China

Sumiço de chanceler chinês alimenta rumores sobre sua saúde e põe em cheque diplomacia

Antes de 'desaparecer' por três semanas, Qin Gang se encontrava, ligava ou trocava informações publicamente com seus homólogos estrangeiros quase todos os dias

O chanceler chinês, Qin Gang, em entrevista a jornalistas - AFP

O chanceler da China, Qin Gang, está "desaparecido" há mais de três semanas, faltando a compromissos importantes e gerando especulações sobre seu paradeiro e sobre sua saúde. Apesar do Ministério das Relações Exteriores da China afirmar que as atividades diplomáticas do país estão correndo normalmente, a ausência do ministro é amplamente notada sobretudo porque Qin mantinha uma agenda bastante movimentada desde que assumiu o cargo em dezembro de 2022.

Na semana passada, Qin faltou a um encontro de países da Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean), em Jacarta, Indonésia, devido a "motivos de saúde". Na ocasião, o chanceler foi substituído por Wang Yi, diretor do escritório geral do Comitê Central de Relações Exteriores, um cargo mais alto na hierarquia do Partido Comunista Chinês (PCC). O Ministério das Relações Exteriores da China não deu mais detalhes sobre o assunto.

Além disso, o ministro também tinha um encontro marcado neste mês com o chefe da diplomacia da União Europeia (UE), Josep Borrell, em Pequim, mas a reunião foi adiada sem explicações.

De acordo com o site do Ministério, as últimas reuniões públicas de Qin foram em 25 de junho, com autoridades do Sri Lanka e da Rússia. Antes de seu "sumiço" de três semanas, porém, o chanceler se encontrava, ligava ou trocava informações publicamente com seus homólogos estrangeiros quase todos os dias.

Contudo, ao ser questionada sobre a ausência do chanceler, a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Mao Ning, afirmou, nesta segunda-feira, não ter informações sobre o assunto.

Desaparecimentos abruptos de altos funcionários chineses da vida pública são frequentemente vistos como sinais potenciais de problemas, mas, até então, o governo tem se mantido em silêncio — o que só alimenta as especulações, podendo também atrapalhar os esforços da China de fortalecer sua diplomacia e aliviar as tensões com as potências ocidentais.

Qin teve um rápido avanço em sua carreira, passando de porta-voz do Ministério das Relações Exteriores para embaixador da China nos Estados Unidos em 2021, e posteriormente sendo promovido a ministro das Relações Exteriores, em 2022. Antes de assumir a função, ele teve um papel importante na organização de viagens ao exterior para os líderes chineses, o que lhe permitiu trabalhar em estreita colaboração com o presidente chinês, Xi Jinping, que o tem como um nome de confiança.

Como chanceler, Qin tem sido o responsável por implementar a visão de Xi de uma China cada vez mais confiante como potência global. Em junho, Qin se reuniu por mais de cinco horas com o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, durante visita a Pequim, buscando amenizar as crescentes tensões entre os dois países.

Sigilo é comum no PCC
O sigilo sobre a vida pessoal e a saúde de altos funcionários está arraigado no Partido Comunista Chinês (PCC). Em uma das ausências mais notáveis e ainda inexplicadas dos últimos tempos, Xi desapareceu abruptamente da vista do público por duas semanas, pouco antes de assumir o poder em 2012, perdendo uma reunião com a então secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton.

Apesar de ser plausível que Qin esteja apenas se recuperando de algum problema de saúde, especialistas acreditam que o episódio seria um exemplo de como a aversão do partido a compartilhar más notícias pode minar seus esforços para controlar a narrativa.

— O sigilo é o modo de operação escolhido porque, para o Partido Comunista Chinês, a informação é uma arma — disse ao New York Times Willy Wo-Lap Lam, membro sênior da Jamestown Foundation, um instituto de pesquisa em Washington. — Mas, neste caso, o mistério em torno de um funcionário tão importante é incompreensível.

Além disso, caso Qin de alguma forma tenha entrado em conflito com a liderança do Partido Comunista, isso também poderia refletir mal em Xi, que usou seu domínio para acelerar a ascensão do chanceler, acredita Lam.

Comentaristas chineses no exterior também têm especulado sobre o rumor de um caso amoroso de Qin com uma personalidade da televisão como motivo de seus problemas, o que tem gerado grande repercussão, especialmente em Taiwan. O próprio meio político chinês também está envolvido nas discussões, segundo Deng Yuwen, ex-editor de um jornal do Partido Comunista e atual comentarista de assuntos atuais nos Estados Unidos.

— Mesmo que ele tenha um problema de saúde, eles podem encontrar uma maneira de trazê-lo de volta, mas ainda não o fizeram — disse Deng ao NYT. — Se o mundo exterior está especulando sobre Qin Gang, então, naturalmente, muitas pessoas dentro do sistema também estão se perguntando o mesmo. (Com New York Times.)