Vitamina N: o antídoto natural contra as tensões e o estresse
Contato com a natureza ajuda a recuperar energia e promove bem-estar; especialistas dizem que basta regar as plantas ou dar uma volta uma praça para sentir os efeitos
Não é possível tomá-la em um comprimido, mas sem dúvida é algo que qualquer médico receitaria. A vitamina N, mais conhecida como vitamina natureza, não apenas nos reconecta com nossas raízes como seres humanos, mas também nos energiza, estabiliza, permite liberar tensões, aliviar o estresse, manter a saúde e nos ajuda a encontrar o equilíbrio.
Há uma frase de Mahatma Gandhi que diz: "Esquecer como cavar a terra e cuidar do solo é esquecermos de nós mesmos". Ele não estava errado, porque nós somos parte da natureza, e daí a importância de nos aproximarmos dela para nos conectarmos com nossa identidade mais profunda.
No entanto, nas grandes cidades, essa possibilidade é limitada e muitas vezes, na correria do dia a dia, as pessoas se esquecem e se afastam demais daquilo que as renova. Segundo a professora María Marta Rodríguez, responsável pela área de Ciências Naturais e Educação Ambiental do Departamento de Educação da Universidade Católica Argentina (UCA), quando se pensa na conexão com a natureza, em primeiro lugar é preciso considerar que somos natureza.
— Quando erroneamente nos dissociamos dela e a vemos como algo diferente de nós, corremos o risco de pensar que podemos esquecer dela, o que definitivamente não é verdade, nem saudável, e pode até levar à perda de identidade como seres humanos — ela afirma, e explica que a natureza fornece todos os nutrientes que formam e permitem que os seres humanos se desenvolvam, tanto a nível corporal quanto mental e espiritual.
Breve e efetivo
Segundo Gabriela González Aleman, doutora em genética do comportamento, o ambiente está intimamente relacionado ao bem-estar. No entanto, ela afirma que, contrariamente ao que as pessoas pensam, não é necessário se afastar e passar longos períodos em contato com a natureza, como viajar para a montanha, o mar ou a floresta por quinze, vinte dias ou mais, para sentir os efeitos positivos dessa conexão.
— A literatura científica tem dados contundentes: ver o verde pela janela, visitar um parque ou uma praça ou ter plantas em casa são coisas que aumentam o bem-estar por representarem uma conexão com a natureza, mesmo que seja simples e pareça pequena — esclarece.
Para explicar esse ponto, González Aleman menciona um estudo de 2013 realizado em Londres, chamado “A felicidade é maior em ambientes naturais”, de George Mackerron e Susana Mourato, no qual foram registradas as diferentes sensações de bem-estar das pessoas ao longo do dia e cruzadas com dados meteorológicos, a proximidade das pessoas com espaços verdes ou até mesmo dados sobre ruídos e a proximidade a espaços de água, também conhecidos como espaços azuis.
— Com essas escalas, eles perceberam que os dados se modificavam à medida que as pessoas transitavam por lugares que tinham, por exemplo, uma fonte de água ou por espaços verdes e ainda mais quando estavam perto de rios, presentes em muitas cidades europeias — ela explica.
Em Londres, a valorização do bem-estar proporcionado pela natureza ao ser humano é tão grande que a cidade tem uma política de aumentar o acesso ou a proximidade de espaços verdes e azuis para a população.
— Ou seja, se você não tem um parque próximo, buscarão melhorar o acesso a esse espaço verde, porque o impacto psicológico desse contato afeta diretamente o bem-estar das pessoas — acrescenta a especialista em genética do comportamento.
E ela considera que, assim como nos espaços urbanos as pessoas vão acumulando danos e desconforto gradualmente, sem perceber, por meio da poluição visual, sonora e ambiental, também não percebem o bem-estar que se acumula pelo contato com espaços verdes ou azuis, mesmo que seja mínimo.
— O bem-estar gerado contrabalança os efeitos negativos que as grandes cidades têm sobre nós — ela diz.
Portanto, é possível afirmar que existe uma relação direta entre a natureza e o bem-estar dos seres humanos. Essa é também a opinião de Rolando Salinas, chefe do serviço de saúde mental do Hospital Alemán, em Buenos Aires, e fundador do IPEM (Instituto de Prevenção em Saúde Mental), que destaca a importância do contato com a natureza para a saúde em geral. Segundo ele, há múltiplos estudos que demonstram a associação entre o contato com a natureza, saúde mental, qualidade de vida e a saúde em geral.
— Esses estudos avaliam o efeito de passar tempo na natureza nos níveis de hormônios do estresse, escalas de avaliação da qualidade de vida pelos participantes, presença de diversas doenças, especialmente as relacionadas ao sistema cardiovascular, como a hipertensão arterial, ao sistema metabólico, como a diabetes, ou a saúde mental, e chegam até a patologias inesperadas, como a incidência de câncer ou doenças autoimunes — ele explica, e afirma que, em todos os casos, o vínculo das pessoas com a natureza tem um efeito positivo sobre essas variáveis.
Programa de reconexão
Nesse sentido, María Marta Rodríguez considera que perder a identidade natural tem consequências graves que deveriam acender alertas e levar à reflexão.
— Dentre essas consequências, podemos encontrar uma vida em aceleração permanente, com ritmos biológicos alterados devido à transição de hábitos marcados pela luz do sol (dia e noite) para hábitos marcados pelos ponteiros do relógio ou pelas telas, o que provoca alterações no sono e nos hormônios, levando a estados de humor flutuantes, muitas vezes ligados à depressão ou ansiedade — explica.
