SÃO PAULO

O que ainda falta esclarecer no caso da palmeirense morta em briga antes de jogo contra o Flamengo

Polícia ainda busca identificar mais pessoas envolvidas no confronto e entender cronologia da confusão

Torcedora do Palmeiras Gabriela Anelli, de 23 anos - Reprodução/Redes sociais

A trágica morte de Gabriela Anielli, de 23 anos, atingida por uma garrafa durante briga entre torcedores de Palmeiras e Flamengo, no último sábado, levanta ainda uma série de dúvidas. O caso é investigado pela Delegacia de Polícia de Repressão aos Delitos de Intolerância Esportiva de São Paulo. Leia abaixo algumas questões não respondidas sobre a morte da torcedora.

Quem jogou a garrafa que atingiu Gabriela?
Leonardo Felipe Xavier Santiago, de 26 anos, foi preso em flagrante no sábado por supostamente ter sido a pessoa que arremessou a garrafa que atingiu Gabriela. Em seu depoimento registrado no boletim de ocorrência, Leonardo disse que havia apenas arremessado pedras de gelo contra os palmeirenses. Depois, segundo o delegado responsável pela investigação, César Saad, o jovem admitiu que jogou uma garrafa, mas disse que não tinha a intenção de atingir Gabriela.

Imagens que circularam nas redes sociais nos últimos dias levantaram a hipótese de que a torcedora, na verdade, foi atingida por estilhaços de uma garrafa arremessada por um palmeirense. Os vídeos estão sendo analisados pela Delegacia de Repressão e Análise aos Delitos de Intolerância Esportiva (DRADE), que ainda busca imagens que mostrem exatamente o momento em que Gabriela foi ferida. Pelo menos dez pessoas são investigadas com base nos vídeos obtidos pelos investigadores.
 

Quem identificou Leonardo?
Saad confirmou na segunda-feira que foram torcedores do Palmeiras que ajudaram a identificar o flamenguista que está preso preventivamente. Os agentes de segurança que atenderam à ocorrência o levaram para a delegacia montada dentro do estádio. Não está claro até o momento quantas pessoas, e qual o envolvimento delas na confusão, indicaram Leonardo como o autor da agressão que vitimou Gabriela.

Por que havia uma passagem na barreira metálica que separava as torcidas?
A briga em que Gabriela foi ferida ocorreu por volta de 17h30, mais de três horas antes do início da partida entre Palmeiras e Flamengo pelo Campeonato Brasileiro, marcada para às 21h de sábado. O confronto ocorreu na Rua Padre Antônio Tomás, onde há a entrada para a torcida visitante e também acesso aos camarotes usados por palmeirenses. No local é montada uma estrutura metálica para separar as duas torcidas, mas um espaço havia sido aberto para passagem de uma viatura da Guarda Civil Metropolitana (GCM), conforme registrado no boletim de ocorrência.

Os portões para acessar o estádio seriam abertos somente às 19h e a equipe da Polícia Militar que atuaria na segurança do evento estava prevista para chegar pouco antes desse horário. Assim, no momento em que ocorreu a briga, havia apenas agentes da GCM por ali. De acordo com Saad, o episódio deverá servir para revisão das estratégias de segurança de futuras partidas.

Em nota, a Prefeitura de São Paulo informou que realizou reunião na manhã desta terça-feira com representantes de clubes, torcidas organizadas, Polícia Militar e Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) com o objetivo de “definir novas estratégias e ações para reforçar as medidas de segurança no entorno dos estádios”.

Quem mais participou da confusão?
A Polícia Civil está analisando imagens para identificar, a partir de tecnologias de reconhecimento facial, mais torcedores que arremessaram garrafas durante o confronto de sábado. Investigadores foram ao Allianz Parque na segunda-feira para tentar obter novas gravações do sistema de monitoramento do estádio com esse objetivo.

Por que havia garrafas de vidro no local?
O prefeito Ricardo Nunes (MDB) afirmou nesta terça-feira que existe um termo de ajustamento de conduta (TAC) que proíbe a venda de bebidas em garrafas de vidro no entorno de estádios de futebol em dias de jogos na capital paulista. O GLOBO consultou o Ministério Público (MP-SP), que não identificou a existência desse termo. Ao “SPTV”, da TV Globo, o subprefeito da Lapa, Ismar Marcilio de Freitas Neto, também disse desconhecer essa norma.

A lei estadual n° 9.470 proíbe a venda, distribuição ou consumo de bebidas alcoólicas em arenas esportivas, proibição que se estende, “nos dias de jogos, a um raio de 200 metros de distância das entradas dos estádios e ginásios de esporte”. Na prática, porém, a venda de bebidas alcoólicas ocorre sem restrições ao redor dos estádios — inclusive com a entrega das garrafas de vidro. Na lei não há nenhum dispositivo que determine algum recipiente específico em que as bebidas possam ser vendidas.

Ricardo Nunes prometeu que a prefeitura “vai agir com rigor” na fiscalização de bares e ambulantes que atuam no entorno de estádios em dias de jogos.

— É necessária a conscientização das pessoas, que os ambulantes não coloquem as garrafas. Não haverá trégua em relação a isso. E os bares, a mesma coisa. Eles serão multados se descumprirem a regra. A prefeitura vai agir com rigor — disse o prefeito à rádio CBN.

O Globo pediu que a prefeitura indicasse qual o TAC citado por Nunes, mas não obteve resposta ao questionamento.

Como a briga começou?
Saad afirmou a jornalistas na segunda-feira que houve duas brigas entre torcedores no sábado. Gabriela foi atingida durante o primeiro confronto, no fim da tarde. Segundo o delegado, a briga ocorreu quando quatro vans com torcedores não organizados do Flamengo chegaram ao local onde havia a barreira metálica separando as torcidas. Houve troca de xingamentos seguida do arremesso de objetos entre os rivais.

Não está claro até o momento quem começou as provocações, quem invadiu primeiro o espaço do adversário e em que momento as agressões escalaram da esfera verbal para a física. Novas imagens poderão vir a ajudar a polícia a entender a cronologia do confronto.

Afinal, a briga foi entre torcidas organizadas?
O delegado responsável pelas investigações disse que a briga que resultou na morte de Gabriela envolveu torcedores comuns, em sua maioria. Havia alguns torcedores associados a torcidas organizadas — a própria jovem era sócia de uma —, mas esse aspecto não foi determinante para a confusão.

Já o segundo confronto, que ocorreu por volta de 21h15, envolvia torcidas organizadas, segundo Saad. Essa segunda briga ocorreu na Rua Palestra Itália — do outro lado do estádio em relação ao endereço do primeiro confronto.

O delegado afirmou que torcedores organizados do Palmeiras suspeitaram de alguns homens que caminhavam pelo local, próximo à entrada da sede do clube onde era realizada uma festa julina, sem a camisa do time. Esse fato levou à suspeita de que os homens seriam flamenguistas e então se iniciou um corre-corre seguido de briga entre torcedores organizados e ação repressiva do Batalhão de Choque da Polícia Militar.

Não foi informado quem eram os participantes desse segundo confronto, e nem se havia mais torcedores do Flamengo no local. Em nota, a diretoria da principal torcida organizada do Palmeiras — cuja sede fica exatamente na Rua Palestra Itália — disse que a segunda briga ocorreu às 21h15, horário em que os integrantes da torcida estavam dentro do estádio assistindo à partida.