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Militares golpistas do Níger se negam a receber delegação regional aumentando tensão no país

"Secretário de Estado do EUA defende que diplomacia é a melhor maneira de resolver a crise e acusa grupo paramilitar Wagner de se aproveitar da instabilidade após

Protestos em Níger - AFP

Os líderes do golpe no Níger desafiaram, nesta terça-feira, o bloco da África Ocidental (Cedeao) e afirmaram, em carta, que o país não poderá receber uma missão de representantes dos países do bloco que visitaria o país na quinta-feira. Enquanto cresce a tensão no país, o secretário de Estado dos EUA, Anthony Blinken, defendeu que a diplomacia é a melhor maneira de resolver a crise e acusou o grupo Wagner de estar se aproveitando da instabilidade após golpe.

"Acho que o que aconteceu e continua a acontecer no Níger não foi instigado pela Rússia ou por Wagner, mas cada lugar que esse grupo de Wagner esteve, a morte, a destruição e a exploração o seguiram" disse Blinken. "É uma repetição do que aconteceu em outros países, onde eles trouxeram apenas coisas ruins em seu rastro. A insegurança aumentou, não diminuiu."

Em uma carta, divulgada nesta terça, a junta militar informou a Cedeao que não poderia receber uma delegação do bloco regional, alegando razões de segurança devido ao que caracterizou como "raiva generalizada entre a população nigeriana após as sanções impostas". Há uma semana, a Cedeao deu aos novos governantes militares do Níger, o Conselho Nacional de Salvaguarda da Pátria (CNSP), um prazo de sete dias para se retirarem ou enfrentarem uma possível intervenção militar.

“O atual contexto de raiva e revolta da população na sequência das sanções impostas pela Cedeao impossibilita o acolhimento desta delegação com a necessária serenidade e segurança”, escreveu o Ministério dos Negócios Estrangeiros do Níger, numa carta dirigida ao representante do bloco no país.

Na noite de segunda-feira, os militares golpistas nomearam Ali Mahaman Lamine Zeine como o novo primeiro-ministro do país em um comunicado lido em rede nacional.

No domingo, os militares anunciaram o fechamento do seu espaço aéreo. A medida foi divulgada minutos antes do término do prazo do ultimato estabelecido pelo bloco da África Ocidental (Cedeao) para que o país retorne à democracia e o poder seja devolvido ao presidente democraticamente eleito, Mohamed Bazoum, deposto pela sua própria guarda em 26 de julho.

Em outro comunicado, o CNSP disse que houve um "desdobramento anterior para a preparação da intervenção em dois países da África Central", sem especificar quais. "Qualquer Estado envolvido será considerado cobeligerante", advertiu.

Ameaça para a sub-região
As fronteiras terrestres e aéreas do Níger com cinco países vizinhos — Argélia, Burkina Faso, Líbia, Mali e Chade — foram reabertas em 2 de agosto, quase uma semana após terem sido fechadas durante o golpe de Estado. Dois dos países vizinhos, Nigéria e Argélia, são favoráveis a uma solução diplomática.

O presidente da Costa do Marfim, Alassane Ouattara, também pediu neste domingo aos líderes do golpe que desistam.

"Condenamos a tentativa de golpe no Níger, que representa uma séria ameaça à paz e à segurança da sub-região" disse.

Nas ruas do bairro de Boukoki, na capital Niamei, os moradores mostraram-se relutantes diante da perspectiva de uma intervenção armada.

"Vamos lutar por esta revolução. Não vamos recuar perante o inimigo, estamos determinados" declarou um morador, Adama Oumarou, acrescentando que eles tinham "esperado muito tempo por esse golpe".

"Fora França!"
Cerca de 30 mil partidários dos generais se reuniram neste domingo em um estádio em Niamei para expressar seu apoio e ouvir uma delegação do CNSP.

No local, foram aclamados e cercados por uma multidão entusiasmada, de acordo com repórteres da AFP. O general Mohamed Toumba, o terceiro no comando, tomou a palavra para denunciar aqueles que "espreitam nas sombras" e que estão "conspirando para a subversão" contra o "progresso do Níger".

"Hoje é o dia da nossa verdadeira independência!" gritou um jovem, enquanto a multidão ao seu redor gritava "Fora França, fora Cedeao!".

O golpe foi condenado por todos os parceiros ocidentais e africanos do Níger, mas o Exército nigerino recebeu o apoio de seus pares no Mali e Burkina Faso, que também chegaram ao poder por meio de golpes em 2020 e 2022, respectivamente, e lutam contra a violência jihadista.

Perspectiva incerta
A França anunciou na noite deste domingo a suspensão "até novo aviso" de todas as suas "ações de ajuda ao desenvolvimento e apoio orçamentário" em Burkina Faso. Paris apoia os países da Cedeao em seus esforços para restaurar o presidente Bazoum, que foi preso após o golpe.

No entanto, a perspectiva de uma intervenção militar por parte dos países da África Ocidental ainda é incerta. Os senadores da Nigéria pediram no sábado ao presidente Bola Tinubu para "fortalecer a opção política e diplomática". A Argélia, que não faz parte da Cedeao, mas compartilha quase mil quilômetros de fronteira com o Níger, também expressou suas reservas no sábado à noite.

As relações entre os militares que assumiram o poder e a França, antiga potência colonial, se deterioraram nos últimos dias.

Na quinta-feira, eles se retiraram dos acordos de cooperação no campo da segurança e defesa com a França, que mantém um contingente militar de 1.500 soldados no Níger para a luta antijihadista.