FACÇÕES

Novas rotas de narcotráfico na região aproximaram Equador dos carteis mexicanos

Quase um terço da cocaína colombiana sai da América do Sul em direção aos Estados Unidos por portos equatorianos

Bandeira do Equador - Pixabay

O assassinato do candidato presidencial do Equador Fernando Villavicencio, na noite de quarta-feira (9), pôs em evidência o pequeno país latino-americano, antes conhecido por sua relativa segurança, se comparado aos países vizinhos, e pela economia estável e dolarizada. Mas a crise de insegurança que culminou com o crime não é novidade: é resultado, entre outras razões, da reconfiguração das rotas de tráfico na região. Hoje, quase um terço da cocaína colombiana sai da América do Sul em direção aos Estados Unidos por portos equatorianos.

Segundo autoridades equatorianas, as duas maiores facções criminosas do país, Los Choneros e Los Lobos, são apoiadas financeiramente e recebem armas de dois carteis mexicanos, respectivamente: o Cartel de Sinaloa e o Cartel Jalisco Nova Geração (CJNG), que disputam o controle das rotas de cocaína no Equador. Nos últimos meses, autoridades equatorianas descobriram laboratórios de processamento da droga no país, indicando uma possível evolução das facções locais para o que as autoridades chamam de "microcartéis".

Localizado entre Colômbia e Peru, os dois maiores produtores de coca na região, o Equador era historicamente um centro de trânsito de drogas. Mas o acordo de paz com as antigas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) acabou empurrando dissidentes do grupo guerrilheiro envolvidos com o narcotráfico para o país vizinho, principalmente através da cidade fronteiriça de Esmeraldas.

Com isso, nos últimos cinco anos, os cartéis mexicanos assumiram um papel mais importante no negócio e subcontrataram grupos locais. Um ponto que favoreceu a nova configuração das rotas do tráfico transnacional é a dolarização da economia equatoriana, adotada em 2000, que juntamente com os fracos controles financeiros tornaram o país um local ideal para a lavagem de dinheiro do tráfico.

Segundo Glaeldys González, especialista do International Crisis Group, oito organizações criminosas disputam hoje o controle de partes da cadeia de abastecimento e se enfrentam com frequência. A polícia, por sua vez, atribui 80% dos assassinatos do ano passado a confrontos entre grupos criminosos que competem pelo controle da distribuição e da exportação de drogas, principalmente cocaína.

Quem é Los Lobos?
Por muitos anos, Los Choneros, braço do Cartel de Sinaloa no Equador, foi considerada a facção dominante no país, mas o fim de sua hegemonia em 2020, com a morte de seu líder Jorge Luis Zambrano, conhecido como "Rasquiña", deixou o caminho aberto para Los Lobos — que reinvidacaram o assassinato de Villavicencio — a assumirem o controle de uma poderosa federação de gangues, incluindo Los Tiguerones e Los Chone Killers, e competir pelo controle das prisões no Equador e pelo tráfico de drogas.

Hoje, a facção é apontada pelo observatório InSight Crime como o segundo maior grupo criminoso do país, com mais de 8 mil membros distribuídos nas prisões equatorianas. E desde 2016, Los Lobos e seus aliados fornecem armas e segurança para o cartel mexicano CJNG. Por isso, Los Tiguerones, Los Chone Killers e Los Lobos se autodenominam coletivamente como a Nova Geração.

Em fevereiro de 2021, a Nova Geração coordenou ataques contra os líderes regionais dos Los Choneros, tendo como alvo dois potenciais sucessores. Ambos conseguiram sair vivos, mas as disputas deixaram 80 presos mortos. Nos últimos anos, o grupo esteve envolvido em vários massacres sangrentos em presídios, que deixaram mais de 315 presos mortos só em 2021, e atua principalmente com tráfico de drogas e mineração ilegal. Los Lobos também se tornou muito ativa na indústria de mineração ilegal.

O desmonte de importantes estruturas de segurança a partir de 2017 explica em parte o aumento sem precedentes das taxas de homicídio no Equador, que passaram de 5,6 por 100 mil habitantes em 2017, para 20 homicídios por 100 mil habitantes em 2021. Isso aproxima o país do Brasil, que, com uma taxa de homicídios de 22,3 por 100 mil habitantes registradas naquele ano, é o segundo país mais violento da América do Sul, depois da Venezuela (taxa de 40,9 por 100 mil em 2021, segundo o Observatório Venezuelano da Violência).

Após novos dias de tumultos, que deixaram 68 presos mortos em novembro, as autoridades equatorianas apontaram o envolvimento de cartéis mexicanos na violência desenfreada nas prisões do país.

A onda de violência não parou ao longo de 2022, com um confronto sangrento entre Los Lobos e uma gangue menor, conhecida como R7. Em maio, 44 foram mortos em um massacre na prisão de Bellavista, perto de Quito. Alexánder Quesada, vulgo "Ariel", líder de Los Lobos, ordenou o ataque ao líder da quadrilha rival do R7, Marcelo Anchundia.

O presidente Guillermo Lasso, com baixa popularidade desde a pandemia, inicialmente reagiu à onda de violência com uma série de decretos de estados de exceção, medida que têm um alcance apenas pontual. Em maio, com desaprovação de quase 80%, anunciou uma medida extrema: usando um mecanismo constitucional conhecido como "morte cruzada", o presidente dissolveu a Assembleia Nacional e convocou novas eleições, que acontecem no dia 20.