Nesse "programa de reconexão", além do exercício ao ar livre, passear, caminhar e brincar em praças, também é possível trabalhar com a comunidade na recuperação de espaços verdes, além de incorporar comportamentos que envolvam o cuidado com a natureza.
— Pensando no impacto que nossas ações têm nos ambientes naturais, seria benéfico implementar a separação de resíduos, o cuidado com o consumo de água, caminhar em vez de ir de carro para lugares próximos. E, em geral, qualquer hábito ecológico que nos permita pensar em nós mesmos como parte da natureza e a natureza como parte constituinte de nossa identidade — afirma a coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental da UCA.
Quanto tempo deve se dedicar a se conectar com a natureza? Salinas adverte que em um estudo publicado na revista Scientific Reports, foi avaliado o tempo de permanência na natureza necessário para produzir efeitos benéficos, concluindo que deve ser de pelo menos 120 minutos por semana. Para o chefe do serviço de saúde mental do Hospital Alemán, alguns conselhos seriam:
Buscar todo o contato possível com espaços verdes e tentar que seja em condições de tranquilidade que permitam uma imersão psicológica.
— Se a pessoa não mora perto de áreas verdes, mas pode fazer jardinagem em sua varanda ou terraço, isso ajudará a viver com melhor saúde — acrescenta. — Não pense que viver em contato com a natureza pode ser substituído por produtos naturais. Isso não tem nada a ver com consumo, pelo contrário — enfatiza.
Sem grandes pretensões, para aqueles que vivem na cidade, essas pequenas doses frequentes de verde se tornam indispensáveis e, por menores que sejam, podem fazer a diferença ao se conectar com sua essência e restaurar o equilíbrio. González Aleman concorda que até mesmo um vínculo simples com a natureza pode fazer diferença no bem-estar, como ter plantas, observar seu crescimento, entrar em contato com sua textura e seus aromas, por exemplo.
— Mesmo que não façamos isso conscientemente, regar ou mexer na terra tem efeitos a nível corporal relacionados à liberação de serotonina, um hormônio que contribui para aumentar os estados duradouros de bem-estar a longo prazo — ele afirma.
De diferentes maneiras, a conexão com a natureza ativa os hormônios relacionados à felicidade e alegria, como a endorfina, serotonina e dopamina, a nível cerebral.
— Se conspiramos contra os ambientes verdes, biologicamente poderíamos dizer que estamos conspirando contra nossa própria felicidade. O contato com a natureza amplia nossas possibilidades de nos sentirmos bem e liberar esses três hormônios — acrescenta.
Outro aspecto relevante dos espaços naturais nas grandes cidades é que eles convidam ao compartilhamento com outras pessoas, passar tempo com parceiros, filhos, família, amigos, socializar, e tudo isso está intimamente relacionado ao bem-estar geral.
É por isso que, como descreve a nutricionista Verónica Irei, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Aliança de Cidades Saudáveis promovem políticas públicas nas grandes cidades em consonância com o compromisso com a saúde e o bem-estar de seus habitantes.
— O design de áreas de lazer e parques que promovem a atividade ao ar livre, com espaços de luz e sombra, lugares de descanso e hidratação que atendam às necessidades de todas as idades contribui para promover a saúde e o bem-estar de uma comunidade — ela explica.
Para González Aleman, claramente, essas políticas poderiam ter um impacto direto sobre as populações no futuro.
— Gradualmente, o aumento de espaços verdes e azuis ou a melhoria no acesso a eles nos permitiria criar uma sociedade mais feliz, mais pacífica e mais conectada — ele conclui.
Expor-se ao sol, fundamental para o bem-estar físico e emocional
Nos espaços naturais da cidade, as pessoas podem ter contato direto com o sol, um grande aliado para a saúde física e mental.
— A exposição solar de forma responsável estimula a produção de vitamina D na pele, um nutriente essencial para a saúde óssea e a prevenção da osteoporose. Mas também, essa vitamina é importante para o adequado funcionamento do nosso sistema imunológico e a saúde cardiovascular, por isso a importância de dedicar tempo para ficar ao ar livre e, se for em um lugar como um parque ou praça, melhor — explica Verónica Irei.
Um exemplo concreto dos efeitos da falta de contato com o ar livre é observado nos idosos, com pouca ou nenhuma atividade ao ar livre e, consequentemente, uma produção inadequada de vitamina D, o que afeta diretamente sua saúde.
— Promover uma exposição adequada ao sol, atividades ao ar livre e contato social é fundamental para o bem-estar físico e emocional em qualquer fase da vida — conclui a nutricionista.
Rotinas saudáveis
Rever hábitos alimentares. Rever alguns hábitos pode ajudar a mudar a conexão com a natureza. Nesse sentido, de acordo com María Marta Rodríguez, é necessário repensar os costumes alimentares e analisar quantos produtos processados são consumidos diariamente e começar aos poucos a substituí-los por produtos naturais com menor intervenção humana.
Limitar o uso de dispositivos tecnológicos. Também é importante controlar o consumo de tecnologia e estabelecer um limite de tempo para o uso de dispositivos. Por exemplo, evitar o uso de telas quando se está em família porque eles também são natureza e vitamina para nós, diz Rodríguez.
Realizar atividades ao ar livre. Por sua vez, Verónica Irei destaca a importância de incorporar na rotina atividades ao ar livre, que contribuem para a saúde das pessoas. Atividades físicas realizadas em um ambiente verde promovem um peso saudável e reduzem os níveis de estresse, contribuindo para o bem-estar geral.