"A transição energética tem absoluta prioridade"
Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, entre outros assuntos, sobre os investimentos do Governo Federal na promoção de fontes de energias limpas e renováveis
Atualmente, 47,4% da Oferta Interna de Energia (OIE) no Brasil é composta por fontes renováveis. Porém, 52,6% ainda são fontes não renováveis, de acordo com o Balanço Energético Nacional 2023, ano base 2022, divulgado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), órgão do Ministério de Minas e Energia (MME).
Nesta entrevista à Folha Energia, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, fala sobre os investimentos do Governo Federal na promoção de fontes de energias limpas e renováveis. Foram abordados aspectos como as metas de redução das emissões de carbono; os investimentos previstos para o desenvolvimento e ampliação de fontes renováveis de energia; como o Brasil está no processo de transição energética; e o desenvolvimento do Plano Nacional de Energia (PNE 2050).
No quesito combustíveis, o Brasil ainda tem uma forte dependência dos derivados de petróleo. Como modificar essa matriz e alcançar metas de redução das emissões de carbono nacionais e internacionais?
No setor elétrico brasileiro, já avançamos muito nessa questão. Hoje, temos uma participação das fontes fósseis considerada bastante inferior à média mundial e um uso dessas fontes no sistema nacional basicamente relacionado à necessidade de garantia da segurança energética nos momentos de menor geração renovável, como no caso dos períodos de secas. E o Governo Federal, sob a liderança do presidente Lula, tem dialogado bastante em pautas transversais relacionadas à transição energética e a renovabilidade da matriz nacional. De fato, um dos grandes desafios têm sido a dependência dos combustíveis fósseis para o suprimento de energia para o setor de transportes (45% do consumo do diesel e 27% de gasolina) e alguns segmentos industriais dependentes do carvão mineral e do gás natural. Mas, felizmente, o Brasil conta com uma abundância e diversidade de recursos energéticos que podem viabilizar essa transição energética para um perfil de baixo carbono mais rápido que o restante do mundo.
Nesse sentido, cabe destacar que, no setor de transportes, a estratégia tem sido combinar biocombustíveis, como o etanol e o biodiesel, com as oportunidades de eletrificação. Também estamos fomentando o desenvolvimento de um mercado para novos combustíveis de baixo carbono, como os combustíveis sustentáveis de aviação. Em nosso projeto Combustível do Futuro, que vamos encaminhar em breve ao Congresso Nacional, queremos criar um marco legal para impulsionar a mobilidade sustentável de baixo carbono, reduzindo as emissões de gases do efeito estufa com a integração das políticas públicas complementares como o próprio RenovaBio e o Rota 2030.
Na indústria, estamos trabalhando para que o hidrogênio de baixo carbono, a eletrificação, o biometano e a eficiência energética sejam as principais fontes de descarbonização.
Não descartamos também o papel do gás natural, que pode ajudar a reduzir as emissões ao substituir outras fontes não renováveis. Importante incluir, nesse esforço do MME, o fomento da geração eólica, solar, da hidroeletricidade, da bioenergia, da geração nuclear, da captura de carbono, da eficiência energética e mesmo as mudanças de comportamento dos consumidores, tão importantes para avançar no processo de descarbonização e para elevar o protagonismo brasileiro na transição energética e na garantia de um mundo melhor para as presentes e futuras gerações.
A Petrobras anunciou a retomada das obras da Refinaria Abreu e Lima (RNEST). Quais são os planos do MME em conjunto com a estatal para ampliar a capacidade de refino brasileira?
É prioridade do governo do presidente Lula, e ele já defendeu isso publicamente, o investimento na modernização e ampliação do nosso parque de refino, de forma a diminuir a dependência internacional dos derivados de petróleo. Nossa atuação tem sido no sentido de ocupar um papel estratégico que cabe ao nosso país, reduzindo o poder dos grandes produtores de influenciar, com tanta força, o nosso mercado internacional.
O Governo também tem atuado para agregar valor ao petróleo da União por meio da venda de produtos refinados e também fortalecer o mercado nacional de combustíveis. Nosso objetivo é que o petróleo e o gás natural da União, provenientes dos contratos de partilha de produção, promovam a industrialização do Brasil e garantam a segurança no abastecimento nacional de energia, insumos petrolíferos, dos fertilizantes nitrogenados e de outros produtos químicos, reduzindo a dependência externa, e valorizando o conteúdo local. As nossas empresas precisam priorizar o abastecimento nacional. É isso que vamos buscar.
