Kevin Spacey é um homem 'acostumado a conseguir o que quer', afirma promotora, ao fim de julgamento
Ator é acusado por agressões sexuais que culminaram em violações de 'autonomia corporal'; caso se encerra na quinta-feira, quando júri dará veredicto
Está chegando ao fim o julgamento de Kevin Spacey, acusado por cometer uma série de agressões sexuais. Após longas quatro semanas no banco dos réus — no Tribunal da Coroa de Southwark, em Londres, na Inglaterra —, o ator de 63 anos viu, enfim, a advogada da promotoria entregar suas declarações finais ao júri na tarde desta quarta-feira (19). O depoimento derradeiro do artista será dado, por meio de seu advogado, na próxima quinta-feira (20), antes que o júri seja convidado a se retirar para chegar, enfim, a um veredicto.
Nesta quarta-feira, diante do posicionamento da promotoria acerca do caso, Spacey assentiu e balançou a cabeça enquanto a advogada Christine Agnew fazia seu discurso. As supostas vítimas do artista, ressaltou — ao júri — a representante da promotoria, são "quatro homens desconhecidos entre si que fizeram uma série de acusações contra outro homem (no caso, Spacey)". Em outro trecho de sua fala, a advogada reforçou que este não é simplesmente um caso de "força em números".
"Quatro homens diferentes, que contaram a amigos e familiares o que aconteceu com eles, depois relataram o mesmo à polícia e foram ao tribunal para prestar depoimento sobre suas histórias", prosseguiu a advogada. "Todos eles são motivados por 'dinheiro, dinheiro, dinheiro', como foi dramaticamente defendido pelo réu (Kevin Spacey) em seu depoimento? Ou eles já tiveram o suficiente e não estão mais à vontade para serem os 'guardiões do segredo' de alguém que os tratou tão mal?", questionou ela.
Agnew acrescentou que não se trata de uma questão insignificante para um reclamante dirigir-se a um tribunal, sobretudo para fazer alegações contra outro ser humano, "especialmente quando essa pessoa é uma celebridade", como frisou. "O brilho dos holofotes quando alguém é famoso internacionalmente coloca outro fardo (sobre quem faz a denúncia)", destacou a advogada da promotoria. "Kevin Spacey Fowlery é e foi um homem poderoso. Famoso. É um homem acostumado a conseguir o que quer. Quem iria acreditar nas outras pessoas? Isso poderia ter arruinado suas vidas", sugeriu.
Como se sabe, o ator — duas vezes vencedor do Oscar — está sendo julgado por um total de 12 acusações de assédio sexual e atentado ao pudor feitas por quatro homens. Os acusadores, que já foram ouvidos pelo tribunal, não tiveram suas identidades reveladas porque a legislação britânica proíbe que nomes de vítimas de violência sexual sejam publicados.
Nesta quarta-feira (19), a advogada que representa a promotoria afirmou que as acusações não se referiam "apenas a um beijo, a um toque ou a um aperto fugaz na virilha", mas faziam menção a violações da "autonomia corporal" das supostas vítimas.
De maneira enfática, a autoridade sublinhou que, só porque os reclamantes são homens, isso não significa que eles devessem tolerar um número maior de toques indesejados. "A sociedade, possivelmente em 2023, é mais solidária com as mulheres do que com os homens nessas circunstâncias", ponderou Agnew. "Mas por que esses homens deveriam tolerar tudo o que aconteceu?", questionou ela.
Astro de filmes como "Beleza americana" (1999) e "Os suspeitos" (1995), o ator se declara inocente de todas as acusações e sustenta que pretende retomar a carreira após o julgamento. Em 2022, um tribunal de Nova York, nos EUA, o inocentou de uma acusação de abuso sexual feita pelo também ator Anthony Rapp, seu colega na série "House of cards" (2013-2018).
De acordo com a representante da promotoria, durante uma das sessões de interrogatório do atual julgamento, uma das supostas vítimas foi questionada por Patrick Gibbs, advogado de Kevin Spacey, se havia ficado "lisonjeada" com as investidas do ator. Agnew ressaltou que tal pergunta jamais teria sido feito a uma mulher. "Quando alguém diz 'não', quer dizer não", frisou Agnew. "Não importa o que eles estejam vestindo ou como eles reajam aos avanços indesejados", complementou.
Elton John entra no caso
A advogada admitiu que teve seu próprio "momento de estrela" ao interrogar Elton John, que participou do julgamento como testemunha de defesa de Kevin Spacey, ao lado do marido David Furnish. A representante da promotoria revela agora que instou o júri a desconsiderar as evidências trazidas pela dupla, questionando a real importância acerca do que eles "trouxeram para o caso".
Um dos homens que acusam Kevin Spacey conta que o ator teria cometido assédio contra ele a caminho da casa de Elton John. Em seu depoimento, Elton informou que Spacey compareceu, de fato, a um dos bailes que promove — e que o colega teria dormido em sua residência. O cantor, no entanto, disse não se lembrar ou reconhecer o acusador.
"Não se deixe levar pelo brilho e pela fama", alertou Agnew. "O próprio senhor Elton disse que, se fosse a rainha na frente dele, provavelmente não a teria visto porque estava com a cabeça baixa (ao se dirigir para o carro após sair do local em que estava)", completou a advogada.
"Você pode ter sido um fã do réu, você pode ter ouvido falar mal dele", disse Agnew ao fim de seu discurso. "Mas tudo isso agora desaparece". "Trata-se de poder e tirar proveito desse poder", acrescentou, sustentando que os argumentos da defesa são tão "frágeis" quanto uma "casa de palha".
Spacey, ela concluiu, é apontado por "comportamento agressivo, opressivo e intimidatório que finalmente foi denunciado". O ator vinha enfrentando 12 acusações por agressão sexual — e se declara, até o momento, inocente em todos os casos. Três dos processos foram retirados da Justiça na manhã desta quarta-feira (19). O fato, no entanto, não pode interferir no andamento do julgamento, como reforça o juiz. Na próxima quinta-feira (20), o advogado de Kevin Spacey fará sua declaração final antes que o júri seja convidado a se retirar para chegar, enfim, a um veredicto.