"Retratos fantasmas" tem pré-estreia lotada no Teatro do Parque, no Recife
O documentário de Kleber Mendonça Filho chegará ao circuito comercial de cinema no próximo dia 24 de agosto
O mais novo longa do realizador pernambucano Kleber Mendonça Filho repetiu o feito de seus últimos trabalhos: levar grande público ao cinema em sua sessão de pré-estreia. Na noite desta segunda (14), o Teatro do Parque, no centro do Recife, era puro frisson para a primeira exibição no Recife de “Retratos fantamas”, documentário escrito e dirigido por Kleber.
“Retratos fantasmas” teve estreia mundial em abril, no prestigiado Festival de Cannes, na França, dentro da itinerância habitual do circuito de festivais. O longa já está inscrito em mais de 30 deles. No último sábado (12), teve sua primeira exibição em solo brasileiro, no Festival de Gramado. A estreia comercial em todo o Brasil acontece no próximo dia 24 de agosto. Kleber já antecipou que “Retratos fantasmas” tentará a vaga para ser concorrente brasileiro ao Oscar.
As primeiras pessoas chegaram por volta das 17h para dar início à fila – para a sessão que começaria às 19h; outra sessão estava marcada para as 21h. Os ingressos haviam se esgotado em minutos na pré-venda online.
No filme, que foi sendo construído ao longo de sete anos, Kleber atravessa, numa junção entre suas memórias e os registros delas (em fotos e vídeos), parte da história dos cinemas de rua que, em outros tempos, atraíram multidões no Recife e, também, como o avanço da sociedade os transformou em ruínas.
"O filme não teve roteiro. O roteiro foi sendo construído, aos poucos, na montagem", contou Kleber, antes da exibição. O diretor aproveitou para reiterar a importância da volta do Cinema São Luiz, que também "estrela" o filme e está fechado para reformas.
Recife de dentro pra fora
Antes de "Retratos fantasmas" foi exibido o curta "Recife de dentro pra fora", documentário de Kátia Mesel. O trabalho de 1997, inspirado no poema "Cão Sem Plumas", de João Cabral de Mello Neto, passou por recente processo de digitalização pela CinemaScópio Produções, de Kleber e Emilie Lesclaux.
"Emociante ver a exibição desse filme com a plateia completa desse jeito", disse Kátia, ao ser convidada ao palco por Kleber. "Quero agradecer a vocês por fazerem esse resgate da minha obra, porque eu trabalho com a memória e, de repente, essa memória vai sumindo", agradeceu. "O cinema brasileiro e pernambucano está passando por uma fase muito incrível porque estão prestando atenção à preservação de nossos materiais fílmicos, porque as mídias passam, mas o nosso trabalho, não".
Pós-sessão
Após mexer com a memória de muita gente na casa dos 35+, que ainda alcançou alguns dos cinemas que aparecem no filme, uma surpresa após a primeira sessão: os passistas de frevo Guerreiros do Passos dançaram encantaram o público do lado de fora, na Rua do Hospício, em frente ao Teatro do Parque, enquanto outra fila já sinalizava para a sessão seguinte, a das 21h.
A advogada e museóloga Suanny Pimentel, 32 anos, não chegou a conhecer os cinemas mostrados no filme (com exceção do São Luiz), mas, por influência dos pais, sabe identificar, no centro do Recife, onde ficava cada um. Ela ainda estava em êxtase após a exibição de "Retratos fantasmas".
"É como revisitar a nossa própria história", conta ela, ao lembrar que, muitas vezes, foi ao Cinema São Luiz para aguardar o esfriamento do horário de pico, no que também aproveitava para contemplar o Rio Capibaribe. "Eu fiquei extremamente emocionada – e quis chorar – em diversos pontos do filme de Kleber e no de Kátia, por ver a modificação do Recife em vários espaços em tão pouco tempo", disse Suanny. "Tudo nesse filme conversa com a sociedade, pois está tudo atrelado: arte, poder, dinheiro e o que é valorizado pela sociedade atual, a mobilidade, a segurança pública".
Nathália Nascimento, 31 anos, é engenheira ambiental e sanitarista. Nascida no Rio de Janeiro (RJ), passou parte da vida em Maceió (AL) e mora no Recife há três anos. "Esse filme mostrou, pela visão dos cinemas, o quanto é difícil resistir nessa cidade", comentou ela sobre o fim dos cinemas de rua, processo que acontece também em outros territórios. "Eu observei isso em Maceió também e vejo no Rio, quando vou lá. Esse caminho tem acontecido nas cidades, seja no Nordeste ou no Sudeste". "Fiquei bem emocionada, porque você acaba criando laços afetivos com as ruas. Num dia, você passa aqui e tem um casarão lindo. No outro, pode ter um estacionamento ou uma farmácia".
O filme
Com produção de Emilie Lesclaux, para a CinemaScópio Produções, coprodução e distribuição da Vitrine Filmes, “Retratos Fantasmas” é o quinto longa-metragem do cineasta e roteirista Kleber Mendonça Filho, marcando seu retorno ao Festival de Cannes, onde ele também apresentou seus últimos filmes “O Som ao Redor”, “Aquarius” e “Bacurau” (vencedor do Prêmio do Júri em 2019), além do documentário “Crítico”.
A obra é fruto de sete anos de trabalho e pesquisa, filmagens e montagem. Trata do adensamento acelerado nos grandes centros urbanos e, mais especificamente, no Recife, a partir da perspectiva de Kleber e da janela do apartamento onde morou boa parte da vida e filmou várias de suas obras.