guerra na ucrânia

Ucrânia já começou a receber bombas de fragmentação dos EUA, diz general após reunião da Otan

Novos ataques aéreos em Kiev mataram ao menos uma pessoa, no mesmo dia em que Biden visita a Finlândia, novo integrante da aliança militar

Biden e Zelensky na quarta (12) - Paul Ellis / Pool / AFP

A Ucrânia já começou a receber dos Estados Unidos as controversas bombas fragmentárias, cujo envio foi motivo de discórdia na cúpula da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), disse um general ucraniano à CNN nesta quinta-feira. Um dia após a cimeira, Moscou retomou os bombardeios aéreos em Kiev, que deixaram ao menos uma pessoa morta, enquanto o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, encerra sua viagem à Europa com uma passagem pela Finlândia, a mais nova integrante da aliança militar.

O início da entrega das bombas, contribuição anunciada na semana passada por Biden, foi confirmada pelo general Oleksander Tarnavskyi, comandante das Forças Conjuntas de Operação Tavria, uma unidade do Exército ucraniano. De acordo com ele, o alto comando militar decidirá "as áreas do território em que elas [as munições] poderão ser usadas".

"Nós acabamos de recebê-las, ainda não as usamos, mas podem mudar radicalmente [o cenário da guerra]" disse ele à CNN. "O inimigo também entende que, ao recebermos essas munições, teremos uma vantagem. O inimigo irá ceder parte do terreno onde será possível usá-las."

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Não está claro qual vantagem os armamentos poderão dar à Ucrânia e, no início da guerra, quando houve relatos de que os russos lançavam mão de tais bombas, a Casa Branca disse que, se comprovado, isso caracterizaria um "crime de guerra". Os explosivos se abrem quando são disparados, dispersando centenas de granadas menores que explodem ao entrar em contato com seu alvo. Quando não detonam no impacto, viram minas que representam um risco para os civis mesmo após os conflitos terminarem.

A Convenção das Nações Unidas sobre Bombas de Fragmentação de 2008, que veta todo o uso, produção, transferência e armazenamento de tais armas, tem a participação de 123 nações, incluindo atores de peso da Otan. Estados Unidos, Rússia e Ucrânia, contudo, nunca assinaram o tratado.

Segundo o Pentágono, as remessas que irão para a Ucrânia têm um índice de falha de 2,35% ou menos. No entanto, as bombas contêm granadas mais velhas que têm uma taxa de erro de 14% ou mais, conforme noticiado na semana passada pelo New York Times. O alto risco para civis fez com que o passo dado pelos americanos não fosse abraçado na cúpula anual da Otan que terminou na quarta em Vilna, na Lituânia.

Alemanha, Reino Unido, França, Canadá e Espanha, por exemplo, deram declarações contrárias ao envio, manifestando seu compromisso com o pacto. Washington, contudo, argumenta que são necessários pois não há mais saída para aliviar a escassez crônica de munições e equipamentos que afeta Kiev — a força-tarefa comandada pelos americanos não consegue enviar ou produzir munição no ritmo necessário para ajudar Kiev.

Para aliviar o problema, os países do Grupo dos Sete (G7), que reúne algumas das nações mais industrializadas do planeta, anunciaram durante a cúpula da Otan um instrumento para dar garantias de longo prazo para a segurança da Ucrânia.

Ele será implementado por meio de negociações bilaterais para ajudar Kiev a ter Forças Armadas "sustentáveis e capazes de defender a Ucrânia agora e deter agressões russas no futuro".

Os pontos incluem mais assistência de segurança e equipamentos militares modernos, apoio ao desenvolvimento futuro da base industrial ucraniana, compartilhamento de inteligência e apoio à ciberdefesa, por exemplo. A recepção de Kiev, contudo, foi agridoce — a intenção do presidente Volodymyr Zelensky era ir embora de Vilna com um convite formal para se juntar à Otan, o que não ocorreu.

Kiev crê que a proteção garantida pelo Artigo 5º do tratado da Otan, que versa sobre a defesa mútua — um ataque contra um seria um ataque contra todos —, seria a melhor forma de evitar futuros assaltos russos. Um grupo de nações da Otan encabeçadas pelos EUA, contudo, conseguiu impor sua vontade afirmando que seria prematuro neste momento fazer o convite formal.

Defendem que Kiev antes precisa fazer algumas reformas para garantir maiores salvaguardas democráticas, mais transparência e novas estruturas anticorrupção. Argumentavam também que o convite poderia ser visto como uma provocação exagerada à Rússia, e que a adesão neste momento se equivaleria na prática a entrar em guerra com os russos.

Zelensky de início chamou as reticências de "absurdas" e afirmou que só incentivariam Moscou a continuar com as agressões, o que levou o secretário de Defesa britânico, Ben Wallace, a afirmar que os ucranianos deveriam demonstrar mais gratidão aos esforços ocidentais. Ele chegou a comparar as demandas vindas de Kiev a uma lista de compras da Amazon. O conselheiro de Segurança Nacional americano, Jake Sullivan, fez comentários similares.

O tom foi amenizado no encerramento da cúpula, com Zelensky afirmando que as promessas do G7 abrem novas oportunidades de segurança e agradecendo nominalmente os líderes dos países. Depois, disse que sua bilateral com Biden durou duas horas mais que o previsto e abordou "todos os tópicos". O democrata, por sua vez, afirmou que a adesão ucraniana à Otan será "1h20 após o fim da guerra".

Após deixar Vilna, Biden seguiu para a Finlândia, o mais novo membro da aliança militar, que completou sua adesão em abril, abandonando 78 anos de neutralidade após a invasão russa da Ucrânia. A etapa final da viagem do americano à Europa — que começou com uma breve escala em Londres, onde se encontrou com o premier Rishi Sunak e com o rei Charles III — vem também dois dias após a Turquia anunciar que abandonaria seu bloqueio de meses ao ingresso da Suécia, cuja candidatura havia sido anunciada junto à da Finlândia em maio do ano passado.

Não há prazo definido para Estocolmo se tornar o 32º país-membro da Otan, e o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, disse que a ratificação será levada ao Parlamento de seu país em outubro. O desbloqueio, que até horas antes do seu anúncio parecia improvável — na mesma manhã de segunda, Erdogan havia inclusive imposto como condição o distante ingresso de Ancara na União Europeia —, foi um triunfo para Biden, o presidente turco e para o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg.

A já pré-agendada ida à Finlândia coroa tais esforços e têm um simbolismo importante: ocorre exatos cinco anos após o presidente Donald Trump encontrar-se pessoalmente com Putin no mesmo lugar. O tom agora é diferente, com Biden afirmando durante seu discurso que "hoje, resistimos com o grande povo da Ucrânia enquanto se defendem contra o brutal ataque russo".

"Eu faço isso há muito tempo" disse Biden, que antes de ser presidente foi senador por mais de três décadas e vice-presidente por oito anos. "Eu acho que a Otan nunca esteve mais forte."