contra um poste. A vítima faleceu pouco depois de ter sido atingido por um tiro no peito.
A mãe do adolescente convocou, em uma mensagem na rede social TikTok, uma passeata em homenagem a Nahel na tarde de quinta-feira perto do local da morte.
— É uma revolta por meu filho — declarou.
"Situação inaceitável"
A morte gerou uma onda de indignação, em particular entre a oposição de esquerda, e a Assembleia Nacional respeitou um minuto de silêncio.
"A pena de morte não existe mais na França. Nenhum policial tem o direito de matar, exceto em caso de legítima defesa", tuitou o político de esquerda Jean-Luc Mélenchon.
Astros do futebol e celebridades se uniram às críticas e pediram uma "justiça digna", nas palavras do ator Omar Sy.
"Estou sofrendo pela minha França. Uma situação inaceitável", tuitou o atacante Kylian Mbappé, do Paris Saint-Germain (PSG), que expressou pêsames à família de Nahel, "um anjo que nos deixou muito cedo".
Em novembro de 2020, Mbappé reagiu à agressão que o produtor musical negro Michel Zecler sofreu de policiais em Paris. Na ocasião, o atleta denunciou uma violência "inadmissível".
Jules Koundé, jogador do Barcelona, também reagiu contra o que chamou de "novo abuso policial" e chamou a situação de "dramática".
A direita e a extrema-direita, assim como o ministro do Interior, Gérald Darmanin, também pediram respeito à "presunção de inocência" dos policiais.
O agente de 38 anos que atirou contra o jovem está sob custódia da polícia como parte da investigação de homicídio doloso por parte de um funcionário público, anunciou o Ministério Público.
O MP também abriu outra investigação pela recusa da vítima, que, segundo a imprensa, tinha ficha na polícia por atos semelhantes, a obedecer às ordens dos agentes e por tentativa de homicídio doloso contra um funcionário do governo.
A defensora do povo, Claire Hédon, também anunciou uma investigação dos fatos.
Em maio, vários países expressaram preocupação na ONU com a violência policial e a discriminação racial na França.