Quais os investimentos previstos a curto e médio prazos para o desenvolvimento e ampliação do uso de fontes renováveis de energia? (SNEE)
A agenda de transição energética tem absoluta prioridade na minha gestão à frente do Ministério, tanto pela importância dessa agenda para o desenvolvimento social, econômico, industrial do nosso país, quanto para a nossa contribuição internacional na redução das emissões de gases de efeito estufa no âmbito do Acordo de Paris.
Desde o início da gestão temos trabalhado fortemente neste tema e os resultados concretos dessa atuação já poderão ser vistos ainda em 2023. Só neste primeiro ano da nossa gestão, com total apoio do presidente Lula, esperamos acrescentar 10 Gigawatts de renováveis no Sistema Interligado Nacional (SIN). Trata-se do maior incremento anual de energias renováveis da história do nosso país. Além disso, cerca de 100 bilhões de reais estão previstos para inserção e desenvolvimento das fontes renováveis no nosso país ao longo dos próximos anos. Só com os leilões de transmissão anunciados este ano, espera-se alavancar mais de R$ 200 bilhões de investimentos em geração de energia renovável a médio prazo, especialmente eólica e solar. E isso é apenas uma parte do que podemos conseguir nesse país tão rico em recursos energéticos diversificados e abundantes, potência em escala de mercado, em capacidade de inovação tecnológica e em pessoas dedicadas e capazes de colocar o país na liderança em participação de energias limpas na matriz.
Como o senhor vê o Brasil nesse processo de transição energética em relação a outros países da América do Sul e da Europa, por exemplo?
O Brasil é notoriamente um exemplo para todo o mundo e um país considerado imprescindível para a transição energética mundial, por ser dono de uma das matrizes elétricas mais limpas do planeta, com 88% das fontes renováveis. Nossa matriz energética também está na vanguarda mundial, com 48% de fontes renováveis. Com certeza, nos próximos anos, mesmo tendo uma matriz vigorosamente mais limpa e renovável que o restante do planeta, temos certeza que iremos contribuir ainda mais para o incremento dessas fontes, favorecendo a necessária transição energética e a descarbonização do planeta.
Então, sem dúvida alguma, vejo o nosso país como o grande celeiro de energia renovável do mundo. Digo isso com uma convicção muito grande, pois este tem sido um dos grandes focos do trabalho do Ministério de Minas e Energia, sob a liderança do presidente Lula, para garantir uma transição energética forte, justa, que garanta segurança energética ao nosso país e o combate à pobreza energética, promovendo um desenvolvimento econômico justo e sustentável para as brasileiras e brasileiros. Seguiremos trabalhando vigorosamente nas políticas públicas para incremento das renováveis, além de parcerias com as empresas, o setor produtivo e os movimentos sociais, para acelerar a transição energética e garantir o protagonismo do Brasil no desenvolvimento dos mercados e das tecnologias renováveis. Avançamos muito e, certamente, vamos avançar muito mais.
Nossa agenda de transição energética também inclui aproveitar oportunidades de integração com nossos vizinhos, e estamos empenhados para fazer isso avançar, gerando mais economia e segurança energética no suprimento para a nossa população.
Atualmente a matriz energética brasileira ainda tem uma participação muito significativa de fontes não renováveis, especialmente combustíveis fósseis. Como mudar essa realidade a médio e longo prazos?
Como foi destacado no início desta entrevista, o Governo Federal tem dialogado e atuado bastante em pautas transversais relacionadas à transição energética e a renovabilidade da matriz nacional. O Brasil já tem posição de destaque com uma matriz energética que está na vanguarda mundial, com 48% de fontes renováveis, o que fortalece o protagonismo do nosso país na eletrificação da frota, sem a queima de combustíveis fósseis.
Para avançar ainda mais, precisaremos de algumas novas tecnologias, que ainda não estão totalmente maduras e algumas ainda caras. Mas com investimentos em inovação e boas políticas públicas de fomento, e o Brasil tem grande capacidade para isso, criaremos essas oportunidades, com o hidrogênio, as baterias, digitalização e outras soluções promissoras.
Também temos desenvolvido a cadeia de produção do lítio, fundamental para a eletrificação da frota, a exemplo dos ônibus urbanos de passageiros e dos veículos híbridos. Nosso objetivo é tornar o nosso país um HUB de produção de baterias, com geração de emprego e renda para nossa população, como no querido Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. Temos trabalhado para reduzir as emissões, além de agregar tecnologia aos veículos e beneficiar motoristas, passageiros e o meio ambiente.
Existe algum tipo de interação com outros ministérios, como o de Transportes ou de Ciência e Tecnologia, com o objetivo de acelerar a transição energética?
