Lira nega censura e quer direito de se defender após pedir para censurar matérias sobre ex mulher
Na semana passada, organizações de defesa do jornalismo emitiram nota de repúdio à tentativa de censura Agência Pública, ICL Notícias e Congresso em Foco
Após ter pedido na Justiça a censura de reportagens jornalísticas que citam investigações contra si, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou nesta segunda-feira que se valeu do "direito de se defender" de informações que chamou de "inverídicas".
No último mês, Lira promoveu uma ofensiva contra reportagens e meios de comunicação para tirar do ar conteúdo tratando de entrevista da ex-esposa do deputado, Jullyenne Cristine Santos, que o acusa de violência sexual supostamente ocorrida em 6 de novembro de 2006, e de investigações da Polícia Federal.
Questionado pelo Globo sobre o assunto em uma coletiva de imprensa nesta segunda, em um evento do Lide, em São Paulo, Lira interrompeu a pergunta e disse:
— Eu não censurei nada, amigo. Eu sou contra censura. Mas uma coisa que é inverídica, que já foi julgada no Supremo Tribunal Federal, você querer requentar e fazer uma mídia em cima disso, qualquer um de nós tem o direito de se defender. O que eu pedi é que a gente respeite, por favor, as coisas que já foram julgadas e reconhecidas como inverídicas — declarou.
Na semana passada, organizações de defesa do jornalismo, como a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e a Repórteres Sem Fronteiras (RSF), entre outras, emitiam nota de repúdio à tentativa de censura. Os veículos Agência Pública, ICL Notícias e Congresso em Foco foram alvo do deputado.
No caso do ICL, Lira mirou conteúdos divulgados no dia 6 de junho em que os jornalistas do canal abordaram uma investigação em curso sobre um suposto esquema de desvio de recursos públicos na compra de kits de robótica em escolas de Alagoas. A apuração da Polícia Federal atingiu Luciano Ferreira Cavalcante, aliado e assessor de Lira.
A ação protocolada pelo presidente da Câmara também tem como alvo sua ex-mulher, Jullyene Lins, que em entrevista ao ICL Notícias veiculada no mesmo dia fez uma série de acusações contra Lira. O pedido de remoção de conteúdo atingiu ainda falas dos jornalistas sobre o arquivamento de uma investigação contra o parlamentar pelo Supremo Tribunal Federal (STF) também no dia 6 do mês passado.
O caso arquivado tinha como ponto central a acusação de recebimento por Lira de R$ 106 mil em propina, por meio de um assessor, em troca de uma indicação na Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), órgão vinculado ao Ministério das Cidades.
Organizações repudiam ofensiva
Leia trecho da nota de repúdio publicada por organizações de defesa do jornalismo:
"Depois de ver negadas medidas liminares para retirar conteúdo da Agência Pública e do programa ICL Notícias, o deputado federal obteve decisão favorável para remoção de texto publicado pelo Congresso em Foco, proferida pelo juiz Jayder Ramos de Araújo, da 10ª Vara Cível de Brasília."
"Em todos os casos, as reportagens tratam de entrevista da ex-esposa de Lira, Jullyene Cristine Santos, que acusa o ex-marido de violência sexual supostamente ocorrida em 6 de novembro de 2006. Naquela ocasião, Lira foi absolvido de acusação de Jullyene de agressão física, mas a ex-esposa não o teria acusado de violência sexual, o que veio a fazer na entrevista da Agência Pública em junho passado."
"Para as organizações abaixo assinadas, é inadmissível que o presidente da Câmara dos Deputados atente contra a liberdade de imprensa por trazer à luz denúncia de interesse público sobretudo em tema sensível à sociedade como é o caso da violência sexual e da violência doméstica."
"É preocupante que, depois de dois magistrados terem reconhecido a relevância da publicação das denúncias, sobrevenha uma terceira decisão que acolha a argumentação do parlamentar, prejudicando a atividade de um veículo de comunicação que simplesmente exerceu não só o seu direito, mas também o seu dever de informar a sociedade."