Com certeza. Os lemas deste governo são união e diálogo para juntos construirmos um país mais justo e próspero para as brasileiras e brasileiros. E assim está sendo desde o início da nossa gestão em todos os temas relacionados ao Ministério de Minas e Energia, em especial à transição energética. Por isso, estamos desenvolvendo, em parceria com outros ministérios, soluções concretas para este tema no país, por meio de reuniões interministeriais, participação em comitês e conselhos estratégicos e fundos nacionais que a transição energética é tratada como prioridade.
Exemplos disso é o próprio Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) que reúne uma grande quantidade de ministérios sobre o tema, além do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI) e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços e do Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM), do Ministério do Meio Ambiente.
A Política Nacional de Transição Energética, em desenvolvimento pelo nosso ministério, será crucial para dar sustentação às várias outras políticas que estão sendo competentemente conduzidas pelo governo do presidente Lula.
Em relação ao PNE 2050, serão mantidas as premissas e metas ou haverá alguma alteração?
Já se passaram mais de três anos desde a publicação do PNE 2050, e por isso, estamos desenvolvendo diretrizes para a próxima edição do Plano Nacional de Energia (PNE) a partir de novas premissas, sobretudo a busca pela neutralidade de carbono e o desenvolvimento social e econômico do nosso país. Importante destacar que esse plano também está sendo desenvolvido na base do diálogo com as nossas empresas vinculadas, em especial a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), outros ministérios e, claro, com a sociedade civil, para que todos façam parte do desenvolvimento deste importante plano.
Cabe destacar que, além do PNE, o Ministério de Minas e Energia também está participando ativamente da elaboração das edições anuais do Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE), que indica as perspectivas de expansão futura do setor de energia sob a ótica do Governo no horizonte de dez anos. A elaboração das edições do PDE é um processo permanente, com ciclos anuais, já consagrado no setor energético brasileiro.
Muito tem se falado no potencial do hidrogênio verde, mas que o Brasil não está se preparando para atender o mercado que vai surgir para esse novo combustível em curto prazo. O que está sendo feito nessa área?
À frente do Ministério de Minas e Energia (MME) desde o começo do ano, afirmo que muito já foi feito para desenvolver o mercado de hidrogênio de baixo carbono em curto, médio e longo prazos no país. Tanto que o Brasil já é hoje considerado a grande promessa do mercado de hidrogênio de baixo carbono no mundo.
Nós do Governo Federal, com extenso e notório apoio do presidente Lula, temos atuado de forma articulada para atender essa demanda e expectativa mundial, no desenvolvimento do mercado de hidrogênio de baixo carbono, dentro dos setores de energia, ciência e tecnologia, desenvolvimento do mercado e competitividade, marcos regulatórios, educação, meio ambiente, desenvolvimento regional.
Essas ações estão sendo planejadas e implementadas dentro do Programa Nacional de Hidrogênio (PNH2), com participação ativa dos diversos ministérios e instituições, que orienta um conjunto de ações bastante concretas a serem desenvolvidas para o fomento ao mercado de hidrogênio. Esse programa é uma das âncoras da nossa estratégia para a transição energética. Importante ressaltar, ainda, que, a partir de um forte trabalho, cooperação internacional, conseguimos anunciar mais de US$ 20 bilhões em investimentos em projetos de hidrogênio no Brasil, em diferentes estágios de maturidade, incluindo projetos de pesquisa, desenvolvimento e demonstração em escala piloto e projetos em escala industrial em fase de análise de viabilidade técnica e econômica.
Já estamos trabalhando num diálogo com os agentes e o Congresso Nacional para propor um marco legal adequado. Também estamos buscando fontes de financiamento de baixo custo para acelerar investimentos em projetos de hidrogênio para a transição energética, a exemplo do plano de investimentos do Brasil aprovado junto ao Climate Investment Funds, para o qual incluímos grande montante de recursos para fomento a um hub de hidrogênio no Brasil. Outra oportunidade recentemente anunciada é a chamada estratégica da Aneel, a Agência Nacional de Energia Elétrica, para projetos inovadores de hidrogênio.
Tenho certeza que estamos caminhando, a passos muito bem calculados, para o desenvolvimento sustentado e sustentável do mercado energético do hidrogênio. É um desafio de ordem mundial e demanda o enfrentamento de diversos desafios de ordem tecnológica, ambiental, de competitividade, estabelecimento de uma cadeia de valor estruturada, de formação de recursos humanos e financiamento, mas o Brasil tem muito potencial para ser esse importante player, se não o principal, no mercado mundial de hidrogênio de baixo carbono.